Loteamentos e expansão urbana no litoral Sul

sábado, 24 de novembro de 2018
"Provavelmente não era coincidência que centros de filosofia natural grega como Alexandria, Mileto e Atenas fossem também centros comerciais. Um mercado movimentado reúne indivíduos de diversas cultura e alivia a monotonia da agricultura."   -   Steven Weinberg   -   Para explicar o mundo - A descoberta da ciência moderna" 

Há poucas áreas verdes nos balneários e bairros das cidades do litoral Sul do estado de São Paulo. A falta de planejamento, quando da abertura dos loteamentos, fez com que atualmente extensas áreas urbanizadas não disponham de locais arborizados. Durante o verão, nos meses de forte insolação e calor, a população local e os veranistas ficam limitados a tomarem sol na praia ou voltarem às suas residências e hotéis. São raros os locais onde o morador ou o turista possam ficar ao ar livre, descansando à sombra de árvores.

A legislação municipal que exigia a destinação de um percentual da área do loteamento à criação de praças ou bosques não era suficientemente clara, podendo ser burlada. Assim, imobiliárias e incorporadoras tiveram campo livre para destinar o máximo da área do terreno à criação de lotes, sem incluir área verde no projeto.  O problema aparece em todos os loteamentos criados na região entre os anos 1960 a 1990; as exceções são apenas os poucos condomínio de alto padrão.

O resultado é que no verão os bairros mais afastados da orla marítima apresentam temperaturas mais altas do que aqueles situados perto da brisa oceânica. Em balneários onde foram construídos edifícios, a entrada do vento vindo do mar é barrada e também ocorre aumento da temperatura. Toda esta situação é agravada ainda mais pelo fato de que em muitos bairros das cidades da região a população não tem o costume de plantar árvores em frente de suas casas. Sem as sombras proporcionadas pela vegetação agrava-se ainda mais a situação de calor e a falta de refrigeração do ar nestas áreas.   

Outro fato que ocorre na região é o surgimento dos loteamentos clandestinos e de invasões de áreas de proteção ambiental. É na zona intermediária, entre a periferia das cidades e o início da área sob proteção - geralmente região de Mata Atlântica ou de mangues - que se dá a ocupação irregular, com a consequente derrubada da floresta e aterramento do mangue. O fato aparentemente não é percebido pelas autoridades, se é que não é tolerado. Alguns dos invasores já possuem imóveis em outros locais e assim que conseguem tomar posse de um lote, vendem-no a outros interessados. São os chamados "invasores profissionais"; figuras já bastante conhecidas nos movimentos de ocupação de áreas.

A questão da ocupação e expansão urbana na região do litoral Sul de São Paulo ainda espera por estudos mais aprofundados. Pesquisas preveem um aumento da população fixa e crescimento do turismo. Com isso, a região deverá gerar um volume maior de resíduos domésticos, de efluentes e precisará de mais rodovias de acesso. Vale lembrar, no entanto, que grande parte dos municípios ainda não possui aterros sanitários - o lixo é transportado para um aterro em Mauá -, e que a coleta e tratamento de esgotos existe a pouco mais de dez anos. As estradas ainda são insuficientes para escoar o grande número de veículos que transitam na região durante as férias de verão. A preservação da Mata Atlântica e a garantia do fornecimento de água potável para a região, por exemplo, são temas relacionados, já que a água vem das nascentes situadas na floresta.

Enfim, é necessário planejar a evolução para um turismo mais sustentável, que além de trazer recursos não comprometa as riquezas naturais ainda existentes no bioma da floresta, dos mangues e das restingas da região.     

(Imagens: pinturas de Natalia Goncharova)

Fatos contraditórios do século XX?

sábado, 17 de novembro de 2018
"Não está nos planos deste estudo tomar posição quanto ao valor de verdade das doutrinas religiosas. Basta que as tenhamos reconhecido em sua natureza psicológica como ilusões."   -   Sigmund Freud   -   O futuro de uma ilusão


Sempre parece fácil analisar a história e apontar-lhe os aspectos que nos interessam. Os fatos já ocorreram, estão registrados, e nós os juntamos, associamos, tentando justificar, provar ou refutar algo. Assim a história se torna um vasto campo de idéias, formadas por fatos, matéria prima para que possamos construir nossa teoria sobre o que ocorreu e o significado que damos a isso.

