(publicado originalmente na página da Academia Peruibense de Letras no Facebook)
Carlos Drummond de Andrade
(1902-1987) foi um dos maiores poetas brasileiros, além de contista e cronista.
Descendia de uma família de produtores rurais, estabelecida em Minas Gerais há
gerações. Drummond estudou em Belo Horizonte e em Nova Friburgo, no Colégio
Anchieta, de jesuítas. Nesta instituição, o que mais fascinava o rapaz era a
aura de intelectualidade e a constante busca de conhecimentos dos professores. Por
um desentendimento com um professor, o futuro poeta foi expulso do colégio. O
fato o marcou bastante, a ponto de fazê-lo declarar: "Perdi a fé. Perdi
tempo. Sobretudo, perdi a confiança na justiça dos que me julgavam." De
volta a Belo Horizonte, Drummond ingressa na Universidade Federal de Minas
Gerais, onde conclui o curso de Farmácia. Casa-se com Dolores Dutra de Morais,
com quem teve dois filhos, um dos quais falece logo após o parto.
Drummond começa a escrever
em 1921, quando publica artigos no jornal "Diário de Minas Gerais".
No ano seguinte é premiado em um concurso literário com seu conto "Joaquim
no Telhado". Em 1928, publica seu poema "No Meio do Caminho" na
Revista de Antropofagia, editada em São Paulo por integrantes do movimento modernista.
O poema provocou escândalo, por sua constante repetição de certas expressões e
pelo uso de "tinha uma pedra" ao invés de "havia uma
pedra". Ainda em 1928 Drummond entra para o serviço público, no qual
atuaria durante toda a sua vida profissional. Em 1934 muda-se de Minas Gerais
para a cidade de Rio de Janeiro, onde trabalha como chefe de gabinete do então
ministro da Educação Gustavo Capanema, antigo colega do poeta no grupo "Os
intelectuais da rua Bahia".
Nos anos seguintes, Drummond
publica obras poéticas, estreia como ficcionista e traduz autores como Balzac,
Frederico Garcia Lorca e Molière. Durante os anos 1960 e 1970 o poeta também
escreve uma série de crônicas para jornais do Rio de Janeiro. Drummond morreu
em 17 de agosto de 1987, doze dias após o falecimento de sua filha, cuja morte muito o
abalou. As principais obras poéticas do autor são: "Alguma Poesia"
(1930); "Brejo das Almas" (1934); "Sentimento do Mundo"
(1940); "José" (1942); "A Rosa do Povo" (1945); "Lição
de Coisas" (1962); "Boitempo" (1968); "Amar Se Aprende
Amando" (1985), entre outras. Drummond também escreveu antologias (entre
elas "Antologia Poética", 1962), vasta obra em prosa, além de livros
infantis.
Poeta da segunda geração do
Modernismo - iniciado pelos paulistas Mario e Oswald de Andrade, entre outros -,
Drummond, a exemplo destes, também escreve em verso livre. Segundo o crítico
literário Alfredo Bosi, a poesia de Drummond alcança um grau de sofisticação e
universalidade, que o coloca além das referências literárias comuns e acima de
todas as marcas ideológicas. De sua obra selecionamos os poemas abaixo, que
constam da obra "Carlos Drummond de Andrade - Antologia Poética"
(Companhia das Letras, 2013):
Cidadezinha
qualquer
Casas
entre bananeiras
mulheres
entre laranjeiras
pomar
amor cantar.
Um
homem vai devagar.
Um
cachorro vai devagar.
Um
burro vai devagar.
Devagar...
as janelas olham.
Eta
vida besta, meu Deus.
(Antologia
Poética, 1962)
Cerâmica
Os
cacos da vida, colados, formam uma estranha xícara.
Sem
uso,
ela
nos espia do aparador.
(Lição
das Coisas, 1962)
Tristeza
no céu
No
céu também há uma hora melancólica.
Hora
difícil, em que a dúvida penetra nas almas.
Por
que fiz o mundo? Deus se pergunta
e
se responde: Não sei.
Os
anjos olham-no com reprovação.
e
plumas caem.
Todas
as hipóteses: a graça, a eternidade, o amor
caem,
são plumas.
Outra
pluma, o céu se desfaz.
Tão
manso, nenhum fragor denuncia
o
momento entre tudo e nada,
ou
seja, a tristeza de Deus.
(José,
1942)
(Imagem: fotografia de Carlos Drummond de Andrade)
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