Recursos não-renováveis e renováveis

segunda-feira, 30 de abril de 2012
"Estamos acostumados à idéia de que os eventos são causados por eventos anteriores, que, por sua vez, são causados por eventos mais remotos. Há uma cadeia de causalidade estendendo-se para o passado. Mas suponha que esta cadeia tenha um início. Suponha que houve um primeiro evento. O que o causou? Essa não era uma questão que muitos cientistas desejavam abordar."  -  Stephen Hawking  -  O universo numa casca de noz

Recursos são substâncias (para não falar “bens”) que extraímos da natureza e que tem alguma utilidade econômica. Esta utilização dos recursos naturais varia de civilização para civilização, de cultura para cultura. A areia existe provavelmente desde o surgimento da Terra há 4,5 bilhões de anos, mas foi somente a civilização egípcia, há cerca de 4.000 anos, que ocasionalmente descobriu uma maneira de transformar areia em vidro. O mesmo se aplica a uma série de outros recursos naturais, como o cobre e o estanho, que juntos formam o bronze; o ferro e o carbono, formando o aço.
Há também os recursos naturais que são usados in natura, sem sofrerem qualquer tipo de processamento, como o ar, a água, a luz do sol, entre outros. Estes sempre foram considerados como naturalmente disponíveis e por muito tempo – mesmo no regime capitalista – não foram cogitados como bens econômicos. Enfim, quanto mais tecnologicamente sofisticada uma cultura, tanto mais recursos naturais ela utiliza. Há 15.000 anos utilizávamos poucos recursos naturais, hoje utilizamos centenas de milhares, tanto na indústria, como na agricultura e nos serviços.
Os recursos se dividem em renováveis e não renováveis. Renováveis são aqueles que se repõem ou se recompõem em curto espaço de tempo (contado em padrões humanos). Renováveis são basicamente: o sol, o ar (atmosfera), a água, a flora, e a fauna. Já os recursos não-renováveis são aqueles que não se recompõem (sempre em padrões históricos e não geológicos), tais como: minerais, solos, oceanos.
Na categoria dos recursos naturais temos os recursos energéticos; aqueles dos quais podemos extrair algum tipo de energia. Novamente, precisamos considerar que esta classificação varia de cultura para cultura. Os melhores sábios medievais não saberiam o que fazer energeticamente com o urânio (nem saberiam identifica-lo). Os recursos naturais energéticos podem ser divididos também em duas categorias:
- os renováveis, como a água (hidrelétricas, geotermia, energias do mar), o sol (energia solar térmica) a luz (energia fotovoltaica), o ar (energia eólica), os vegetais (energia de biomassa) e os resíduos a base de carbono, em geral (biogás);
- os não renováveis, como o carvão mineral, o petróleo, o urânio, o gás natural.
É difícil fazer uma comparação entre os custos de aproveitamento de cada recurso energético, já que cada um tem suas características, por exemplo:
- O custo médio de produção de um barril de petróleo (250 litros) é de US$ 5,00 na Arábia Saudita, mas pode chegar a US$ 16,00 no Brasil (cerca de US$ 0,064 por litro). O preço de produção de um litro de etanol é de cerca de US$ 0,2 por litro. Isto quer dizer que a produção de petróleo no Brasil – apesar de cara em relação à Arábia – ainda é cerca de quatro vezes mais barata do que a produção de etanol.
- Outro exemplo é a produção de eletricidade no Brasil a partir de água, que é bem menor que a eletricidade produzida a partir de termelétricas movidas a carvão ou óleo combustível.
- O custo da energia produzida a partir do bagaço de cana (biomassa), por exemplo, é bem menor do que a energia produzida a partir de placas fotovoltaicas, ambas de fontes renováveis.  
Fato é que precisamos estudar caso a caso em suas características. As usinas hidrelétricas, por exemplo, foram construídas há 40 ou 50 anos, e estão com seus custos amortizados. A produção do petróleo é mais barata do que a do álcool de cana – trata-se de um ganho de escala. A produção de energia fotovoltaica (eletricidade a partir de a luz solar) ainda é de custo relativamente alto, por causa do alto preço de fabricação das placas fotovoltaicas.
Analisando somente sob este aspecto, as energias renováveis ainda são relativamente caras, já que suas vantagens ambientais não estão computadas. Isto porque as “externalidades” não são incorporadas ao custo do produto não renovável. No preço de produção do petróleo, não é incluído o custo dos riscos de contaminação de solos e águas, nem a poluição atmosférica. Se estes fatores fossem considerados no preço, este combustível teria um preço bem mais alto. É fato que sob este aspecto todas as energias renováveis são mais competitivas e menos poluentes que o petróleo, o carvão mineral e seus derivados.
No entanto entre as energias renováveis ainda há também uma escala de preços: a mais barata é a hidrelétrica (se não considerarmos os impactos ambientais, as “externalidades” de uma usina hidrelétrica). A hidrelétrica é seguida pela energia de biomassa, já que muitas usinas de álcool têm a produção de eletricidade (co-geração) como atividade secundária. A energia eólica também está começando a ganhar escala no Brasil, com a inauguração de novos parques eólicos no nordeste e no sul. A renovável mais cara, ainda permanece a fotovoltaica, já que as placas – além de serem caras – não têm produção nacional.
A tendência futura – fato já ocorrendo nas economias mais desenvolvidas – é que o custo das externalidades econômicas inerente ao uso de certas tecnologias, seja incorporado ao preço final do produto e serviço. Em uma primeira fase isto poderá representar um aumento de preços. Se, no entanto, toda a cadeia produtiva passar a incorporar estes custos, as cadeias voltarão ao equilíbrio. Exemplo deste fato é o petróleo: se no passado era bem mais barato, hoje todos os segmentos econômicos já absorveram o aumento deste insumo.  
(Imagens: fotografias de Ansel Adams)

