O Brasil está preparado para um vazamento de petróleo?

sábado, 30 de novembro de 2013
"The new religious wars are now really culture wars. They are not just about scientific history - about what best accounts for the development of the human species, for instance - but more fundamentally about the meaning of human life  and what living well means."  -  Ronald Dworkin  - Religion without God

Em outubro de 2013 o governo realizou o leilão da área de exploração de petróleo do Campo de Libra, na região onde se encontra a reserva do pré-sal. Esta, como tem sido noticiado, deve ser uma das maiores reservas de petróleo do mundo, identificada nos últimos anos. No entanto, a principal dificuldade de exploração do pré-sal é que o petróleo se encontra a uma profundidade média de sete mil metros, abaixo de cerca de cinco mil metros de água e solo, e mais dois mil metros de sal, depositado ali por um antigo mar.
O risco e a dificuldade de extração são muito grandes, o que aumenta os custos de exploração dos poços, fato que provavelmente foi uma das causas do pouco interesse de outros participantes no leilão da área de Libra. O único grupo a apresentar uma proposta para a área foi um consórcio formado pela anglo-holandesa Shell, a francesa Total, as chinesas CNPC e CNOOC e a Petrobrás. Grandes grupos do setor petrolífero como a inglesa BP, as americanas Exxon e Chevron não participaram do leilão. No plano nacional o leilão também despertou críticas tanto por parte dos petroleiros, contrários à privatização e internacionalização da exploração da área, quanto de grupos empresariais e outros especialistas, que se manifestaram quanto à falta de planejamento do processo.
Além das críticas dos petroleiros e dos empresários, não faltaram também as manifestações dos grupos ambientalistas. Segundo levantamentos, a exploração da reserva petrolífera do Campo de Libra resultará em emissões de cerca de cinco bilhões de toneladas de CO², volume correspondente ao total das emissões do País durante três anos. Estimativas dão conta de que o potencial total de emissões do pré-sal é de 35 bilhões de toneladas CO², que colocarão o Brasil entre os dez maiores emissores de gases de efeito estufa – isto sem contar as emissões de gases resultantes do desmatamento da Amazônia e da pecuária.
Outro aspecto ainda longe de estar equacionado é a questão do Plano Nacional de
Contingência, que deve estabelecer as medidas a serem tomadas no caso de um vazamento petrolífero. O risco de acontecer um vazamento é bastante alto, dados os desafios técnicos e logísticos envolvendo toda a exploração de petróleo em águas tão profundas. Além disso, existe o fato de que com relação às plataformas de exploração o Brasil atua com equipamento antigo, já que cerca de um terço das plataformas utilizadas, segundo ambientalistas, tem 30 ou mais anos de funcionamento. Logo após o anúncio do resultado do leilão, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, veio a público defender maiores penalidades para os culpados por acidentes de derramamento de petróleo, que atualmente alcançam multas de até R$ 50 milhões. A ministra disse que não se devem estabelecer valores, já que a indenização pode ser de R$ 200 milhões ou R$ 1 bilhão, dependendo da situação.
As críticas quanto ao planejamento do leilão têm fundamento. No aspecto ambiental, por exemplo, ficou claro que o assunto não é prioridade, tendo sido discutido somente a posteriori, depois de o Plano Nacional de Contingências ter sido estabelecido por decreto presidencial. No entanto, existe uma longa distância, principalmente no Brasil, entre a discussão de um plano de contingências e seu efetivo funcionamento - sabemos o que aconteceu na região serrana do estado do Rio de Janeiro. Assim, no caso de ocorrer um vazamento de petróleo e o plano de contingências não funcionar, os grandes prejudicados serão os milhões de habitantes e turistas da região Sudeste do País.
(Imagens: fotografias de François Kollar)     

Pensamento político

sábado, 23 de novembro de 2013
"Devemos estar dispostos a agir como se as pessoas fossem admiráveis ou culpadas por virtudes ou falhas pessoais - como se o livre arbítrio existisse, muito embora saibamos que, do ponto de vista metafísico, não existe. (Será que esse paradoxo identifica uma hipocrisia mesquinha no cerne da vida social humana? Certamente. Existe alguma maneira de evitar isso? Não que eu saiba)."  - Geoffrey Miller  -  Darwin vai às comprar - sexo evolução e consumo

