"A Terra real não precisa ser salva. Pôde, ainda pode e sempre será capaz de se salvar, e agora está começando a fazê-lo, mudando para um estado bem menos favorável a nós e outros animais. O que as pessoas querem dizer com o apelo é 'salvar o planeta como o conhecemos', e isso agora é impossível." - James Lovelock - Gaia: alerta final
A
modernidade foi um período na história cultural da humanidade que se estendeu
aproximadamente da Revolução Francesa, no final do século XVIII, até meados do
século XX. Estes critérios não são unânimes, porque alguns historiadores e
sociólogos consideram o século XVI como início deste período. Outros afirmam que
a modernidade ainda não terminou e que a expressão “pós-moderno” não tem razão
de ser.
A
divisão da história em períodos (Antiguidade, Idade Média e Modernidade),
iniciada pelo historiador alemão Christoph Cellarius (1634-1707), não é isenta
de influências ideológicas, representando interpretações de períodos da história
da humanidade baseados em paradigmas culturais. No entanto, para seguir a
interpretação majoritária, consideraremos que a modernidade teve início com a
Revolução Francesa e terminou na metade do século XX, por razões que
explicaremos ao longo do texto.
O
ponto principal da discussão sobre a modernidade tem a ver com a “mentalidade
moderna”; uma maneira diferente de encarar o mundo; uma nova cultura – em
comparação e oposição à mentalidade e cultura medieval. A temática não é nova e
já ocupou os enciclopedistas, que foram os principais propagandistas da idéia
de que a Idade Média foi um período de ignorância e opressão, o “período das
trevas”. Sob esta perspectiva, pode-se considerar que o surgimento do
protestantismo, da imprensa e o contato com as novas culturas das terras recém
descobertas no século XVI, já contribuíram para a formação de uma mentalidade
moderna.
Outro
grande marco na formação da modernidade foi o surgimento da moderna ciência com
Francis Bacon (1561-1626) e Galileu (1564-1642) junto com o desenvolvimento da
matemática (geometria analítica) e da moderna filosofia (metafísica) por
Descartes. A física newtoniana, que tanto influenciou o filósofo Voltaire – um
dos inspiradores da Revolução Francesa – também é considerada um grande marco
na formação da mentalidade moderna. Na França o século XVIII vê nascer a Enciclopédie,
a enciclopédia; reunião de todos os conhecimentos disponíveis à época e
colocados à disposição em livros para aqueles que os podiam comprar.
Teoricamente, todo o conhecimento acumulado pela humanidade – artes,
tecnologias, história, ciências – estava disponível para o cidadão.
A
divulgação da cultura e da educação foi uma revolução nunca vista e só
ultrapassada pela Revolução Francesa, o mais importante evento político da
humanidade – na perspectiva dos modernos. A revolta representou um marco no
surgimento do indivíduo político; o cidadão com seus direitos, não mais
passível de escravidão e opressão. Em síntese: o início do homem moderno e da
modernidade.
A
Revolução Francesa abria novas perspectivas para a humanidade em todas as
áreas. Se, por um lado, a Igreja Católica ainda forte na França, perdia
gradualmente seu poder opressor, a filosofia alemã – com Kant, Fichte,
Schelling e Hegel – saudava o evento como grande marco na história e absorvia
sua ideologia de valorização do homem moderno – mesmo que Hegel mais tarde
ficasse desiludido com os rumos tomados pela revolução.
Além
da cultura – chamada de superestrutura pelos marxistas – também contribuíram na
formação do homem moderno os inventos tecnológicos e as mudanças na estrutura
econômica (infraestrutura, segundo Marx). O mercantilismo, entre os séculos XVI
e XVIII, foi responsável por modificar as estruturas sociais, aproximando povos
através do comércio mundial – alguns autores localizam neste período o início
de um processo de globalização das relações econômicas, culturais, ambientais,
que se tornou cada vez mais acentuado até nossos dias. O desenvolvimento da
economia cria novas demandas tecnológicas e propiciou o aparecimento de novos
inventos, dando início à industrialização da sociedade ocidental, iniciada no
final do século XVIII em cidades como Manchester e Liverpool, na Inglaterra, para daí espalhar-se para a Europa, Estados Unidos e o resto do mundo.
