E. M. Cioran

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

 

“Basta-me ouvir alguém falar sinceramente de ideal, de futuro, de filosofia, ouvi-lo dizer ‘nós’ com um tom de segurança, invocar os ‘outros’ e sentir-se seu intérprete, para que o considere meu inimigo. Vejo nele um tirano fracassado, quase um carrasco, tão odioso quanto os tiranos e os carrascos de alta classe. É que toda fé exerce uma forma de terror, ainda mais temível quando os ‘puros’ são seus agentes. Suspeita-se dos espertos, dos velhacos, dos farsantes; no entanto não poderíamos atribuir-lhes nenhuma das grandes convulsões da história; não acreditando em nada, não vasculham nossos corações, nem nossos pensamentos mais íntimos; abandonam-nos à nossa indolência, ao nosso desespero ou à nossa inutilidade; a humanidade deve a eles os poucos momentos de prosperidade que conheceu: são eles que salvam os povos que os fanáticos e que os ‘idealistas’ arruínam. Sem doutrinas, só possuem caprichos e interesses, vícios complacentes, mil vezes mais suportáveis que os estragos provocados pelo despotismo dos princípios; porque todos os males da vida provêm de uma ‘concepção da vida’. Um homem político completo deveria aprofundar-se nos sofistas antigos e tomar aulas de canto; e de corrupção...” (Cioran, pág. 13)

 

E. M. Cioran (1911-1995), filósofo e escritor franco-romeno em Breviário de Decomposição

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