Os Jetsons e o futuro

sábado, 28 de março de 2020

"A religião enquanto fonte de consolo é um obstáculo à verdadeira fé, e nesse sentido o ateísmo é uma purificação." - Simone Weil - Cadernos II


Um grande banco lançou recentemente uma nova campanha de comunicação, tendo como tema a série animada de TV “Os Jetsons”. O desenho original foi produzido pela americana Hanna Barbera e veiculado originalmente no Brasil entre os anos 1962 e 1963, sendo posteriormente reprisado ao longo de toda a década. A série retrata uma típica família de classe média branca americana dos anos 1960; pai, mãe, um casal de filhos, a empregada (Rosie, um robô) e o cachorro “Astro”.

A produção surgiu no mesmo período em que os Estados Unidos lançavam seu programa espacial, no início dos anos 1960. Os americanos estavam competindo com a então União Soviética, que em 1961 havia se adiantado, colocando o primeiro astronauta no espaço. Naves espaciais, viagens interplanetárias, foguetes e a vida num futuro dominado pela tecnologia, eram temas de filmes, estórias em quadrinhos, romances de ficção científica. O assunto dominava a cultura de massa americana de tal maneira, que influenciou a indústria dos brinquedos, dos alimentos para o público infantil (que surgia naquela época), o setor do lazer e até os seriados infantis da época.  

A agência de publicidade contratada pelo banco utilizou o tema da família Jetsons por seu apelo futurista, explicitando e exemplificando de certa forma a mensagem conceitual de sua campanha anterior, que promovia a “inteligência artificial” do banco. Analisando a peça publicitária, podemos nos perguntar: o quanto ela tem a ver com a sociedade brasileira? A maneira de tratar o assunto ainda é moderna?  

De início vemos que o filmete nada tem a ver com a sociedade brasileira.  Trata-se de uma família classe média branca, de aparência pouco usual para as condições brasileiras. Não que tais tipos humanos não pudessem absolutamente existir no Brasil. Seriam, todavia, incomuns e não refletem a média da população brasileira.

Deveríamos nos perguntar, se no futuro ainda seriam comuns para as famílias os deslocamentos por transporte individual – pensemos nos países com infraestrutura de transporte desenvolvida. Será que o trabalho ainda seria realizado presencialmente, como mostra a animação? A escola frequentada pelo filho ainda seria presencial? Ainda se usaria dinheiro em espécie, como fazem a mãe e a filha? Todavia, algo que parece não ter mudado é a caracterização do “robô-doméstica”, retratada vestindo um uniforme, parecido aos das atuais empregadas domésticas de famílias ricas. Num futuro tão moderno ainda seria necessário mostrar através de um uniforme, que o robô exerce a função de “doméstica”?

Além do mais, é pouco provável que a sociedade americana do futuro ainda seria predominantemente branca e de classe média. Os Estados Unidos passaram por transformações nas últimas décadas, que ocorreram em grande parte depois que a série Jetsons foi criada. Negros, latinos, asiáticos representam atualmente um percentual importante da população e da classe média americana. Por outro lado, aumentou bastante a pobreza; 139 milhões de pessoas, 43% da população, são pobres ou vivem com renda insuficiente para pagar suas contas.  
   
É apenas um filme, dirão muitos. Sim, mas o filme não parece retratar o futuro – ou aquilo que se poderia imaginar como talvez sendo as condições do futuro. O que mostra é o presente projetado num suposto futuro. Ou melhor: o presente projetado dentro das condições tecnológicas que se imaginam para o futuro. Comparável a algo como o político e general romano Júlio César, falando ao celular com o senado romano, reportando as batalhas sangrentas com os gauleses. Como se o futuro fosse igual ao presente, só que com tecnologia mais moderna.

Assim, perguntamo-nos se a campanha de comunicação está realmente transmitindo a mensagem que pretende, “experimente o futuro”? Um olhar atento parece revelar apenas o “passado no futuro”, com as mesmas mazelas. Mas, não seria isto que alguns sempre esperam que ocorra? A manutenção das condições sociais, das relações de produção, como diria Marx?