O
avanço da industrialização da Europa e a sucessão de descobertas científicas e
invenções tecnológicas aumentavam cada vez mais a fé no progresso e na gradual
melhoria da condição de vida humana, pelo menos para os grupos política e
economicamente dominantes – como, aliás, sempre aconteceu em todas as
civilizações. Foi também nesse ambiente social e econômico que entre o final do
século XIX e início do século XX surgiram ideologias que julgavam possuir a
solução para todos os males da humanidade, através da instituição de novas
ordenações políticas e econômicas: anarquistas, socialistas, comunistas, social
democratas, fascistas e nacional-socialistas (nazistas). Havia – e ainda os há
em pouca quantidade felizmente – uma vasta gama de reformadores, que imbuídos
de um messianismo fanático diziam querer melhorar a condição da humana.
Demonstrou a história que só seguiam seus mais baixos interesses ou, no melhor
dos casos seus delírios insanos.
Temos
então, resumidamente, alguns aspectos da chamada “modernidade” fortemente
valorizados (em parte até nossos dias), mas considerados grandes engodos pela
crítica pós-moderna. Algumas destas falácias da modernidade incluem:
a)
Supostos valores da modernidade: valorização do indivíduo, associado a paradigmas
como democracia e direitos humanos. Crítica da pós-modernidade: o imperialismo
capitalista, propiciando a exploração de países fornecedores de matéria-prima e
mão de obra desde o início do século XX; países transformados em colônias; duas
guerras mundiais; genocídios; Hiroshima e Nagasaki, entre outros exemplos não
muito edificantes.
b)
Supostos valores da modernidade: racionalidade atuando em benefício da
humanidade; educação e cultura elevando o padrão de vida. Crítica da
pós-modernidade: uso da ciência para fins bélicos; massificação da cultura
utilizada para fins econômicos; educação como formadora de mão-de-obra; destruição
dos ecossistemas e recursos naturais da Terra.
c)
Supostos valores da modernidade: sistemas filosóficos e ideológicos capazes de
explicar e dar um sentido às sociedades humanas e à história; ciência como
detentora da verdade em substituição às religiões. Crítica da pós-modernidade:
ideologias que escravizaram os povos e os indivíduos impedindo seu livre
desenvolvimento; doutrinas pseudo-políticas racistas, classistas, promovendo
destruição e morte: Stalin, Hitler, Pol Pot, Mao Dze Dong e outros açougueiros;
ciência como forma de interpretar a realidade, sempre sujeita a mudança de
paradigmas; acabaram-se as verdades.
Associar
a modernidade a valores políticos, culturais, econômicos, religiosos e sociais
apresentados como “modernos”, “libertadores”, “progressistas” justifica a
crítica ao moderno. O futuro radiante avistado por entusiastas de todos os
tipos dos séculos XVIII, XIX e parte do XX, não se concretizou. No final,
depois de tantas ideologias, os valores efetivamente importantes que nos
sobraram foram a democracia, que nunca será completa, e a liberdade individual
do ser humano.
Que
seja bem-vinda a era pós-moderna!
Referências:
Um
panorama da modernidade: origem, formação e perspectivas. Disponível em: <http://www.unimep.br/phpg/editora/revistaspdf/imp29art06.pdf>.
Acesso em 13/12/2013.
Modernidade.
Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Modernidade>
. Acesso em 13/12/2013.
Mahavishnu
Orchestra – The lost Trident sessions. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=C7lDW1OHK9k>.
Acesso em 13/12/2013.
Periodização
da história. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Periodiza%C3%A7%C3%A3o_da_Hist%C3%B3ria>.
Acesso em 13/12/2013.
(Imagens: vegetação de restinga - fotografias de Ricardo E. Rose)
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