A contradição ocorre quando uma afirmação é falsa e a outra verdadeira. Todavia, fatos são fatos, e o que os torna verdadeiros ou falsos é a sua interpretação – e aí também se incluem os fatos históricos. A contradição não está, portanto, na história, naquilo que ocorreu – exatamente porque aconteceu – mas na nossa maneira de usar as palavras.

O século XX foi aquele no qual se deram os maiores desenvolvimentos científicos de toda a história humana. Basta pensar na invenção do avião, na descoberta dos antibióticos, o chip, o foguete e a moderna biotecnologia. Por um lado, o avanço científico e tecnológico foi imenso, em comparação com períodos anteriores da história. Por outro, o ser humano continua a ser o mesmo em seus impulsos básicos – seja a cobiça, o orgulho, e a raiva; ou a compaixão, o respeito e a solidariedade.

Foi por influências dos filósofos iluministas e seu entusiasmo pelo desenvolvimento das ciências e da humanidade que surgiu a ideologia do progresso. D`Alembert, Condillac, Voltaire, Diderot e muitos outros, acreditavam que a expansão do conhecimento – educação e cultura – junto com o desenvolvimento científico, conduziriam a humanidade para um futuro de menos obscurantismo e fanatismo religioso (ou político) e mais tolerância. O século XVIII trazia grandes promessas à humanidade: a independência dos Estados Unidos e todos os ideais de igualdade a ela relacionados; a Revolução Francesa, com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão; e o início do capitalismo, só para citar os principais aspectos. Para grande parte da intelectualidade do início do século XIX, estaríamos em processo de constante desenvolvimento, a caminho da perfeição (de acordo com as teorias de Hegel). No decorrer do século XIX ocorrem maiores desenvolvimentos nas ciências (química, física, matemática, biologia) e, cada vez mais, tudo parecia estar caminhando em direção ao progresso constante.

E é esta a visão ingênua que ainda em parte temos hoje, apesar de tudo que se passou no século XX. Freud, escrevendo ainda antes da 1ª Guerra Mundial e depois dela, chamava nossa atenção para a agressividade inerente no homem, apesar de todos os vernizes culturais. Em O Mal Estar na Civilização Freud teoriza que a sociedade só é possível, porque o homem abre mão de impulsos e desejos que gostaria de realizar, mas vivendo em sociedade não pode. Assim, para que a sociedade humana pudesse persistir, os indivíduos foram obrigados a reprimir parte de suas pulsões, o que por outro lado trouxe descontentamento e, por vezes, agressividade. De certo modo, enveredando por outros caminhos, Freud chegara às mesmas conclusões que o filósofo inglês do século XVII, Thomas Hobbes. Por baixo da aparente civilidade e cultura, o homem ainda é o lobo do homem. Treblinla, Dachau, os diversos gulags, Ivo Jima, Dresden, Hiroshima, A Grande Marcha, Mi Lai, Pol Pot, e muitos outros nomes lembram que os filósofos iluministas e os entusiastas do progresso no século XIX fizeram interpretações limitadas na história.    

Sendo assim, temos os “aspectos contraditórios” ao qual se refere o texto. A Alemanha como o país educacional e culturalmente mais desenvolvido no início do século XX, mas ao mesmo tempo fechando os olhos à perseguição de seus vizinhos e amigos, só porque eram judeus. A pesquisa da energia nuclear, com grande potencial de aplicação energética e médica, recebendo imensos volumes de investimento (Projeto Manhattan, nos EUA) para construir uma bomba com poder destrutivo como nunca houve igual.

Regimes políticos que prometiam liberdade, prosperidade e paz para os povos, transformaram-se em organizações criminosas, perseguindo, encarcerando e matando milhões de pessoas em nome de ideais – práticas que seriam consideradas puro fanatismo por Voltaire ou Diderot, se estes pudessem presenciá-los – como a causa da pátria e da raça, a causa do operariado e do socialismo, a causa da Revolução, e outros delírios.


Por outro lado, depois da guerra surgiu um tipo de capitalismo novo, mais dinâmico. Espalhado por todo o globo, extrai de todos os rincões sua matéria prima e mão de obra barata, para ganhar bilhões de dólares com especulação. O constante aumento dos níveis de produção – para vender mais – demandam cada vez mais matéria prima (recursos naturais transformados) e geram imensos volumes de resíduos: poluição do ar, do solo e das águas.