Desenvolvimento sustentável ainda é possível?

quinta-feira, 26 de abril de 2012
"Por outras palavras, a ateísmo não constitui realmente um desafio externo ao teísmo; foi, em contrapartida, uma revolução no seio da própria teologia que deu origem ao ateísmo. O que significa defender que as origens do ateísmo moderno são, em última análise, teológicas."  -  Michael Martin  -  Um mundo sem Deus: ensaios sobre o ateísmo

O conceito de desenvolvimento sustentável foi definido pela primeira vez pelo Relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987. Definia-se da seguinte maneira: “O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitats naturais.”
A definição do que é desenvolvimento sustentável foi sendo aprimorada, recebendo detalhamentos (quanto à melhor maneira do uso dos recursos) em diversas comissões posteriores, como Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento, a RIO 92. Segundo consenso comum, o desenvolvimento sustentável é composto por três componentes: a) A sustentabilidade ambiental, ou seja, permitir que os ecossistemas sejam conservados, permitindo que continuem prestando os serviços ambientais para o homem e as outras espécies; b) A sustentabilidade econômica, ou seja, permitir a manutenção do crescimento econômico com a incorporação de práticas de gestão mais eficientes dos recursos; e c) A sustentabilidade social, que implica a incorporação das preocupações sociais ao crescimento, propiciando melhor padrão de vida a toda a população.
De uma maneira simplificada existem três visões distintas do desenvolvimento sustentável. Primeiramente, o grupo que pensa que o crescimento deverá ser abolido, que a economia deve entrar em uma condição estacionária, na qual bens, serviços, produtos, etc., serão apenas substituídos, sem que haja qualquer aumento da produção. Dessa forma seria diminuída a dissipação de energia e perdas de insumos ao longo de todo o processo econômico. Este grupo de pensadores defende o que se convencionou chamar de economia em estado estacionário.
O outro grupo é formado por aqueles que dizem que podemos fazer o melhor possível para minorar nosso impacto sobre os recursos naturais, mas que estes, por final, acabarão. Isto significará a decadência de nossa espécie, caso não possamos desenvolver outra solução tecnológica até agora não conhecida.
Por fim, temos o grupo dos otimistas, que pensam que a tecnologia com o tempo resolverá todos os nossos problemas de energia, alimentação e ambientais, e que poderemos manter o nosso tipo de economia.
O mais provável é que tenhamos deixado de ser sustentáveis quando, há oito mil anos, começamos a regulamente a praticar a agricultura – por motivos climáticos. O alimento disponível, a caça, deslocou-se para outras regiões ou simplesmente desapareceu com a mudança do clima no final da última glaciação. A agricultura deu início ao desenvolvimento da tecnologia e com esta ao aumento da população. Um planeta que pode no máximo sustentar – de acordo com os padrões dos países desenvolvidos – dois bilhões de habitantes, está acomodando mais de sete bilhões. Desta forma, mesmo que haja um forte decrescimento da população nos próximos séculos, será pouco provável que venhamos a ser sustentáveis – a 2ª lei da termodinâmica nos impede definitivamente de sê-lo.
(Imagens: fotografias de Dora Kallmus)

Perguntando é que se aprende (XV)

terça-feira, 24 de abril de 2012

Os escândalos de corrupção continuam a grassar no país. Ao mesmo tempo a CPI do caso Cachoeira ganhou muitas assinaturas e apoio. Estranho, muito estranho que haja esta vontade de deputados em investigar o caso e punir os culpados. E o espírito corporativo? Estarão lançando uma cortina de fumaça para desviar a atenção da opinião pública de algo bem mais grave? 

A expressão "punir os culpados de corrupção" neste caso é apenas um eufemismo. Quantos e quantos políticos já não vimos serem condenados por corrupção e nada acontecer? Devolver o que foi surrupiado, menos ainda. Ministros, chefes de gabinete, funcionários de carreira são demitidos - ou se demitem para evitar qualquer punição - e tudo fica por isso mesmo. Por quanto tempo o povo brasileiro continuará sendo tratado como idiota?

Enquanto a política brasileira continuar a ser dominada por este circo de personagens moralmente grotescos a imagem do país continuará ruim. Ninguém vai dizer isto na cara do país (do brasileiro); mas a corrupção brasileira é motivo de piada e muita risada mundo afora ("Sabe o que disse o deputado brasileiro quando chegou no inferno?", e coisas do tipo). E o pior é que nós cidadãos brasileiros comuns, cumpridores de nossos deveres e pagadores de nossos impostos, somos confundidos com esta súcia. 