O pensamento político é a maneira como determinado grupo de pessoas – porque a política é sempre coletiva – encara a atividade política. Quanto ao ato de fazer política escreve Aristóteles:
“Sabemos que toda cidade é uma espécie de associação, e que toda associação se forma almejando algum bem, pois o homem trabalha somente pelo que ele considera um bem. Por isso, todas as sociedades sugerem um lucro – sobretudo a mais importante delas, pois visa um bem maior envolvendo todas as demais: a cidade ou a sociedade política.” (Aristóteles, 2007).
Assim, segundo o Estagirita, a atividade política visa ao bem da cidade; da sociedade, já que os homens só se empenham por aquilo que eles consideram um bem. São as diversas maneiras de encarar o bem da cidade, ou seja, da sociedade, que distingue as diferentes formas de pensamento político. Este parte de conceitos prévios – idéias elaboradas por grupos sociais – e a partir destes pressupostos é construído o pensamento político. Este por sua vez apontará maneiras como seus defensores pretendem tomar o poder e exercê-lo, quando governantes.
O pensamento político modernamente espelha os interesses de classes, de grupos econômicos e sociais, que se juntaram em uma agremiação – associação, sindicato, partido político ou grupos de pressão – e que no embate democrático planejam aprovar leis que beneficiem seus integrantes. Por exemplo, um sindicato organizado e atuando em empresas com forte poder econômico (como as indústrias automobilísticas e os bancos) tem interesse em aprovar mudanças na lei trabalhista, de modo a beneficiar seus filiados. Um partido político, formado em grande parte por latifundiários ou apoiado financeiramente por estes, almejará aprovar leis e projetos que beneficiem seus correligionários e rejeitar outros que representem algum tipo de perigo para seus membros – como, por exemplo, um Código Florestal mais restritivo.
Um pensamento político bem elaborado tem uma plataforma completa, com respostas e propostas para resolver a maior parte ou pelo menos os mais importantes problemas da sociedade onde atua. E é exatamente pelos objetivos políticos, sociais e econômicos que pretende alcançar e pela maneira como pretende alcançá-los, que se caracteriza a orientação política de um partido. Em seu estatuto o Partido dos Trabalhadores diz:
“Art. 1º. O Partido dos Trabalhadores (PT) é uma associação voluntária de cidadãos e cidadãs que se propõem a lutar por democracia, pluralidade, solidariedade, transformações políticas, sociais, institucionais, econômicas, jurídicas e culturais, destinadas a eliminar a exploração, a dominação, a opressão, a desigualdade, a injustiça e a miséria, com o objetivo de construir o socialismo democrático.” (Partido dos Trabalhadores, 2012).
No parágrafo acima o PT descreve o que é e a que se propõe. Nos outros capítulos e artigos o estatuto do partido, elaborado pela comissão executiva nacional, descreve a maneira como o partido se organizará e atuará; como participará das eleições e como será sua disciplina interna. Toda esta organização faz parte do pensamento político do partido, descrevendo sua organização e estratégia de poder.
Evidentemente existem varias linhas de pensamento político, representadas ou não por partidos políticos. Grupos atuando de forma semi-organizada às margens dos movimentos políticos, como os “black blocs”, que se tornaram famosos a partir das manifestações populares ocorridas desde junho de 2013, também têm sua forma de pensamento político. O mesmo é válido para grupos políticos que atuavam na clandestinidade na época da ditadura militar; seja à extrema direita, como o C.C.C. (Comando de Caça aos Comunistas) quanto os diversos grupos guerrilheiros colocados na extrema esquerda (ALN – Aliança Libertadora Nacional, VAR Palmares – Vanguarda Armada revolucionária Palmares, entre outros).
Em última instância podemos dizer que a maior parte das organizações humanas, visando defender algum tipo de interesse, tem algum tipo de pensamento político, mesmo que pouco elaborado. Este pensamento pode estar misturado a idéias preconcebidas, estratégias de poder e às vezes delírios de dominação. Por vezes, se existirem condições históricas para tal, tais pensamentos políticos podem levar ao aparecimento de organizações como o partido nazista, o partido comunista Kampuchea (cujos membros eram os assassinos do chamado Khmer vermelho) ou o grupo Al Qaeda.
A melhor maneira – pelo menos até hoje – de permitir o surgimento do pensamento político das mais variadas tendências possíveis, sem que uma corrente se sobreponhas às outras e obtenha a exclusividade do discurso (seja pelo voto ou pela força), é através da manutenção da democracia. Só a democracia garante o debate franco e aberto das diversas tendências do pensamento político. Afinal, como sabe a filosofia e a sabedoria popular, “ninguém é dono da verdade”, que, dizem, pode nem existir.
Referências:
Aristóteles. A Política. São Paulo. Editora Ícone: 2007, 272 p.
Estatuto do Partido dos Trabalhadores. Disponível em:
(Imagens: portas e janelas em Iguape, SP - fotografias de Ricardo E. Rose)

