Depois do acordo mundial sobre emissões

sábado, 26 de dezembro de 2015
"A Constituição é a vontade direta do povo. A lei, a vontade dos seus representantes."  -  Rui Barbosa  -  Obras Completas

Um acordo histórico sobre a limitação das emissões de gases causadores das mudanças climáticas foi assinado em 12 de dezembro de 2015. Ao todo foram 195 países, que reunidos em Paris durante o Fórum Mundial do Clima promovido pela ONU, acordaram em limitar gradualmente suas emissões. Os dois pontos mais importantes acordados durante o evento foram: estabelecer o limite de 1,5ºC para o aumento da temperatura da atmosfera até o final do século; e instituir um fundo através do qual as nações ricas financiarão projetos em países pobres e em desenvolvimento - já previsto no passado mas nunca implantado.
Ainda não existe um detalhamento de como estas resoluções serão postas em prática, o que deverá ser decidido em reuniões posteriores. No entanto, para atingir as metas de emissões mundiais, os cientistas preveem que nos próximos 50 anos o saldo das emissões de gases deverá estar praticamente em torno de zero.
Esta meta implica uma grande mudança no funcionamento do sistema econômico mundial, que ainda depende dos combustíveis fósseis para a maior parte do seu suprimento de energia - cerca de 80%. Afora isso, muitos dos materiais usados pela moderna tecnologia - plásticos, tintas, defensivos agrícolas, insumos para construção e indústria do consumo, são fabricados a partir de derivados do petróleo. A produção de energia e de produtos ainda está em grande parte baseada nos insumos fósseis.
Não é por outra razão que o mundo está substituindo as energias fósseis pelas renováveis. A construção de unidades geradoras funcionando com insumos renováveis (sol, água, vento, biomassa, etc.) já excede os geradores operando com combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás natural, xisto, etc.). As pesquisas de novos materiais, visando substituir os polímeros (plásticos) de petróleo por outros de origem natural também avançam, principalmente nos países industrializados. As opções já são as mais diversas - derivados de plantas, algas e produtos orgânicos. Os maiores impedimentos, no entanto, continuam sendo os custos da pesquisa e a fabricação de volumes suficientes para uma escala de produção economicamente viável.    
Cerca de 30% das emissões nacionais são originadas pelas mudanças do uso da terra (eufemismo para desmatamento) e outros 30% por atividades agropecuárias. A geração de energia emite outros 30%; a indústria e a gestão de resíduos contribuem juntas com pouco mais de 8%. As ações e investimentos na redução das emissões brasileiras deverão focar: a) a eliminação do desmatamento ilegal na Amazônia e no Cerrado; b) a redução das emissões do setor pecuário e da agricultura; e c) investimentos em programas de eficiência energética e projetos de energias renováveis. As emissões geradas pelos resíduos sólidos urbanos deverão ser gradualmente reduzidas com a efetiva implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). O setor industrial, pressionado pela necessidade da inovação tecnológica e pela concorrência internacional, cuidará de reduzir suas próprias emissões.     
Uma das decisões estratégicas a serem tomadas por futuros governos diz respeito ao papel que a Petrobrás terá na futura política energética do país. Se o petróleo perder sua importância como combustível da economia global, quais serão as prioridades da petroleira e em que áreas passará a atuar? É preciso pensar nisso hoje e preparar o futuro. 
(Imagens: pinturas de Guto Lacaz)

Biodiesel diminui emissão de gases

sábado, 19 de dezembro de 2015
"O homem usa propriedades mecânicas, físicas, químicas de certas coisas para fazê-las agir como forças sobre outras coisas, conforme seu objetivo... Converte dessa forma coisas externas em órgãos de sua própria atividade, órgãos que acrescenta aos seus para alongar, a despeito da Bíblia, sua estrutura natural."  -  Karl Marx  -  O Capital