Mas de que  tocas saem estes ratos, ou seja, como os políticos-salteadores chegam aos cargos que amealharam? Pelo voto! Parte da população desinformada continua votando nestes elementos, mesmo depois de saber que estes já estiveram envolvidos em falcatruas e escândalos de todo tipo. Na internet circulam fichas criminais de vários políticos, ainda ocupando cargos estaduais ou federais. Em qualquer país decente - e com tantos tementes a Deus! - este pessoal estaria fora da política, ou em lugar até mais indicado, dadas as atividades ilícitas que parte deles vem perpetrando.

Esta aí a mudança do Código Penal. Precisamos ficar alertas sobre o que está sendo votado em relação à punição do crime de corrupção. Neste caso a justiça no futuro precisa ser mais severa e funcionar mais rápido. Porém, não podemos esquecer que as mudanças do Código Penal estão sendo discutidas e votadas pelos próprios, os políticos.  

No último dia 21 de abril organizaram-se passeatas em diversas cidades do Brasil - São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, entre outras - protestando contra a corrupção que permanece impune. O pouco que o governo Dilma fez até agora foi só jogo de cena, que mal chegou a identificar a ponta do iceberg da corrupção (que flutua em um mar de lama).

Políticos corruptos e incompetentes, como nos livrar destes pulhas?

Materialismo histórico e materialismo dialético

domingo, 22 de abril de 2012
"Aquilo que hoje parece uma espécie de lei natural - o crescimento econômico medido pelo PIB - é radicalmente questionado pela economia ecológica. Nem sempre o crescimento é mais benéfico que custoso para a sociedade. A partir de certo ponto, o aumento da produção e do consumo pode ser antieconômico."  -  José Eli da Veiga  -  Mundo em transe - Do aquecimento global ao ecodesenvolvimento

Ao longo de seus debates com os membros da “esquerda hegeliana” e através de suas pesquisas de economia, Marx havia chegado à conclusão de que “não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, o seu ser social que determina a sua consciência”. Ou seja, são as condições econômicas, as relações de produção, que determinam os aspectos espirituais de uma sociedade, as idéias e as instituições; a síntese do materialismo histórico. Escreve Marx no prefácio à Para a Crítica da Economia Política:
O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu-me de fio condutor aos meus estudos, pode ser formulado em poucas palavras: na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral da vida social, político e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência.” (Marx, 1974, p. 136).
A descoberta de que as condições materiais de uma sociedade condicionavam a superestrutura – a cultura, a religião, as leis, os costumes, a ciência e a tecnologia, entre outros fatores – foi muito importante nos estudos posteriores de Marx. A conclusão seguinte à qual chegou Marx é que aqueles que dominavam os meios de produção – a classe dominante – sejam patrícios romanos, nobres feudais, burgueses comerciantes ou industriais, ditavam a superestrutura, utilizando-a para perpetuar sua situação de dominação. Em outras palavras, a superestrutura é uma reprodução, sob certos aspectos, da infraestrutura.
Sobre esta análise dos aspectos materiais e espirituiais da sociedade, escreve Stalin: “O ser da sociedade, as condições da vida material da sociedade, eis o que determina as suas idéias, as suas teorias, as suas opiniões políticas, as suas instituições políticas.” (Stalin, s/d, p. 29).
Com o desenvolvimento do capitalismo, principalmente depois da 2ª Guerra Mundial, a complexidade das relações econômicas e sociais fez com que ficasse cada vez mais difícil este tipo de análise. Na década de 1960 Louis Althusser, filósofo marxista francês, ainda tentou explicar através de sua obra Aparelhos Ideológicos de Estado a maneira como a superestrutura – os aparelhos ideológicos de Estado: a família, a escola, a estrutura jurídica, a organização sindical, a cultura, entre outros – era manipulada pela classe dominante.
Hoje, no entanto a superestrutura se tornou ainda mais complexa. Em nossa moderna sociedade de consumo, baseada nas telecomunicações e na informática, como determinar qual será a influência destes instrumentos – a linguagem e as imagens digitais – sobre a superestrutura? Será que efetivamente a “classe dominante” tem real controle sobre estes meios, sobre esta superestrutura? Ainda quanto a isso, o que nos mostraram as recentes revoluções no mundo árabe?
 O materialismo dialético de Marx é baseado na dialética de Hegel. Para este, todo o processo do “ser” continha três “momentos”, que Marx transformou em três “fases” do processo de perpétuo desenvolvimento da matéria e do desenrolar histórico: a tese, a antítese e a síntese. Marx por assim dizer inverteu a dialética hegeliana e a apontou para o mundo material, histórico. A dialética materialista não é um processo mental (do espírito), idealista, como o via Hegel, mas um processo inerente à natureza e ao devir histórico. Sobre este ponto escreve Henri Lefebvre:
“O método é assim a expressão do devir em geral e das leis universais de todo o desenvolvimento: essas leis são abstractas em si mesmas, mas reecontram-se sob formas específicas em todos os conteúdos concretos. O método parte do encadeamento lógico das categorias fundamentais, encadeamento pelo qual se encontra o devir de que elas são a expressão concentrada.” (Lefebvre, s/d, p. 95)
Materialista, Marx não seguia o “materialismo vulgar” (como o chamava Engels); o materialismo mecanicista e metafísico dos iluministas franceses, da esquerda hegeliana ou de Feuerbach, entre outros. Marx havia descoberto uma dinâmica, que se aplica aos fatos históricos e à natureza.
O materialismo dialético foi fortemente propagado por Friedrich Engels, em obras como Anti-Dühring (1877) e A dialética da natureza (1870), onde deu ao materialismo dialético um caráter filosófico, aplicando-o às várias ciências e quase o transformando em uma metafísica disfarçada. Depois da Revolução Russa, na União Soviética, o materialismo dialético acabou transformando-se no “Diamat”, instrumento de análise e de verificação da ortodoxia marxista nas ciências sociais e naturais.
Atualmente a maioria dos filósofos não-marxistas considera o materialismo histórico e o materialismo dialético como idéias filosóficas, com pouco ou nenhuma fundamentação científica, comparáveis às teorias psicanalíticas de Freud.
Bibliografia:
LEFEBVRE, HENRI. O materialismo dialético. Alfragide (Portugal). Edições Acrópole: s/d, 160 p.
MARX, KARL. Manuscritos Econômico-Filosóficos e outros textos escolhidos in Os Pensadores. São Paulo. Abril Cultural: 1974, 413 p.
REALE, GIOVANNI, ANTISERI, DARIO. História da Filosofia Vol. III. São Paulo. Paulus Editora: 1991, 1113 p.
STALIN, JOSEPH. Materialismo dialético e materialismo histórico. São Paulo. Global Editora: s/d, 63 p.
(Imagens: fotografias de Jindrich Styrsky)

