Carlos Drummond de Andrade

sábado, 20 de janeiro de 2018

(publicado originalmente na página da Academia Peruibense de Letras no Facebook)

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) foi um dos maiores poetas brasileiros, além de contista e cronista. Descendia de uma família de produtores rurais, estabelecida em Minas Gerais há gerações. Drummond estudou em Belo Horizonte e em Nova Friburgo, no Colégio Anchieta, de jesuítas. Nesta instituição, o que mais fascinava o rapaz era a aura de intelectualidade e a constante busca de conhecimentos dos professores. Por um desentendimento com um professor, o futuro poeta foi expulso do colégio. O fato o marcou bastante, a ponto de fazê-lo declarar: "Perdi a fé. Perdi tempo. Sobretudo, perdi a confiança na justiça dos que me julgavam." De volta a Belo Horizonte, Drummond ingressa na Universidade Federal de Minas Gerais, onde conclui o curso de Farmácia. Casa-se com Dolores Dutra de Morais, com quem teve dois filhos, um dos quais falece logo após o parto.

Drummond começa a escrever em 1921, quando publica artigos no jornal "Diário de Minas Gerais". No ano seguinte é premiado em um concurso literário com seu conto "Joaquim no Telhado". Em 1928, publica seu poema "No Meio do Caminho" na Revista de Antropofagia, editada em São Paulo por integrantes do movimento modernista. O poema provocou escândalo, por sua constante repetição de certas expressões e pelo uso de "tinha uma pedra" ao invés de "havia uma pedra". Ainda em 1928 Drummond entra para o serviço público, no qual atuaria durante toda a sua vida profissional. Em 1934 muda-se de Minas Gerais para a cidade de Rio de Janeiro, onde trabalha como chefe de gabinete do então ministro da Educação Gustavo Capanema, antigo colega do poeta no grupo "Os intelectuais da rua Bahia".

Nos anos seguintes, Drummond publica obras poéticas, estreia como ficcionista e traduz autores como Balzac, Frederico Garcia Lorca e Molière. Durante os anos 1960 e 1970 o poeta também escreve uma série de crônicas para jornais do Rio de Janeiro. Drummond morreu em 17 de agosto de 1987, doze dias após o falecimento de sua filha, cuja morte muito o abalou. As principais obras poéticas do autor são: "Alguma Poesia" (1930); "Brejo das Almas" (1934); "Sentimento do Mundo" (1940); "José" (1942); "A Rosa do Povo" (1945); "Lição de Coisas" (1962); "Boitempo" (1968); "Amar Se Aprende Amando" (1985), entre outras. Drummond também escreveu antologias (entre elas "Antologia Poética", 1962), vasta obra em prosa, além de livros infantis.

Poeta da segunda geração do Modernismo - iniciado pelos paulistas Mario e Oswald de Andrade, entre outros -, Drummond, a exemplo destes, também escreve em verso livre. Segundo o crítico literário Alfredo Bosi, a poesia de Drummond alcança um grau de sofisticação e universalidade, que o coloca além das referências literárias comuns e acima de todas as marcas ideológicas. De sua obra selecionamos os poemas abaixo, que constam da obra "Carlos Drummond de Andrade - Antologia Poética" (Companhia das Letras, 2013):


Cidadezinha qualquer

Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.

(Antologia Poética, 1962)



Cerâmica

Os cacos da vida, colados, formam uma estranha xícara.

Sem uso,
ela nos espia do aparador.

(Lição das Coisas, 1962)



Tristeza no céu

No céu também há uma hora melancólica.
Hora difícil, em que a dúvida penetra nas almas.
Por que fiz o mundo? Deus se pergunta
e se responde: Não sei.

Os anjos olham-no com reprovação.
e plumas caem.

Todas as hipóteses: a graça, a eternidade, o amor
caem, são plumas.

Outra pluma, o céu se desfaz.
Tão manso, nenhum fragor denuncia
o momento entre tudo e nada,
ou seja, a tristeza de Deus.

(José, 1942)

(Imagem: fotografia de Carlos Drummond de Andrade)

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