(Imagens: pinturas de Hermann Scherer)

Cidades e planejamento

sábado, 21 de março de 2020
"Desse modo, a ficção do Ser é derivada da ficção do eu. O mesmo princípio de individuação atua tanto no campo microscópico da pessoa quanto no campo macroscópico do mundo inteiro."   -   Antoine Panaïoti   -   Nietzsche e a filosofia budista


A cidade é uma das maiores invenções da humanidade. Este espaço geográfico urbanizado e humanizado surgiu no período Neolítico, por volta de oito mil anos atrás. As primeiras aglomerações urbanas provavelmente apareceram por causa da praticidade. O templo era estabelecido em um lugar estratégico de uma região, e em seu entorno se fixavam os artesãos – o ferreiro, o padeiro, o oleiro –, cujos produtos eram comprados pelos camponeses das redondezas. Aos poucos esta pequena vila vai atraindo mais pessoas, sua organização social se torna mais complexa, até se transformar em centro comercial e político. A mesma evolução ainda pode ser observada nos dias atuais, em regiões como o Norte e o Centro-Oeste do Brasil.  
  
O surgimento e o crescimento das cidade na maior parte dos casos, ocorre de forma espontânea. São raras as cidade planejadas, já que a maior parte é resultado de um longo desenvolvimento histórico, no qual as intervenções feitas em determinada época, são anuladas por sucessivas mudanças ocorridas posteriormente. A cidade de Roma, por exemplo, fundada por volta de 800 A.C., chegou a ter um milhão de habitantes no 1º século de nossa era. Por volta do século V entrou em um período de extrema decadência, com a queda do império romano, abrigando 35 mil habitantes por volta do ano 800 e 15 mil no ano 1084.

A primeira cidade planejada no Brasil foi Salvador, fundada em 1549 pelo primeiro governador-geral da colônia, Tomé de Souza. O objetivo da coroa portuguesa era fazer do núcleo urbano a capital, o centro administrativo e fortaleza militar, tendo para isso contratado o arquiteto militar lisboeta Luís Dias (1505-1542). Outra cidade planejada na mesma época foi Olinda, no Pernambuco. No século XIX temos como exemplo de cidades planejadas Teresina, capital do Piauí (1852) e Aracajú, capital do Sergipe (1854). Em 1897 foi fundada a cidade planejada de Belo Horizonte, que deveria substituir a antiga capital Ouro Preto. Durante o projeto de ocupação do interior do Brasil no governo de Getúlio Vargas, chamado de “Marcha para o Oeste”, foi fundada a cidade de Goiânia (1930). Um dos mais famosos projetos no mundo de urbe planejada, foi o da cidade de Brasília (1960), elaborado pelos arquitetos e urbanistas Lúcio Costa e Oscar Niemeyer.

Mesmo tendo sido preparadas como “local humano de viver” em sua origem, as cidades planejadas, em sua maior parte, não mantêm suas características, já que não há um acompanhamento e adaptação constante de seu desenvolvimento. Cidades, assim como a economia de um país, a bolsa ou o clima, são sistemas complexos, sujeitos a uma infinidade de mudanças pequenas ou maiores, que se influenciam reciprocamente, provocando ao longo do tempo mudanças imprevisíveis. Povoações ou metrópoles estão sujeitos às mais diversas intervenções – clima, migrações, desenvolvimentos tecnológicos, leis, fatores econômicos, etc., – que em sua maior parte fogem completamente ao controle daqueles que teriam a função de manter ou desenvolver o planejamento urbano.

Isto, no entanto, não quer dizer que as cidades não são administráveis. O que ocorre, é que efetivamente é necessário que as administrações municipais invistam recursos para poder manter a cidade em relativo funcionamento, sendo capazes de prever evoluções futuras (enchentes, especulação imobiliária, demanda por transporte e equipamentos públicos). Para isso são necessárias políticas públicas, especialistas, equipamentos e recursos financeiros. No entanto, em grande parte dos municípios brasileiros, este tipo de gasto não está previsto nas despesas correntes.

No aspecto das políticas públicas, aquelas que deveria estabelecer as linhas mestras do planejamento das cidades, as condições também não são propícias no Brasil. O Estatuto das Cidades, criado através da Lei federal 10.257/01 em 2001, estabelece uma série de políticas para as cidades brasileiras – elaboração de um Plano Diretor, função da propriedade, criação de políticas de cunho social, entre outras. A lei ainda é pouco utilizada como instrumento de planejamento do crescimento sustentável das cidades. Na própria administração federal, diminuiu a preocupação com o desenvolvimento urbano do país, já que o Ministério das Cidades, que se ocupava de temas como a moradia, o saneamento e o transporte, foi incorporado ao Ministério do Desenvolvimento Regional.