Setor da construção civil: tecnologia e capacitação

quinta-feira, 19 de abril de 2012
"A idéia de que um computador pode controlar o mundo é, em suas diferentes facetas, tanto nosso temor quanto nossa inspiração - não é difícil ver nisso um eco da inspiração alquímica de Bruno para seu sistema de memória e das ilusões éticas de Leibniz com relação à maquina de calcular."  -  Paul Strathern  -  O sonho de Mendeleiev 

O setor da construção civil apresentou um desenvolvimento significativo ao longo dos últimos oito anos, principalmente a partir de 2009, quando cresceu 8,3%, enquanto o PIB brasileiro registrava uma queda de 0,2%. Em 2010, com a recuperação da economia, o setor teve uma expansão de 11,6%, para avançar em um ritmo mais lento – 4,8% – em 2011. Em 2012, segundo o SindusCon SP (Sindicato da Construção), o setor deverá apresentar um crescimento de 5,2%, já que há também uma tendência de incremento do PIB brasileiro, além dos investimentos do governo no programa “Minha Casa Minha Vida.” Outro aspecto positivo é o aumento dos créditos para a habitação e a infraestrutura.
É bastante grande o peso do setor da construção civil no total da economia brasileira, por vários aspectos. Entre 2007 e 2012, o número de empregados com carteira assinada no setor aumentou de 1,3 para 2,7 milhões de trabalhadores. O macrossetor da construção, segmentado por seis cadeias de produção (madeiras; argilas e silicatos; cadeia dos calcários; dos derivados de produtos químicos e petroquímicos; cadeia dos produtos de siderurgia; e de metalurgia de ferrosos), emprega em conjunto aproximadamente 10 milhões de trabalhadores – quase 20% da força de trabalho registrada do país – e movimenta cerca de 20% do PIB brasileiro.
As perspectivas de crescimento do setor são as melhores possíveis: investimentos prementes em saneamento, energia, transportes e moradias; além dos grandes eventos programados para os próximos anos – a Copa em 2014 e as Olimpíadas em 2016 – são fatores que certamente aumentarão a demanda por insumos e serviços.
Todo este desenvolvimento da construção civil está se dando em um novo ambiente, bastante diferente daquele entre os anos de 1968 e 1973, quando o setor cresceu em média 15% ao ano. Agora, a economia interna vive novos tempos, que acabam afetando o setor: processos de concessão, privatização e realização de grandes projetos, atraindo concorrentes estrangeiros; novas demandas técnicas durante a fase de projeto e construção criando necessidade de novas tecnologias; orçamentos, prazos e segurança na realização da obra tornaram-se fatores cada vez mais importantes. Além destes, há o aspecto ambiental; a questão do uso eficiente dos recursos na construção; a realização de obras de baixo impacto ao ambiente, mesmo depois de prontas. O que ocorreu nos últimos anos na construção civil é o que já vinha acontecendo em graus diversos em outros segmentos da economia brasileira, ao longo dos últimos vinte anos, contribuindo para que se formasse um novo ambiente de negócios.
Dois aspectos são bastante importantes nesta nova fase do setor da construção civil: a utilização de novas tecnologias e a capacitação de mão-de-obra. Este último item, talvez ainda seja uma das maiores deficiências da construção civil brasileira. Sempre beneficiado por uma situação de fácil disponibilidade de mão-de-obra – formada em parte por trabalhadores sem qualificação e sem colocação em outros setores da economia – o setor passa agora por uma crise. Além de faltarem trabalhadores dispostos a atuar no setor, a maior parte daqueles que trabalham na área não tem capacitação profissional suficiente, para fazer face às novas demandas dos canteiros de obras. Além do preparo profissional, a muitos ainda falta a alfabetização e os estudos básicos, o que os impede desempenhar as novas tarefas de uma obra moderna. Problemas semelhantes acontecem nos níveis hierárquicos intermediários, onde mestres e coordenadores ainda não estão afeitos a técnicas básicas de controle e gerenciamento.
O crescimento do setor da construção civil aumentará a demanda por novas tecnologias. Estas, para serem efetivas, visando a melhoria da produtividade, da economia de recursos e da segurança, precisam ser dominadas por profissionais preparados – em todos os níveis hierárquicos. A tendência é, portanto, que um dos grandes temas da construção civil nos próximos anos, seja o da formação de uma mão-de-obra capacitada. 
(Imagens: Fredrik Sommer)