Saneamento: os melhores e os piores

sábado, 16 de novembro de 2013
"Os poetas, idiotas como crianças, se extasiam diante dos vagalumes errantes do infinito. Para mim que não sou - por sorte ou azar - nem versificador nem místico, o céu é somente o velório sinistro em que leio toda noite a sentença da minha irremediável nulidade."  -  Giovanni Papini  -  Gog 

Tratamento de esgoto ainda continua sendo um problema no Brasil. Governos se sucedem a nível municipal, estadual e federal, mas os avanços são lentos. Diz o ditado que "obra enterrada, que não aparece, não dá votos". No entanto, administradores públicos que ainda pensam desta maneira - e pelo ritmo e quantidade das obras parece que são muitos - deveriam rever suas ideias. O tratamento de esgoto, segundo pesquisas, está entrando na lista dos itens mais cobrados pela população, junto com a melhoria da educação e do atendimento médico.
Recente estudo elaborado sobre o tema do saneamento pelo Instituto Trata Brasil descobriu que 61,4% da população das 100 maiores cidades do País têm acesso à coleta de esgoto - enquanto a média restante no Brasil continua sendo de 48,1%. Todavia, o volume de esgoto tratado nestas mesmas 100 cidades alcançou 38,5%, enquanto no restante do País este percentual é de 37,5%. Sobre este ponto o estudo conclui que "a lenta velocidade de avanço nesses serviços compromete a possibilidade do País atingir a universalização do saneamento nos próximos 20 anos, prazo contido no Plano Nacional de Saneamento Básico do Governo Federal".
Outro problema que deveria ser prioridade nos ministérios da Integração Nacional e das Cidades, por exemplo, é a questão da disponibilidade de água potável. No Brasil em média 82,4% da população têm acesso ao líquido, com percentuais menores nos estados do Norte de Nordeste. Nas 100 maiores cidade do País este índice atinge os 92,2%.
Com relação à perda de água tratada - seja por vazamentos na tubulação ou roubo - o prejuízo médio nas 100 maiores cidades foi de 40,08%; maior do que a média do restante do País (38%). No total, apenas quatro das 100 cidades apresentaram perda de água menor do que 15%. 22% apresentaram índices entre 15% e 30%. Com isso, 74% das cidades têm perdas maiores que 30% e 14 delas acima dos 60%.
O estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil foi feito baseados em dados de 2011, os mais atuais disponíveis no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis), do Ministério das Cidades. Dentre as 100 maiores cidades brasileiras pesquisadas, o município mineiro de Uberlândia é o que tem o melhor serviço de saneamento. A seguir vêm as cidades de Jundiaí (SP), Maringá (PR); as paulistas Limeira, Sorocaba, Franca, São José dos Campos, Santos e Ribeirão Preto, seguidas de Curitiba (PR). A lista das cidades que oferecem o pior serviço de saneamento é encabeçada por Ananindeua (PA), seguida por Santarém (PA), Macapá (AP), Joboatão de Guararapes (PE), Belém (PA), Porto Velho (RO), Duque de Caxias (RJ), São Luiz (MA), Teresina (PI) e Aparecida de Goiânia (GO). 
O Brasil é um dos países com os mais baixos índices de saneamento na América Latina. Muitas doenças, provocadas por águas contaminadas, ainda vitimam milhares de crianças em todo o País. O problema não é causado pela falta de recursos, já que bilhões de reais foram alocados para a construção dos estádios e demais obras de infraestrutura destinadas à Copa Mundial de Futebol em 2014. O que falta é priorizar o tema do saneamento; o que nos faz pensar: "Será que obra enterrada, que não aparece, não dá votos no Brasil?"
(Imagens: portas em Iguape, SP - fotografias de Ricardo E. Rose)