Como implantar um programa nacional de planejamento urbano, visando reorganizar a maior parte das cidades brasileiras e melhorar o padrão de vida de seus habitantes? Como priorizar uma agenda social, voltada para a maior parte da população – principalmente a pobre – e não permitir que as administrações continuem privilegiando interesses de grupos econômicos e da especulação imobiliária? São algumas das perguntas a serem respondidas pelas próximas gerações de políticos e administradores públicos.

(Imagens: pinturas de Carl Heidenreich)

Notas rápidas (homenagem a G. C. Lichtenberg)

sábado, 14 de março de 2020


"Quando leres a biografia de um grande criminoso, antes de condená-lo, agradece ao céu bondoso por não ter-te colocado, com tua cara honesta, no começo de uma série de circunstâncias semelhantes."

(G. C. Lichtenberg)



Redes sociais e fake news


Parte dos grupos das redes sociais se transformou em verdadeiras reservas, nas quais só circulam informações que confirmam ou alimentam as opiniões de seus membros. Muitos destes agrupamentos transformaram-se em bolhas, isoladas e impermeáveis a outro tipo de informação, que não aquela que confirme a visão de seus participantes. Quando falamos de comunidades de discussão fechadas, voltadas exclusivamente a temas filosóficos ou religiosos, por exemplo, é esperado que seja assim. O que interessa ao grupo é aquilo que seus membros comungam e acreditam. Quando, porém, se trata de uma coletividade comum, o quadro é diferente.

Desde antes das eleições de 2018, observa-se grupos que começaram a trocar informações inverídicas, em alguns casos as mais grosseiras mentiras, muitas vezes desconhecendo serem fake news recebidas por algum membro. Com o tempo, grande parte dos participantes destes grupos de Whatsap, passaram a se informar sobre tudo o que acontecia no país – política, economia, ações do governo – quase que exclusivamente através do conteúdo destas mensagens. Muita desta informação, no entanto, era material de origem desconhecida, provavelmente preparada e divulgada por centrais noticiosas, com clara intenção de desinformar e influenciar este público. A Justiça tem uma investigação em curso, procurando identificar agentes da disseminação destas falsas notícias. Já existem fortes indícios de que há empresários financiando estes "disparos" de fake news

O que realmente é preocupante nesta história é o fato de que paralelamente à ação destes geradores de fake news, hajam outros agentes tentando desacreditar mídias oficiais de notícias, que têm compromisso de noticiar fatos verídicos. Chegou-se ao ponto de sugerir que as pessoas não lessem mais jornais e que deixassem de assistir a determinados canais de TV. Lembramos que jornais, rádios, canais de TV, têm, até por dever constitucional, a obrigação de apresentar fatos verídicos; aquilo que efetivamente ocorreu. Nenhum canal de TV ou jornal pode inventar ou falsear os fatos. Isto por vezes ocorreu no passado, mas atualmente não é mais possível, já que o público pode checar a informação em outras fontes – outros jornais ou canais de TV, a internet e até a mídia internacional. O que por vezes pode mudar de uma mídia para outra, é o enfoque dado ao fato ou a omissão dele. Por competir por público com outras fontes de informação como as TVs por assinatura, os youtubers, os blogues e as redes sociais – além dos jornais cada vez menos lidos –, um canal de TV ou jornal não conseguem mais falsear fatos, com a intenção de derrubar um governo.  

O que ocorre, todavia, é que muitos integrantes destes grupos nas redes sociais, bombardeados por notícias falsas, não têm o hábito de consultar outras fontes. Muitas destas pessoas não acompanham os noticiários e muito menos leem a mídia impressa – isto sem falar de revistas especializadas ou livros. Formam a sua visão do que ocorre no país e no mundo baseados em notícias irreais, por vezes completamente absurdas, com as quais se deparam no Facebook, Twitter  ou Whatsap.

Que tipo de cidadão está assim se formando nestas condições? Um cidadão cujas opiniões estão baseadas em uma visão distorcida dos fatos, provavelmente por interesse de pessoas ou grupos que tiram vantagem desta situação. Sem o mais claro conhecimento dos fatos – ele nunca é total – não é possível que indivíduos tomem as decisões corretas sobre suas vidas. Estarão sempre pensando baseados em informações inverídicas e reagindo de modo a defender os interesses de outros.    