Considerações oportunas (XXIII)

terça-feira, 17 de abril de 2012

Agora finalmente os corruptos serão punidos (rsrsrsrs)

Jornal O Estado de São Paulo online 17 de abril de 2012

Câmara consegue assinaturas e CPI do Cachoeira pode ser instalada
Deputados reuniram 272 nomes, 101 além do necessário, e Casa já pode enviar pedido de abertura da comissão para investigar relações políticas do contraventor.

Escreve La Rochefoucauld em "Máximas e Reflexões":
"Os mais hábeis fingem a vida toda censurar as astúcias para delas lançarem mão no momento oportuno, levados por algum interesse maior."
(Imagens: Georg Grosz)

Sustentabilidade, cada vez mais importante

domingo, 15 de abril de 2012
"Aos setenta anos Dilthey reconheceu que a relatividade de todas as idéias humanas seria a última palavra sobre uma visão histórica do mundo."  -  Mircea Eliade  -  Saudades das origens

A revista "MIT Sloan Management Review" editada pelo Massachusetts Institute of Technology, uma das mais conceituadas universidades do mundo, publicou recentemente um relatório sobre sustentabilidade nas empresas. Elaborado com base em uma pesquisa feita em colaboração com a consultoria Boston Consulting Group, a enquete foi realizada entre gerentes e executivos de companhias de todo o mundo, indagando sobre como estes estão utilizando práticas sustentáveis nos negócios. O relatório da pesquisa foi elaborado com base nas respostas de 3.000 executivos do setor comercial. Algumas das conclusões a que chega o estudo são bastante interessantes, apesar de não corresponderem necessariamente à prática  da maior parte das empresas do planeta.
Declaram dois terços dos entrevistados que a sustentabilidade é necessária para serem competitivos no mercado atual. Muitas companhias aumentaram suas iniciativas sustentáveis; o que não se esperaria em tempos de crise econômica, caso o assunto fosse apenas uma questão de boa imagem em épocas de prosperidade. Outro aspecto levantado pela pesquisa é que para quase um terço dos participantes, as atividades sustentáveis mantidas por suas empresas estão contribuindo para o aumento dos lucros. Estas empresas a publicação chama de "harvesters", ceifeiros; os que colhem benefícios. São empresas que além de reduzirem emissões de carbono e investirem em tecnologias limpas, também estão alterando sua estrutura operacional e sua estratégia de negócios, em função da sustentabilidade. Um importante executivo do banco HSBC, em Londres, comentou que já é clara a percepção de que sustentabilidade não é só para tempos de crescimento econômico, ao contrário. "As pessoas estão vendo que a sustentabilidade é parte da próxima fase do desenvolvimento; que será muito mais de alterações estruturais do que de melhorias e mudanças aqui e ali."
A nova visão dos negócios, com a crescente incorporação da questão da sustentabilidade, foi identificada pela pesquisa em vários setores: indústrias de bens de consumo; geradores de energia; produtores de commodities, químicos e automóveis; setor de serviços, etc. Os fatores principais que fazem com que as companhias se preocupem cada vez mais com os aspectos ambientais são segundo o estudo: preferência dos clientes por produtos e serviços sustentáveis (41%); pressão legal e política (35%); custo dos insumos (30%); concorrência introduzindo práticas sustentáveis (28%); exigência de parceiros comerciais ao longo da cadeia de valor (26%); entre outros analisados. Aspecto importante identificado é que em geral os consumidores não querem pagar mais por produtos sustentáveis - fato também identificado no Brasil. A afirmação de que a mercadoria sustentável é mais cara - seja sob que argumento for - não convence mais o consumidor.
Outro aspecto importante identificado pela pesquisa é a estrita relação entre inovação e sustentabilidade. Empresas empenhadas em inovação - o que implica em investimentos na capacitação e tecnologia - estão colhendo benefícios financeiros e tendo uma atuação mais sustentável. Economia de recursos e redução dos impactos ao meio ambiente, só podem ser obtidas por mudanças na produção e distribuição - que o digam empresas como a HP, Nike e outras citadas no relatório. 