O Brasil é o segundo maior produtor mundial de biodiesel, produzindo cerca de quatro bilhões de litros anuais. O produto é produzido a partir de óleos vegetais, derivados da soja, do milho, do babaçu, do amendoim da mamona e do pinhão manso. Este último é uma planta originária na Índia, cultivada especialmente para extração de óleo vegetal combustível não comestível. Outra fonte para extração de óleos e graxas destinados à fabricação de biodiesel são as gorduras de animais de abate e as vísceras de peixes. Também existem experiências de produção de biodiesel a partir de outras fontes orgânicas, como algas e bactérias, mas a custos ainda bastante elevados.
A maior parte do biodiesel fabricado no Brasil tem origem no óleo de soja. Trata-se de um processo bastante simples: ao óleo vegetal é adicionado um álcool (etanol, por exemplo) e um catalisador (como a soda cáustica). O resultado é a produção de biodiesel e glicerina, feita por cerca de 70 usinas espalhadas pelas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste. O biodiesel, biocombustível renovável e ecologicamente correto, é vendido às refinarias de combustível através de leilões organizados pelo governo. As refinarias, por sua vez, adicionam o biodiesel ao diesel de petróleo, na proporção de 7%; mistura denominada B7. O governo autorizou o aumento desta mistura até 20%, em casos específicos e de forma voluntária. Estimam os especialistas do setor de que nos próximos dois anos a mistura deverá aumentar de B7 para B10, o que deverá trazer maior economia de divisas, já que 10% do óleo diesel consumido no país é ainda importado. Somente com a implantação do B7 o Brasil já economiza cerca de 800 milhões de dólares por ano.  
O consumo do óleo diesel vem caindo ao longo de 2015 em função da crise econômica. A redução do consumo fez cair a movimentação de matérias primas e produtos, feita principalmente através do transporte rodoviário. No entanto, apesar da recessão, a União Brasileira do Biodiesel e da Bioquerosene (Ubrabio) estima que o setor esteja gerando 1,3 milhão de empregos em toda a cadeia produtiva, do campo aos postos de combustível, além de incorporar milhares de pequenos agricultores ao sistema produtivo.
Outro aspecto importante do uso do biodiesel junto com o óleo mineral é a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE), causadores do aquecimento da atmosfera. O biodiesel é produto derivado de plantas, que em seu crescimento incorporaram CO² (dióxido de carbono), um dos GEE. Deste modo, sua queima não injeta novos volumes de GEE na atmosfera, como ocorre quando se queima óleos derivados do petróleo.

A redução das emissões dos GEE será tema cada vez mais importante em todos os fóruns mundiais; sejam eles voltados aos temas ambientais ou econômicos. Já é bastante conhecido e divulgado o impacto que as mudanças climáticas causarão nas economias dos países, por isso está em andamento um grande esforço em minorá-las.
Neste contexto é cada vez mais importante o uso de biocombustíveis, como o biodiesel e o etanol, aliados à geração de energia de fontes renováveis, como o vento, o sol, a água e a biomassa. Assim, o petróleo torna-se cada vez mais um dos grandes vilões do clima, forçando o país a reavaliar o volume de investimentos para o programa do Pré-Sal e aqueles que deveriam ser feitos na expansão do uso do biodiesel e do etanol.
(Imagens: desenhos de Frank Lloyd Wright)

COP 21: desta vez o mundo espera resultados

sábado, 12 de dezembro de 2015
"Uma das coisas mais belas do budismo é que ele não venera Buda como um deus ou uma divindade, mas o celebra como um exemplo de pessoa comum, como você e eu, que aplicou boa dose de disciplina e bondade à técnica de meditação e que, como consequência, abriu amplamente sua mente e seu coração."  -  Lodro Rinzler  -  Budismo na mesa do bar

De 30 de novembro a 11 de dezembro de 2015, ocorrerá em Paris um dos mais importantes fóruns mundiais sobre o futuro do planeta. A COP21 (21ª Conferência das Partes), ou Conferência sobre o Clima de Paris, organizada pela ONU, reunirá praticamente todos os países do mundo, para discutir e firmar um acordo sobre o clima, de modo a manter o aumento da temperatura média do planeta abaixo dos 2ºC, até o final deste século. A conferência deverá trazer a Paris mais de 50 mil participantes, entre os quais delegações oficiais dos países participantes, representantes do setor empresarial, líderes políticos, cientistas, ONGs e o público em geral, envolvido e interessado no tema.
Como a grande maioria de nós não terá oportunidade de participar deste evento, é importante que acompanhemos os resultados das discussões e dos acordos através da mídia. A primeira COP ocorreu há exatamente 20 anos, em Berlim. Durante estas duas décadas o mundo tem passado por grandes mudanças climáticas - de maneira cada vez mais acentuada -, sem que as nações conseguissem chegar a um acordo global sobre a redução das emissões de gases que causam o efeito estufa e as mudanças do clima. Esta poderá ser a última oportunidade que a humanidade terá em evitar o aumento excessivo da temperatura média da atmosfera terrestre, com todas as suas consequências.
Felizmente, em 2015, as condições para um acordo são muito mais favoráveis, já que pesquisas foram aprofundadas e o grau de conscientização aumentou. Basta lembrar que quando o tema das mudanças climáticas começou a aparecer na mídia, a maior parte da opinião pública reagiu com ceticismo. Cientistas, financiados por empresas de petróleo, prepararam estudos negando a influência da ação do homem sobre o clima. Os Estados Unidos, a maior economia do planeta, sempre foram contra a proposta de redução de emissões, alegando que a providência geraria custos adicionais para as suas empresas. Hoje, no entanto, é consenso de que a humanidade, através de sua atividade econômica, está emitindo uma razoável quantidade de gases, que provocam o aquecimento da atmosfera. Estados Unidos e China, as duas economias mais poluidoras, participarão da COP21 com propostas concretas.
As mudanças climáticas contribuem (sem serem sua única ou principal causa) para as secas prolongadas, chuvas torrenciais, aumento da potência de tornados, furacões e nevascas; picos de temperatura em curto espaço de tempo; e aumento gradual do nível do mar, entre outros fenômenos. O impacto destes acontecimentos sobre a economia e o bem estar da população mundial, já começam a ser percebidos.
O principal resultado a ser esperado da COP21 é que todos os países - principalmente os grande emissores como a China, os Estados Unidos, o Brasil, a Indonésia, a Rússia, a Alemanha, a Índia e o Japão, entre outros - assumam compromissos efetivos de redução de suas emissões. Outro aspecto esperado é que sejam criados mecanismos políticos, financeiros e tecnológicos para que gradualmente, o mundo possa reduzir a descarga de gases na atmosfera.
No Brasil, temos experiência com promessas vazias. Assim, caberá à população cobrar ações do governo e do Congresso, atualizando, detalhando e implantando o que está esboçado na Política Nacional de Mudanças Climáticas (Veja: http://www.mma.gov.br/clima/politica-nacional-sobre-mudanca-do-clima).
(Imagens: cenas do filme Nosferatu em 1922)