Mudança do clima afetará energia e agricultura

sábado, 9 de novembro de 2013
"Capitalismo é a crença impressionante de que os mais perversos entre os homens farão as coisas mais perversas para o bem maior de todos."  -  John Maynard Keynes  -  citado em Os 100 maiores visionários do século XX. 

No primeiro semestre deste ano, especialistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climática (IPCC) da ONU já haviam anunciado um grande aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE), que provocam o aquecimento da atmosfera e com isso as mudanças rápidas do clima. Recentemente, durante a primeira conferência nacional sobre o tema, especialistas brasileiros do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC) lançaram um relatório sobre como estas mudanças afetarão o Brasil em aspectos econômicos e sociais.
A publicação em três volumes foi preparada por 350 especialistas e traz uma série de diferentes previsões sobre o que poderá acontecer, dependendo de um aumento maior ou menor da temperatura da Terra. Segundo o documento, a temperatura média no Brasil poderá aumentar de 3º C a 6º C até 2100, o que deverá trazer mudanças no regime de chuvas das diferentes regiões - fato que influenciará bastante a agricultura e a geração de energia.
Na região amazônica, por exemplo, a temperatura média poderá subir 6º C, o que poderá trazer uma mudança na distribuição das chuvas, fazendo com que os índices pluviométricos caiam em até 45%. O fenômeno fará com que bacias hidrográficas tenham menos volume de água, alterando a vegetação e a fauna e provocando impacto nas atividades econômicas. O documento diz que o rio Tocantins, por exemplo, passando por Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará, sofrerá uma redução em 30% em seu escoamento. Tal fato afetaria a geração de energia nas grandes hidrelétricas - Tucuruí, Estreito, além de outras ainda por construir - ao longo do rio, desestabilizando a rede nacional de eletricidade. Outro provável aspecto é que com a redução dos índices pluviométricos na Amazônia e queda da evapotranspiração na floresta, as nuvens de chuva que usualmente se deslocam desta região para o Centro-Oeste, Sudeste e Sul, seriam menos volumosas.
Na região Nordeste o aumento da temperatura em mais 5,5º C aceleraria o processo de desertificação da região, destruindo o já bastante afetado bioma da Caatinga. A área do Agreste ficaria cada vez mais seca e imprópria para a atividade agrícola, provocando a gradual migração de milhões de sertanejos para as capitais ou outras regiões do país. Outra situação apresentada pelo relatório é o aumento de 30% das chuvas na maior parte da região Sudeste e de 40% no Sul. Ainda na região Sul, a bacia dos rios Paraná e Prata terá um aumento de vazão entre 10% a 40%.  
Com todas estas mudanças no regime das chuvas e nas temperaturas médias, o Brasil também enfrentará grandes desafios no setor agrícola. Especialistas que analisaram a situação preveem que a produtividade das culturas de soja poderá cair em 20% nos próximos sete anos, chegando a uma queda de 24% até 2050. Da mesma forma, a cultura do arroz poderá encolher em 7,5%, a do algodão 4,7% e a do milho 16%.
É importante observar que estas previsões não são sentenças e não ocorrerão da noite para o dia. Muito depende de como será o aumento das emissões por todo o globo. Países que até agora não assumiram compromisso de reduzir sua geração de gases, como a China, os Estados Unidos, o Japão e inclusive o Brasil, deverão adotar obrigações em futuro próximo. No caso do Brasil há que se investir muito mais na geração de energia de fontes renováveis e diminuir definitivamente os desmatamentos na Amazônia. 
(Imagens: portas em Iguape, SP - fotografias de Ricardo E.Rose) 