(Imagem: G. C. Lichtenberg)

Notas rápidas (homenagem a G.C. Lichtenberg)

quarta-feira, 11 de março de 2020


"As florestas ficam sempre menores, a madeira diminui, o que faremos? Nos tempos em que acabarem as florestas, certamente poderemos queimar livros, esperando até que novas árvores cresçam"

(G. C. Lichtenberg)  



Meio ambiente: hoje como ontem

A situação do meio ambiente no Brasil continua sem rumo. No plano federal, o Ministério do Meio Ambiente receberá recursos consideráveis, mas até o momento não desenvolveu qualquer plano detalhado sobre o uso a ser dado a estes importantes recursos. Lembremos que o ministério foi desmantelado, tendo vários de seus técnicos demitidos ou transferidos, e departamento completos – como o que acompanhava a questão das mudanças climáticas – desativados.

O Conselho da Amazônia, reinstalado pelo presidente Bolsonaro, e que será presidido pelo vice-presidente Mourão e formado por 14 ministérios, pretende retomar e integrar ações que no passado eram exercidas por outros ministérios de maneira independente. A ideia é boa se funcionar. O que falta saber – e o tempo dirá – se este Conselho terá a agilidade necessária para, através de decisões conjuntas, atuar de maneira rápida em situações como a da derrubada e queima da floresta. Caso permaneça sendo apenas um "conselho", terá pouca utilidade. 

Na área do saneamento a situação continua estagnada. À espera de aprovação do Senado, o novo marco regulatório de privatização desperta muitas críticas. O governo federal e os estaduais, por outro lado, não dispõem de recursos para continuarem com programas de saneamento, que se arrastam desde o primeiro governo Lula. Nos últimos dez anos, os dados sobre o setor praticamente em nada mudaram. Continuamos entre os países com os piores índices de saneamento na América Latina.

A Política Nacional de Resíduos continua sem avançar significativamente, já que a maior parte dos municípios ainda não apresentou seu Plano de Gestão de Resíduos e também não dispõe de recursos para implantar estes planos. O governo federal, como vem fazendo há quase uma década, lava suas mãos e diz que a responsabilidade é dos estados e dos municípios. Alguns setores da iniciativa privada fizeram avanços, mas no geral a situação não evolui. 

Em outras áreas do setor ambiental – solos contaminados, poluição atmosférica, recursos hídricos, comando e controle, etc., a situação também permanece inalterada. Faltam recursos, capacitação, equipamentos e, principalmente, estabelecer prioridades. Até quando?  

(Imagem: G. C. Lichtenberg)


Crise ambiental e crise de valores

sábado, 7 de março de 2020
"Naquelas paragens longínquas e ingratas o meio-dia é mais silencioso e lúgubre do que as mais tardias horas da noite."   -   Euclides da Cunha   -   Canudos e inéditos 


Recentemente, em entrevista ao jornal espanhol La Vanguardia, o economista Prêmio Nobel Joseph Stiglitz classificou a crise climática como uma das três principais crises do mundo atual. As outras duas seriam a crise do próprio sistema econômico, o capitalismo, e a crise dos valores.

Uma crise, seja qual for, não ocorre por motivos simples. Desde a relação dos indivíduos entre si e com o meio ambiente, às relações econômicas, aos sistemas de crença de uma sociedade; as crises são sempre mais abrangentes do que se avalia e têm causas diversas. É por isso que são tão difíceis de serem estudadas; tentar determinar-lhes as origens e as consequência exige muita informação, processamento de dados e capacidade de síntese.

Antes do aparecimento da espécie humana, existia no planeta apenas o complexo sistema da natureza, composto pelas inter-relações entre os indivíduos de cada espécie, entre as espécies, e destes com seu ecossistema. Em outro nível, havia a relação dos diversos ecossistemas entre si e com o ambiente físico e as condições climáticas. O planeta, por acomodar milhões de espécies vivas – microrganismos, plantas e animais – dispunha de uma complexidade de relações muito grande. Imagine-se um ambiente composto por plantas e animais, influenciado pelo clima e pelas condições geológicas, no qual todas as espécies estejam competindo por alimento e espaço vital para procriar.   