A produção de alimentos, apesar de ser suficiente para alimentar toda a humanidade, é objeto de especulação e altos lucros. Países com pouca produção agrícola, como todos os países do Oriente Médio, sofrem a cada vez que aumenta o preço de certos produtos agrícolas, por força da especulação de grandes grupos econômicos.

Se tivesse que resumir as “contradições” do século XX usaria uma frase do filósofo Blaise Pascal (1623-1662):
“Quando, às vezes, me pus a considerar as diversas agitações dos homens, e os perigos e os castigos a que eles se expõem, na corte, na guerra, originando tantas contendas, tantas paixões, tantos cometimentos audazes, e muitas vezes funestos, descobri que toda a infelicidade dos homens vem de uma só coisa, que é não saberem ficar quietos dentro de um quarto. O homem que tem suficientes bens para viver, se soubesse ficar em casa com prazer, não sairia dela para ir ao mar ou ao cerco de uma praça. Não se pagaria tão caro um posto no exército, se não se achasse insuportável não sair da cidade; e só se procuram as conversas e os passatempos dos jogos porque não se sabe ficar em casa com prazer.” (Pascal, 1973, p. 75)

Bibliografia:
PASCAL, Blaise. Pensamentos. São Paulo. Abril Cultura: 1973, 280 p.

(Imagens: pinturas de Joseph Beuys)

Empreendorismo e recursos naturais

sábado, 10 de novembro de 2018
"Mas para quem clamar nesta espécie de solidão, nesta véspera de graves acontecimentos decisivos, não só para as elites brasileiras como para o próprio homem?"  -  Augusto Frederico Schmidt  -  Antologia de Prosa

Empresas em todo mundo estão realizando investimentos para diminuir o impacto ambiental de suas atividades. Há alguns anos, um grupo de investidores institucionais representando ativos de mais de 90 trilhões de dólares, solicitou às 5.500 maiores empresas públicas do mundo que divulgassem seus dados ambientais – uso de água, emissões de CO², utilização de recursos naturais, etc., – bem como suas ações para prevenir as mudanças climáticas e proteger o meio ambiente. A iniciativa foi coordenada pela instituição internacional “Carbon Disclosure Project” (https://www.cdp.net/en/companies), atuando principalmente na redução das emissões que causam as mudanças do clima.

Como esta, são inúmeras as instituições e associações empresariais já bastante avançadas na discussão e implantação de ações que visem reduzir o impacto ambiental das atividades de seus associados. Programas deste tipo ocorrem principalmente na Europa, Japão e Estados Unidos, mas ainda são muito raros no Brasil, onde se limitam principalmente às grandes indústrias multinacionais, grandes empresas brasileiras e algumas poucas estatais.

Grande parte das empresas brasileiras, não importando o porte do negócio, ainda não tem uma visão estratégica da questão ambiental. Para a maioria dos empresários a preservação dos recursos naturais nem é cogitada ainda. E quando este tema entra em discussão, é somente para criticá-lo, referindo-se à sustentabilidade como apenas mais um empecilho, criado com o objetivo de dificultar ainda mais a vida do empreendedor e trazer receitas adicionais ao governo.

A culpa desta visão não é apenas do empreendedor. Precisamos considerar que muitos, talvez a maior parte dos chefes de empresas e daqueles que detêm posições de comando nos empreendimentos, têm falhas em sua formação profissional. A sua maioria, principalmente os pequenos empreendedores teve limitado acesso à educação formal, frequentando muitas vezes instituições de baixo nível de ensino, longe dos centros educacionalmente mais avançados. Mesmo aqueles que passaram mais anos nos bancos escolares, não receberam as informações que somente nos últimos anos passaram a fazer parte dos currículos de escolas e universidades. A questão ambiental, a ecologia e do uso mais eficiente dos recursos, são matérias que surgiram apenas há poucos anos nas escolas e nos cursos superiores.