(Imagens: fotografias de Gilbert Garcin)


O impacto da expansão urbana

quinta-feira, 12 de abril de 2012

"Todas as grandes obras-primas da literatura têm um estória linear, sem nada de extraordinário. Crime e castigo é a história de um estudante que assassina uma velha para roubar. Dom Quixote nem enredo tem: é um louco de meia-idade que sai pelo mundo procurando briga à toa. Madame Bovary é a mulher de um médico provinciano que arranja um amante. E daí?"  -  Carlos Heitor Cony  -  As obras primas que poucos leram (organizado por Heloisa Seixas)

A crescente expansão urbana se tornará um problema cada vez maior na Terra. Esta a conclusão principal a que chegou um grupo de cientistas recentemente reunidos em Londres, que estudou os diversos aspectos do crescimento desordenado das metrópoles em todo o mundo. Fatores econômicos, sociais e ambientais não escaparam à análise dos especialistas, que pretendem divulgar o resultado de seu trabalho durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que acontece em junho deste ano no Rio de Janeiro.
Uma das causas do crescimento dos centros urbanos é a constante migração de populações do campo para a cidade. Este processo, que tem suas origens na Antiguidade, aumentando e diminuindo durante toda a história humana – muitas vezes afetada por carestias, guerras e epidemias – mostrou tendências de crescimento ao longo do século XX e início do XXI. Ásia, América Latina e África, foram os continentes nos quais estes movimentos migratórios da região rural para a urbana mais se acentuaram. Somente na China, ao longo dos últimos 30 anos, cerca de 250 milhões de pessoas se mudaram de suas fazendas para alojamentos nas cidades, à procura de melhores salários. O processo de industrialização sempre foi um fator de atração de mão-de-obra do campo, desde o início da industrialização na Europa do século XIX, passando pelo Brasil das décadas de 50, 60, 70 e 80 do século XX, até chegar ao êxodo rural ocasionado pela pujante industrialização chinesa.
Outro fator causador do rápido crescimento das cidades é o próprio aumento da população mundial, que dos atuais sete bilhões deve alcançar os nove bilhões até 2050, numa média de um milhão de nascimentos a cada semana no mundo, durante os próximos 38 anos. Parte desta população já está e outra irá se fixar nos grandes centros urbanos, onde a disponibilidade de trabalho, saúde, educação, cultura e lazer são bem maiores do que na província. Foi desta maneira que em um século o número de cidades com mais de um milhão de habitantes cresceu de dez para as atuais 450; dentre as quais megalópoles como São Paulo, que em 1912 não havia ainda chegado a um milhão de habitantes.
Um aspecto que os cientistas analisam é o impacto ambiental destes imensos formigueiros humanos. Sabe-se já que mais de 70% das emissões atuais de CO² são geradas nos centros urbanos. São Paulo, por exemplo, tem uma frota de mais de 7,2 milhões de veículos, 16 mil ônibus e quase um milhão de motocicletas. A oferta de transporte público não poluente – trens elétricos de superfície, metrôs e ônibus elétricos – é reduzida e os investimentos não acompanham o crescimento da demanda. Outro fator de poluição é o ainda incipiente sistema de gestão de resíduos e o tratamento somente parcial de efluentes domésticos.
É consenso entre os cientistas que não será mais possível manter o crescimento das cidades no ritmo atual. Administrações municipais terão que encontrar maneiras de melhorar o planejamento urbano: na urbanização e no zoneamento; com a oferta de transporte público eficiente e não-poluente; criando mais áreas verdes destinadas ao lazer; reduzindo o tamanho das casas; introduzindo leis que penalizem o excesso de uso da água e energia; e dificultando o uso do transporte individual, incentivando até o uso da bicicleta.    
(Imagens: fotografias de Dora Maar)

Sartre e o marxismo

terça-feira, 10 de abril de 2012
"Os títulos profissionais em todas as sociedades estratificadas mostram, por um lado, uma tendência para o conservadorismo, ao passo que, por outro lado, o seu significado muda para funções muito diferentes."  -  Gwendolyn Leick  -  Mesopotâmia  -  A invenção da cidade