Com o aparecimento dos ancestrais dos humanos as relações no planeta se tornaram ainda mais complexas. Se no início de seu desenvolvimento a espécie homo era apenas mais uma a predar e a ser predada, o homo sapiens, com o desenvolvimento de artefatos e técnicas de caça mais eficientes, começava a influir no equilíbrio dos ecossistemas do planeta. Estudos recentes mostram que parte da antiga fauna australiana e americana foi dizimada por grupos humanos que atingiram estas regiões há 50 mil e 15 mil anos, respectivamente.  

O processo se tornou mais intrincado ainda, quando nossos antepassados inventaram a agricultura, há aproximadamente 10 mil anos. A partir deste ponto da história do planeta, nossa espécie passou a ter uma relação cada vez mais intensiva com o já existente sistema da natureza. Derrubamos florestas, aterramos pântanos, domesticamos plantas e animais para nosso uso. Criamos as cidades, os estados, novas tecnologias, descobrimos novos continentes, inventamos a indústria. Com todas estas atividades nossa espécie criou novas relações e sistemas que não existiam na natureza; criação das mentes de milhões, bilhões de indivíduos que nos antecederam – processo que nós continuamos até hoje no nosso dia a dia.

As incontáveis atividades que empresas, governos e indivíduos exercem diariamente também podem ser resumidas em sistemas de relações. São as relações econômicas, políticas e sociais, entre outras, que permeiam todas as atividades humanas, baseadas em nossas relações com a natureza, com o meio ambiente. Imagine-se o impacto sobre o meio ambiente natural quando da expansão da área agrícola, da abertura de uma mina, da exploração de um poço de petróleo, da abertura de um novo loteamento. No entanto, para que estas atividades de inegável impacto sobre o ambiente tenham início, há necessidade de leis, normas técnicas, contratos comerciais, de produção de máquinas, treinamento de profissionais, previsões econômicas, etc.

A crise climática tem direta relação com as outras crises; a do capitalismo e a dos valores. Não há como separar estas áreas em compartimentos estanques. A crise climática, ou seja, a gradual destruição dos recursos naturais, é resultado da maneira como atuamos sobre a natureza em nossas atividades econômicas – ou seja, nossa relação com a natureza. Esta atuação é baseada em valores, que justificam, validam e foram gestados por um sistema de relações econômicas: o capitalismo.


As crises, portanto, às quais se refere o economista Stiglitz, citado no início deste artigo, podem ser resumidas a uma: a do capitalismo.   

(imagens: pinturas Alfred Sisley)     

Notas rápidas (homenagem a G. C. Lichtenberg)

quarta-feira, 4 de março de 2020




"Nada contribui mais para a serenidade da alma, do que não termos qualquer opinião."

(G. C. Lichtenberg)



O auditório do Jair


Todo dia pela manhã, ao sair do Palácio da Alvorada, o presidente Bolsonaro é recebido por pequenos grupos de seguidores, que ficam à espera de uma oportunidade de apertar-lhe a mão ou tirar uma selfie com ele.

Na história humana as pessoas sempre tiveram necessidade de se aproximar de seus ídolos, das pessoas que admiram. Veneram as suas lideranças com um misto de medo e confiança. Em casos extremos renunciam às suas vontades e cegamente seguem o líder, abrindo mão de suas convicções.

Há inúmeros casos na história nos quais tribos, impérios e estados modernos foram levados a ações de todo o tipo, conduzidos por figuras proeminentes. Não interessa aqui saber como se constroem estas lideranças; quais acontecimentos levam ao aparecimento de verdadeiros ou de líderes fabricados. Nem cabe analisar as ações destes líderes; as diferenças, por exemplo, entre Adolf Hitler e Mahatma Gandhi. Também não vem ao caso que tipo de líder Jair Bolsonaro é; o fato é que tem admiração de parte da população.

Pessoas visitam o presidente Bolsonaro em Brasília, na sede do governo. É durante estes encontros com seus admiradores, que Bolsonaro recebe também a imprensa para a entrevista coletiva. Os jornalistas, de diversos veículos e mídias, muitas vezes são surpreendidos pelas reações e palavras agressivas do presidente.

Para o restante do público que foi encontrar o presidente pela manhã, no entanto, o momento é de descontração e divertimento. As reações momentâneas do presidente em nada conseguem embaçar a imagem que seus admiradores fazem dele. Sorrisos, risadas. O líder tem lá as suas idiossincrasias mas é admirado, enquanto os acontecimentos se sucederem e ainda o permitirem. Sempre foi assim.

(Imagem: G. C. Lichtenberg)