Este é um dos fatores pelos quais em grande parte dos empreendimentos no Brasil – extração, agricultura, indústria e comércio – a questão da sustentabilidade ainda não é encarada como fator importante no dia a dia dos negócios. Isto também ocorre porque os próprios consumidores ainda estão mal informados sobre o assunto, enquanto órgãos controladores são poucos e, muitas vezes mal preparados. No entanto, à proporção que aumentar o nível de conscientização ambiental da população, com a ajuda das instituições de ensino, das ONGs, da imprensa e das mídias sociais, crescerá também o grau de cobrança em relação a produtores e comerciantes. Esta fiscalização e pressão exercida pela sociedade civil, certamente forçará o governo – Legislativo e Executivo – a criar leis e mecanismos de controle ambiental mais eficientes e contundentes.

Informações estão disponíveis desde já, mostrando que a proteção dos recursos não é um empecilho para o exercício do empreendedorismo, como tantas vezes empresários mal intencionados e até burocratas do governo declaram, ao contrário. O que os empreendedores esclarecidos já perceberam é que sem a preservação dos recursos naturais estes se acabam, logo depois dos últimos empresários terem desaparecido.  

(Imagens: fotografias de Pierre Verger)

O que mudou em dez anos (Sustentabilidade: o que esperar de 2009)?

sábado, 3 de novembro de 2018
"Os acontecimentos sociais existem apenas na medida em que os meios de comunicação de massa os constituem como tal [...] o acontecimento em si é uma espécie de variável desconhecida que os meios de comunicação vão construir."   Eliseo Verón, citado por Djalma L. Benette   -  Em branco não sai: um olhar semiótico sobre o jornal impresso diário

(Texto originalmente publicado na revista “Benchmarking” – dezembro de 2008)

Em dezembro de 2008 - há dez anos - publicamos este artigo. O que mudou neste período?

Sustentabilidade: o que esperar de 2009?

Fazer previsões é tarefa difícil e ao mesmo tempo simples. Difícil, porque o desenvolvimento de qualquer sistema complexo – e aqui estamos falando de sustentabilidade, tema que perpassa todas as atividades humanas – é praticamente impossível de se prever. Simples, porque em não acertando as previsões, podemos agir como outros ramos das ciências humanas: dizer que nos faltaram dados. Não se trata aqui de nenhuma crítica, mas é fato que em qualquer estudo a componente humana é a menos previsível.

Efetivamente, dada a sua complexidade, é difícil falar sobre sustentabilidade (não estou querendo me justificar de antemão). O tema inclui todas as disciplinas que se conheciam como meio ambiente e proteção ambiental, passando a abranger também assuntos como o uso de energias renováveis, a eficiência energética, os biocombustíveis, a agricultura orgânica, o consumo sustentável, a produção mais limpa, a química verde, a redução das emissões de CO², até aspectos sociais como a responsabilidade social empresarial, o comércio justo, a preservação de culturas, entre outros assuntos. Ainda com relação à sustentabilidade, existem mais de cem diferentes definições e uma grande discussão em torno de sua efetividade.

Quando penso nas perspectivas para o ano de 2009, lembro de uma imagem criada pelo filósofo Friedrich Nietzsche, em sua obra A origem da tragédia. Conta que “no tempo de Tibério alguns navegadores gregos, perdidos numa ilha solitária, ouviram de uma vez este clamor terrível: O grande Pan está morto! – assim ressoou também através do mundo helênico este grito de angústia e dor” (Nietzsche, 1984). A morte de Pan, a grande divindade grega, representava a dissolução de toda uma visão de mundo, característica da civilização helênica e em parte herdada pelos romanos – posteriormente substituída pelo cristianismo. 

Talvez seja um pouco desta maneira, que no futuro será encarada a catástrofe financeira que se abateu sobre o sistema econômico mundial em 2008. Não que o capitalismo seja substituído por outro sistema econômico ou que sofra alterações profundas, não se trata disso. No entanto, a crise deixou claro que diversas mudanças terão que ser introduzidas no sistema, a começar pelo maior controle dos fluxos financeiros, causa primordial da crise econômica. A fiscalização dos fluxos de capitais vai dificultar a especulação financeira e trará mais estabilidade a todo o sistema econômico. Outra conseqüência da crise, esta mais política, é a descentralização do poderio econômico global, com o enfraquecimento da influência americana e européia e o aumento da importância das economias em crescimento, como a China, a Índia, o Brasil, a Rússia, a Indonésia e a África do Sul. Enfim, o mundo não será mais o mesmo e Pan está definitivamente morto.