“o marxismo [...] permanece, pois, a filosofia de nosso tempo: é insuperável, pois as circunstâncias que o engendraram não foram ainda superadas”.
Sartre sempre teve uma relação ambígua com o marxismo. Adere ao materialismo histórico, segundo o qual as relações de produção condicionam o desenvolvimento da cultura e das instituições. Por outro lado, Sartre nunca chegou a concordar com o materialismo dialético, que julgava ser uma metafísica – como outros pensadores contemporâneos a Sartre, entre os quais Bertrand Russel e Karl Popper. O problema com o materialismo dialético, segundo Sartre, era que este era “projeção” sobre a natureza e não poderia ser provado – apesar de que Sartre admitisse de que eventualmente pudesse existir.
Em sua obra Questão de Método (1957), da qual foi tirada a citação acima, Sartre escreve por que permanece existencialista, não se tornando marxista:
“O que faz então com que não sejamos muito simplesmente marxistas? É que consideramos as afirmações de Engels e de Garaudy princípios diretores, indicações de tarefas, problemas e não verdades concretas; é que elas nos parecem insuficientemente determinadas e, como tais, suscetíveis de numerosas interpretações: numa palavra, é que elas nos aparecem como idéias reguladoras.” (Sartre, 1972, p. 34).
Em toda a obra Questão de Método Sartre – apesar de esta obra ser de certo modo um “acerto de contas” de Sartre com o marxismo – o filósofo francês mantêm uma posição crítica em relação à filosofia marxiana, escrevendo, por exemplo, que:
“O marxismo estacionou: precisamente porque esta filosofia quer transformar o mundo, porque visa “o tornar-se-mundo da filosofia”, porque é e quer ser prática, operou-se nela verdadeira cisão que jogou a teoria de um lado e a práxis do outro.” (Ibidem, p.23)  
No entanto, parece que Sartre reconhece a importância da filosofia marxista, ao considerá-la como a filosofia de seu tempo, resultado de condições econômicas e sociais que ainda não haviam sido ultrapassadas. O marxismo era uma filosofia crítica à burguesia e a seu sistema econômico, o capitalismo. E é exatamente por este fato – a não superação das circunstâncias que o engendraram – que o marxismo permanecia tão forte, na visão de Sartre. Escreve Renato dos Santos Belo:
“Quando Sartre, em Questões de Método, explicita que a posição do existencialismo em relação ao marxismo é para definir este último como a “filosofia reinante de nossa época”, frente à qual o existencialismo só poderia figurar como uma ideologia, que vive às margens da “filosofia insuperável de nosso tempo” e dela é dependente.” (Belo, 2011).
Sartre nunca aderiu explicitamente ao marxismo, apesar de considerá-lo a principal filosofia de sua época. De nossa parte, cabe analisar se nos dias atuais o marxismo ainda permanece atual, e em que aspectos.
Como teoria crítica do capitalismo é inegável que as idéias de Marx permanecem atuais. Por outro lado, é preciso abandonar aquelas idéias que acabaram se tornando ideologia dentro do marxismo, como o materialismo dialético, transformado em dogma científico na União Soviética nos tempos stalinistas. Se muitas previsões feitas por Marx e relacionadas com o desenvolvimento da economia não se concretizaram até o momento, pode ser que a médio e longo prazo algumas venham efetivamente a ocorrer. Talvez, a própria dinamicidade do capitalismo, com suas idas e voltas, acabe dando razão ao pensador alemão.  
Bibliografia:
BELO, RENATO DOS SANTOS. Sartre e as marcas de seu tempo: investigação sobre as figuras da subjetividade e da alienação na relação entre existencialismo e marxismo Disponível em: 
REALE, GIOVANI, ANTISERI, DARIO. História da Filosofia Vol. III. São Paulo. Paulus Editora: 1991, 1113 p.
SARTRE, JEAN-PAUL. Questão de método. São Paulo. Difusão Européia do Livro: 1972, 148 p.
(Imagens: fotografias de Philipe Halsman)

Espécies desaparecem, e nós?

sexta-feira, 6 de abril de 2012
 "A grande maioria dos movimentos expressivos, inclusive os mais importantes, são inatos ou hereditários, como vimos; eles não podem ser dependentes da vontade do indivíduo."  -  Charles R. Darwin  -  A expressão das emoções no homem e nos animais

Nas últimas semanas chamou atenção uma pesquisa realizada pela universidade de Plymouth, da Inglaterra, mostrando que os oceanos estão ficando cada vez mais ácidos. A acidificação gradual das águas marinhas ocorre, segundo os cientistas, devido a quantidades cada vez maiores de dióxido de carbono (CO²) contidas na atmosfera, que se diluem nos mares. Este gás é em grande parcela resultante da queima de combustíveis pelo setor industrial, de transportes, da geração de energia (principalmente nos países do Norte) e de queima de florestas, após o desmatamento. A previsão é que este processo de acidificação das águas poderá causar uma mortandade de até 30% das espécies marinhas. O fato evidentemente não ocorrerá em alguns anos; mas aos poucos, ao longo de um ou dois séculos. O cientista britânico Jason Hall-Spencer, autor da pesquisa, comenta que no passado geológico o planeta passou por processo parecido. Há 55 milhões de anos os oceanos terrestres sofreram acidificação semelhante, mudança que levou 10 mil anos para atingir seu ponto máximo. Depois disso, o grande ecossistema da Terra reverteu a alta concentração de CO² nas águas, precisando para isso outros 125 mil anos.

Outro fato que despertou a atenção foi a reportagem do jornal O Estado de São Paulo, informando que a pesca de peixe no litoral do estado está caindo a cada ano. Segundo pescadores artesanais da região de Camburí, litoral norte de São Paulo, a quantidade de peixe capturada vem caindo há pelo menos uma década. A percepção dos pescadores é confirmada pelos dados oficiais: segundo o Instituto de Pesca de São Paulo, o volume de pescado capturado no Estado em 2011 foi de 20,5 mil toneladas; 20% a menos que há dez anos e 60% a menos que há 20 anos. A culpa, segundo os pescadores, é dos grandes barcos que operam em águas mais profundas, com compridas redes e radares, com capacidade de localizar os cardumes a grandes distâncias. Com isso assiste-se ao colapso de diversos tipos de pescado. A sardinha-verdadeira (sardinella brasiliensis), por exemplo, já foi um dos principais produtos da pesca nas regiões Sul e Sudeste. Na década de 1970 aprodução anual deste peixe era de mais de 200 mil toneladas, caindo para 32 mil na década de 1990 e chegando a 17 mil toneladas anuais em 2000. Depois da instituição do período de defeso, quando o peixe está em fase de reprodução e sua pesca é proibida por lei, a produção subiu e estacionou em torno das 80 mil toneladas anuais.