Mobilidade e mortalidade

sábado, 2 de novembro de 2013
"Considere sentenças como fios que ligam sinais e ruídos emitidos pelos organismos, fios capazes de ser associados aos fios que nós mesmos expressamos (através do processo que chamamos de 'tradução'). Considere crenças desejos e intenções - atitudes sentenciais em geral - como entidades que são postuladas para ajudar a predizer o comportamento dos organismos."  -  Richard Rorty  -  Ensaios sobre Heidegger e outros escritos filosóficos

Em seu relatório anual publicado em final de 2012, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) informa que a poluição do ar por ozônio bateu recorde na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Por um período de 98 dias em 2012 o paulistano respirou ar com padrões de ozônio bem acima dos normais, dado que em mais da metade dos dias do ano passado a contaminação da atmosfera por excesso de ozônio ficou nas categorias "regular", "inadequada" e "má". Das 19 estações de medição deste poluente espalhadas na região metropolitana, as de Ibirapuera, na zona sul de São Paulo, e as de São Caetano do Sul, no ABC paulista, foram as que registraram o maior número de dias - 17 no total - de "estado de atenção".
O ozônio se forma a partir da reação entre óxidos de nitrogênio e compostos orgânicos voláteis, liberados na queima incompleta de combustíveis quando na presença do sol. O gás produz uma série de substâncias agressivas e aerossóis que afetam a saúde humana e a vegetação. A concentração de ozônio sofre influência das condições atmosféricas e da temperatura, apresentando maior acumulação entre a primavera e o verão. "Quem tem problemas como asma, rinite ou enfisema sofre mais. Mas a poluição também pode desencadear inflamações graves a longo prazo", segundo o pneumologista  Clystenes Soares, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O ozônio é gerado principalmente pelos gases de combustão liberados pelos quase 11 milhões de veículos que circulam nos 39 municípios da RMSP. Programas de controle de emissões veiculares até o momento só foram implantados no município de São Paulo, monitorando uma frota de cerca de 7,5 milhões de veículos. Apesar disso, nossos padrões de emissão - sejam para veículos a gasolina/álcool quanto para diesel - ainda continuam abaixo dos parâmetros estabelecidos em países mais avançados nesta área. Consequentemente, não havendo limites de emissões de poluentes mais restritivos para os veículos, os fabricantes também não se sentem obrigados a melhorarem a eficiência de seus veículos.  
Com isso o ar da região metropolitana torna-se cada vez mais poluído, situação que vem a afetar a saúde dos habitantes da cidade. Um estudo, realizado pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade e apresentado recentemente em um seminário sobre mobilidade urbana e saúde pública, informa que pelo menos 4.655 pessoas morreram em 2011 na capital paulista em decorrência da poluição do ar. Este número é superior ao de mortes anuais no trânsito (1.556), três vezes superior ao de vítimas de câncer de mama (1.277) e quase seis vezes superior ao de vítimas da Aids (874).

No caso das mortes causadas pela poluição, o difícil é comprovar que os poluentes atmosféricos sejam os únicos responsáveis pelos óbitos. Doenças pregressas - muitas delas provavelmente também causadas pela poluição - hábitos de vida, alimentação, predisposição genética, são fatores que associados à má qualidade do ar na RMSP contribuem para as mortes computadas no estudo.
Fato é que os índices de poluição atmosférica na RMSP são resultado de uma política de mobilidade míope, voltada para o transporte individual, sem contemplar a construção de sistemas de transporte público; mais eficientes e menos poluentes - principalmente se realizados sobre trilhos. A necessidade de ter um carro próprio transformou-se em um pesadelo mortal nas cidades grandes.
(Imagens: fotografias de William Heick)