(publicado originalmente na página da Academia Peruibense de Letras no Facebook)
Albert Camus foi romancista,
jornalista, ensaísta e filósofo francês, nascido na Argélia em 1913 (então
colônia francesa). De origem pobre, passou por privações durante a infância,
sustentado por sua mãe, uma faxineira surda e analfabeta. Seu pai, convocado
para a Primeira Grande Guerra (1914-1918), morreu em batalha quando Albert
tinha um ano. Bom aluno na escola, Albert foi incentivado por um professor a se
aprofundar nos estudos dos clássicos gregos e romanos, o que lhe deu uma base
cultural para seu estudos posteriores. Além dos estudos, Albert era entusiasta
do futebol, atuando como goleiro do time de sua faculdade; atividade que teve que
abandonar aos 17 anos, quando teve sua primeira crise de tuberculose.
Para poder se manter durante
seus estudos de filosofia, Camus teve vários trabalhos temporários; foi
professor particular, vendedor e funcionário do instituto meteorológico da
Argélia. Paralelamente, a partir de 1935, passa a atuar como jornalista de
diversos jornais algerianos e funda uma companhia de teatro popular, que também
encena peças escritas por ele. Casa-se, mas o casamento logo acaba, assim como
sua filiação ao Partido Comunista Francês, do qual é expulso acusado de não ser
comunista ortodoxo. Gradua-se em filosofia e artes em 1936.
Já na França, em 1940,
casa-se outra vez e torna-se pai de dois filhos. Participa do movimento da
Resistência, escrevendo artigos para jornais clandestinos. Já a partir desta
época, Camus repudia toda a forma de autoritarismo político, criticando o
comunismo. Essa a principal razão do desentendimento com Jean Paul Sartre e
outros filósofos, que a partir do final da Segunda Grande Guerra passam a
apoiar o comunismo soviético. No final dos anos 1940 Camus empreende uma viagem
por vários países, passando inclusive por cidades do Brasil, para divulgar a
filosofia francesa. Em São Paulo visita Iguape, junto com Oswald de Andrade,
viagem sobre a qual relata o texto que reproduzimos logo abaixo.
Sempre voltado ao pacifismo
e à defesa dos direitos humanos, Camus demite-se de seu cargo na UNESCO
(Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), quando a ONU
aceitou a Espanha como membro - país então governado pelo ditador Francisco
Franco. Em 1957, Camus foi agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura. Em 4 de
janeiro de 1960, aos 46 anos, Albert Camus morre em um acidente
automobilístico.
Um dos grandes temas
abordados pelo escritor em suas obras é a ideia do absurdo. Este aparece em seu
ensaio filosófico "O mito de Sísifo" e nos romances "O
Estrangeiro" e "A Peste". O absurdo, segundo Camus, é o
resultado de nossa busca por sentido e clareza, em um mundo que não as contêm. A
obra do autor é formada por romances como "O estrangeiro" (1942);
"A peste" (1947); "A queda" (1956); "A morte
feliz" (publicado postumamente em 1971); e "O primeiro homem"
(1995, póstumo) e ensaios filosóficos, como "O mito de Sísifo" (1942)
e "O homem revoltado" (1951). Além disso, Camus também escreveu
ensaios culturais e políticos e peças de teatro. Selecionamos os seguintes
trechos de obras de Camus:
De "O mito de Sísifo
(Editora Guanabara, 1989):
Já
deu para compreender que Sísifo é o herói absurdo. Ele o é tanto por suas
paixões como por seu tormento. O desprezo pelos deuses, o ódio à Morte e a
paixão pela vida lhe valeram esse suplício indescritível em que todo o ser se
ocupa em não completar nada. É o preço a pagar pelas paixões deste mundo. Nada
nos foi dito sobre Sísifo nos infernos. Os mitos são feitos para que a
imaginação os anime. Neste caso, vê-se apenas todo o esforço de um corpo
estirado para levantar a pedra enorme, rolá-la e fazê-la subir a encosta,
tarefa cem vezes recomeçada.
Do "Caderno de
viagem" de Camus, citado por Manuel da Costa Pinto em artigo "O
mediterrâneo é aqui", publicado em 7 Clássicos Franceses (Editora Duetto,
2010):
Uma
vez mais, durante horas e horas, olho para esta natureza monótona e estes
espaços imensos; não se pode dizer que sejam belos, mas colam-se à alma de uma
forma insistente. País em que as estações se confundem umas com as outras; onde
a vegetação inextrincável se torna disforme; onde os sangues misturam-se a tal
ponto que a alma perdeu seus limites. Um marulhar pesado, a luz esverdeada das
florestas, o verniz de poeira vermelha que cobre todas as coisas, o tempo que
se derrete, a lentidão da vida rural, a excitação breve e insensata das grandes
cidades - é o país da indiferença e da exaltação. Não adianta o arranha-céu,
ele ainda não conseguiu vencer o espírito da floresta, a imensidão, a
melancolia. São os sambas, os verdadeiros, que exprimem melhor o que quero
dizer.
De "O homem
revoltado" (Editora Record, 2011):
A
insurreição humana, em suas formas elevadas e trágicas, não é nem pode ser
senão um longo protesto contra a morte, uma acusação veemente a esta condição
regida pela pena de morte generalizada. Em todos os casos que encontramos, o
protesto dirige-se sempre a tudo aquilo que, na criação, é dissonância,
opacidade, solução de continuidade. Trata-se, portanto, no essencial, de uma
interminável exigência de unidade. A recusa da morte, o desejo de duração e de
transparência são as molas de todas estas loucuras, sublimes e pueris. Trata-se
somente da recusa covarde e pessoal de morrer? Não, porque muitos desses
rebeldes pagaram o preço necessário para ficar à altura de suas exigências. O
revoltado não exige a vida, mas as razões da vida. Ele rejeita as consequências
que a morte traz. Se nada perdura, nada justifica, aquilo que morre fica
privado de sentido. Lutar contra a morte equivale a reivindicar o sentido da
vida, a lutar pela ordem e pela unidade.
(Imagem: fotografia de Albert Camus)
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