Os dois fatos muito pouco tem a ver um com o outro, pelo menos até agora. No entanto, são dois indícios de como, através de nossas atividades produtivas, estamos reduzindo e gradualmente destruindo o estoque de recursos naturais. Por um lado, a crescente acidificação das águas destruirá a população dos corais, que funcionam como habitat e local de alimentação e procriação para muitas espécies marinhas: peixes, crustáceos, tartarugas e moluscos. Por outro lado, a pesca intensiva, destruindo peixes jovens e as fêmeas em fase de reprodução, reduzirá cada vez mais as possibilidades de sobrevivência das espécies destes peixes.
Ao final, resta a pergunta sobre que tipo de futuro antevemos para a humanidade, já que a Terra cuida de si mesma, não precisa de nossa intervenção. Ferida, se recupera; as espécies vêm e vão e no final a vida continua. Com ou sem nós.
(Imagens: fotografias de Eli Lotar)

Os índios e nós, os selvagens!

segunda-feira, 2 de abril de 2012

"Breve, num ato onde o acaso está em jogo, é sempre o acaso que realiza a sua própria Idéia, afirmando-se ou negando-se. Frente à sua existência, a negação e a afirmação acabam de fracassar. Ele contém o Absurdo - implica-o, mas em estado latente e o impede de existir: o que permite ao infinito ser."  -  Stéphane Mallarmé  -  Igitur ou A loucura de Elbehnon 


No Brasil existe uma longa tradição de tirar vantagens dos índios. Quando os portugueses por aqui chegaram, a população indígena, segundo alguns cálculos, deveria ser de cinco milhões de pessoas. No entanto a escravidão, as doenças contra as quais os índios não tinham anticorpos (gripes, varíola, etc.), e o sistemático assassinato de tribos que se opunham à dominação européia, acabou reduzindo esta população.
Durante todo o período colonial e imperial principalmente, foram grandes as barbaridades praticadas contra a população indígena, sempre com o objetivo de se apoderar de seu território.
Muitos latifúndios ainda hoje existentes ou outros que deram origem a grandes fortunas foram construídos com o sangue e a vida de milhares de indígenas. As memórias destas atrocidades estão esquecidas, enterradas com suas vítimas. A história acabou sendo escrita para e por aqueles que venceram. Diga-se, a bem da verdade, no entanto, que este tipo de tratamento dos povos indígenas não é absolutamente exclusividade da sociedade brasileira; do Canadá à Argentina estes povos foram exterminados para dar lugar ao branco agricultor, pecuarista, garimpeiro e colonizador.

Na década de 1960 e 1970 a expansão da fronteira agrícola, a exploração de minerais e a construção de estradas contribuíram para diminuir mais ainda a população silvícola, que no início da década de 1980 havia caído para apenas 380 mil indivíduos. Com a introdução, em passado recente, de políticas de proteção ao índio e da criação de reservas por todo o país – com maior concentração da região Norte – o número de nascimentos aumentou e a população indígena vem lentamente se recuperando; atualmente em torno dos 870 mil indivíduos.
Todavia, a situação dos povos indígenas ainda está longe de ser fácil. Limitadas às suas reservas, as tribos indígenas são constantemente alvos de curiosos, missionários e todo tipo de intruso, que tenta tirar algum proveito destes povos. As florestas de suas reservas continuam sendo exploradas por madeireiras, os solos destruídos por garimpeiros e muitas áreas ainda são incorporadas por fazendeiros. Fontes de água situadas foras dos limites das reservas são poluídas por excesso de agrotóxicos, utilizados nas plantações do entorno. A pesca torna-se cada vez mais reduzida, já que o nível da água dos rios ficou mais baixo com o assoreamento, causado pela erosão devida ao desmatamento. A grande variedade de espécies de peixes vai desaparecendo junto com a destruição dos ecossistemas aquáticos pelos agrotóxicos, carregados pela chuva, das plantações para os rios.

Com orçamento limitado, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e Ongs como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e o Instituto Sociambiental (ISA), entre outros, procuram apoiar e orientar os povos indígenas em sua luta pela sobrevivência e autonomia. Mesmo assim, muitas tribos sofrem com a falta de território (a área de sobrevivência de que dispõem não é suficiente para plantar, caçar e pescar); não dispõem de assistência médica regular, principalmente para as crianças; e estão perdendo sua cultura: ocorrem vários suicídios entre jovens índios, por causa da perda dos seus valores ancestrais.
Enquanto culturas indígenas que levaram milhares de anos para se formar desaparecem definitivamente, ficamos nós preocupados com a próxima reunião do Copom. E ainda nos consideramos civilizados!   
(Imagens: fotografias de Germaine Krull)