As conseqüências econômicas da crise ainda nos acompanharão por alguns anos, já que diversos setores da indústria mundial deverão amargar um período de queda de vendas. Como se trata de uma reação em cadeia, afetando setores industriais inteiros, muitas empresas estão e continuarão demitindo funcionários, fechando fábricas e revisando planos de investimento para os próximos anos. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) a crise poderá causar o desemprego de mais de 20 milhões de pessoas em todo o mundo, nos setores de construção, indústria automotiva, serviços financeiros, turismo e setor imobiliário. Além disso, a organização prevê que o número de trabalhadores pobres vivendo com menos de um dólar ao dia deverão aumentar em 40 milhões; aqueles que recebem dois dólares diários podem ultrapassar os 100 milhões de pessoas, o que significa um aumento mundial da pobreza.


Como em toda crise, existem sempre os setores da economia que acabam sofrendo as maiores perdas, por não serem prioritários na estratégia de sobrevivência das empresas e instituições. O setor de sustentabilidade ambiental e energética é um dos primeiros a ter seus recursos reduzidos ou cortados. Uma das mais recentes notícias nesse sentido é que o plano ambiental da Europa, cujo objetivo principal era a redução das emissões de CO² em 20% até 2020, com um custo de adaptação anual de 44 bilhões de Euros (cerca de R$ 117 bilhões) entre 2013 e 2020, será muito provavelmente cancelado ou reduzido. Os investimentos, a serem realizados pela indústria, representam um grande sacrifício financeiro e não encontram mais apoio, mesmo entre aqueles que anteriormente eram favoráveis à iniciativa.

Outro setor cujos investimentos se encontram em queda é o de energias renováveis. Os bancos estão relutantes em conceder novos investimentos e as ações de muitas empresas de energia limpa estão em queda. O principal fator que tira o interesse do setor de energias renováveis é a brusca queda do preço do barril de petróleo, que de 147 dólares o barril em julho desse ano, caiu para quase 55 dólares em novembro. Com o preço do petróleo em queda, ficam menores os custos de geração de energia convencional, inviabilizando outras matrizes energéticas mais caras, como as renováveis. Como conseqüência imediata, deixarão de ser construídas fábricas de óleo de palma na Indonésia e fazendas eólicas e de energia solar nos Estados Unidos e Europa. Além disso, várias empresas do setor estão sendo forçadas a suspenderem seus planos de abertura de capital, já que o número de interessados nestas ações é ínfimo.

No Brasil, ainda não existem dados disponíveis para se analisar os efeitos da crise no setor ambiental ou de sustentabilidade. A economia apenas aos poucos vai sendo afetada pelo impacto da crise nos países ricos, ainda que de maneira menos intensa. Com isso, o governo, apesar das afirmativas em contrário, não deverá dispor do mesmo volume de recursos a ser destinado ao PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) para obras de infra-estrutura. Assim, muito provavelmente serão reduzidos os investimentos em um setor importantíssimo, o do saneamento. Por outro lado, empresas de setores aquecidos, que haviam fechado 2007 com grandes lucros e perspectivas ainda melhores para 2008, estão sendo forçadas a mudarem completamente sua estratégia. O restante do setor industrial deverá se comportar da mesma maneira: se ajustar à crise, cortando custos. Neste contexto, o grau de maturidade das empresas dirá se estas reduzirão seus custos com cortes em programas de sustentabilidade ou em outras áreas.

Conclui-se, assim, que a questão da sustentabilidade em 2009 dependerá em grande parte do comportamento do governo e do setor privado. O país se tornará mais sustentável se ambos os setores mantiverem parte de seus investimentos visando aumentar a produtividade da economia, melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e ampliar investimentos em pesquisas, entre outras iniciativas. A manutenção dos investimentos deve ser utilizada para melhoria da estrutura de produção e distribuição, já que grande parte da indústria, da agricultura e da infra-estrutura estava sendo exigida em grau máximo, devido à alta demanda interna e externa. Desta forma, a redução da atividade econômica poderá ser uma oportunidade para que o Brasil faça uma “parada para manutenção”, preparando-se para um novo ciclo de crescimento e para o novo papel que deverá desempenhar na nova ordenação da economia e política internacional. Isto tudo, no entanto, sem esquecer a questão da sustentabilidade.

(Imagens: pinturas de Aleksandr Deyneka)