Queda do desmatamento e saúde

sábado, 5 de dezembro de 2015
"Por outras palavras, para o homem atual, Deus já não parece ser necessário nem desnecessário: tornou-se simplesmente sem importância. Não se trata de convicção teórica, mas de uma realidade prática e existencial."  -  Eusebi Colomer, A morte de Deus

A revista científica americana "Nature" publicou recentemente um estudo, mostrando que a redução do desmatamento na Amazônia fez cair o índice de doenças pulmonares em toda a América do Sul. O trabalho foi realizado através de uma parceria da Universidade de São Paulo (USP) com especialistas das universidades de Leeds e Manchester (Inglaterra) e do Massachussetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos. O tema principal da pesquisa é a emissão de aerossóis (micropartículas carregadas pelo ar) através da queima da floresta (biomassa) e seus efeitos sobre o clima e a qualidade do ar (http://www.nature.com/news/amazon-fire-analysis-hits-new-heights-1.11467).
O estudo mostrou que a diminuição do desmatamento na Amazônia entre 2001 e 2012 tem permitido uma redução de 30% no material particulado (aerossóis), além de reduzir os níveis de ozônio, monóxido de carbono, óxido de nitrogênio e outras substâncias poluentes emitidas durante a queima da floresta. Esta diminuição dos níveis de poluição também foi constatada em toda a região sul do Brasil, na Argentina, no Paraguai e no norte da Bolívia. A queda do desmatamento deve-se ao aumento do controle sobre a região por parte do governo e, principalmente, aos acordos assinados entre empresas produtoras e compradoras de soja e carne bovina, atestando que os produtos não são originários de áreas de desmatamento.  
Através da comparação dos dados deste estudo com outros, a equipe de pesquisadores pôde concluir que à redução do desmatamento correspondeu uma queda nos números de casos de doenças e mortes precoces, causadas pela poluição atmosférica. A diminuição de 40% no desmatamento, estima o estudo, poupou a vida de 1,7 milhões de pessoas das regiões afetadas pela poluição. É a primeira vez que um estudo desta abrangência pôde mostrar a relação direta entre a derrubada da floresta amazônica, a poluição atmosférica no cone sul do continente e as mortes daí resultantes.
A pesquisa científica identifica, cada vez mais claramente, a relação existente entre os sistemas ecológicos e os seres vivos, que aparentemente nada têm em comum por estarem distantes. Há trinta ou quarenta anos atrás, quem imaginaria que as queimadas na floresta amazônica, tão extensa e tão distante (do sul do continente), poderiam ter algum efeito sobre a saúde das pessoas em São Paulo, Assunção ou Buenos Aires?
Se a floresta amazônica, distante milhares de quilômetros da região sul e sudeste do Brasil, pode exercer tanta interferência no clima e na qualidade do ar, o que dizer da Mata
Atlântica, localizada praticamente na periferia das cidades e na de grandes metrópoles, como Rio de Janeiro e São Paulo? Vale lembrar que quase toda a ocupação do país se deu através de regiões dominadas por esta floresta e que ainda hoje, cerca de 50% da população do país ainda habita áreas de influência deste bioma.
A preservação das florestas e de outros biomas deveria ser prioridade nas macro estratégias de todos os governos. A relação destas áreas naturais com o clima, os recursos hídricos, a qualidade do ar e diversos outros aspectos do ambiente urbano e rural, ainda são em grande parte desconhecidos. A destruição destes recursos naturais em nome da expansão econômica e do crescimento populacional causará fenômenos imprevisíveis - a crise hídrica é um pequeno exemplo disso.
(Imagens: pinturas de Aluisio Carvão)