(publicado originalmente na página da Academia Peruibense de Letras no Facebook)
O poeta, ensaísta, escritor, pensador e político Antero Tarquínio de Quental, ou Antero de Quental, nasceu em 1842 na
ilha de São Miguel, no arquipélago de Açores, Portugal. Aos 16 anos mudou-se
para Coimbra, onde estudou direito. Nessa época já começou a dedicar-se à
literatura, fundando junto com outros literatos a Sociedade do Raio, que tinha
como objetivo a renovação da literatura portuguesa.
Antero de Quental viveu em
uma época de grande ebulição política na Europa, coincidindo com o período em
que Portugal começava a se modernizar, com a introdução do telégrafo, das
ferrovias e das primeiras indústrias. Nesse ambiente, influenciado pelas ideias
políticas anarquistas do francês Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), Quental
vai trabalhar como operário em uma tipografia e torna-se um dos fundadores do
Partido Socialista Português.
Dotado de grande cultura e
interessado em todos os assuntos de sua época, da economia e política às
ciências, passando pela filosofia e literatura, Quental continua publicando
ensaios filosóficos, poemas e artigos em diversos periódicos. Através de suas
atividades culturais, priva da amizade dos grandes escritores portugueses de
sua época, como Eça de Queiróz, Abílio de Guerra Junqueiro e Ramalho Ortigão.
Em 1873 herda uma soma
considerável e muda-se para a pequena Vila do Conde, cidade nos arredores da
cidade do Porto, para tratar problemas de saúde que o assolavam. Quental além
da tuberculose, também sofria de profunda depressão e do que hoje é conhecido
como transtorno bipolar. A doença psíquica influenciou muito sua atividade
literária e sua vida pessoal. Em 1891, em uma de suas profundas crises, suicidou-se
com dois tiros de pistola em um banco de jardim.
Poeta-filósofo, Antero de
Quental foi comparado pelo escritor e ensaísta português Adolfo Casais Monteiro
(1908-1972) aos antigos filósofos pré-socráticos, que transmitiram suas ideias
filosóficas através de poemas. Em sua poesia, Quental tratou de temas
universais da humanidade, que na cultura filosófica de sua época ainda eram
ligados à metafísica. Sentido e valor da vida humana, bem e mal, foram temas
que Quental também discutiu em seus ensaios filosóficos e sua numerosa
correspondência.
As principais obras de
Antero de Quental incluem "Sonetos de Antero" (1861); "Odes
modernas" (1865); "Bom senso e bom gosto" (opúsculos, 1865); "A poesia
na atualidade" (1881); "Sonetos completos" (1886); "A
filosofia da natureza dos naturistas" (ensaios filosóficos, 1886); e
"Tendências gerais da filosofia na segunda metade do século XIX"
(ensaios filosóficos, 1890), entre as principais.
Abaixo transcrevemos trechos
da obra de Quental, tomados do livro "Antero de Quental - Poesia e
prosa" (Livraria Agir Editora, 1972):
O Inconsciente
O espectro familiar que anda
comigo,
Sem que pudesse ainda
ver-lhe o rosto,
Que umas vezes encaro com
desgosto,
E outras muitas ansioso
espreito e sigo,
É um espectro mudo, grave,
antigo,
Que parece a conversas mal
disposto...
Ante este vulto, ascético e
composto
Mil vezes abro a boca... e
nada digo.
Só uma vez ousei
interrogá-lo:
"Quem és (lhe perguntei
com grande abalo)
Fantasma a quem odeio e a
quem amo?"
- "Teus irmãos
(respondeu) os vãos humanos,
Chamam-me Deus, há mais de
dez mil anos...
Mas eu por mim não sei como
me chamo..."
(Da obra "Sonetos
Completos")
O universo aspira com efeito
à liberdade, mas só no espírito humano a realiza. É por isso que a história é
especialmente o teatro da liberdade. Os que veem na história um simples
prolongamento da natureza, um fenômeno natural, só mais complexo, desconhecem
inteiramente o verdadeiro caráter da evolução. O direito, devemos supô-lo, é já
a aspiração inconsciente do animal: mas só às sociedades humanas preside
efetivamente o direito.
(Da obra "Tendências gerais da filosofia na segunda metade do século XIX".).
(Imagem: retrato de Antero de Quental - pintura de Columbano Bordalo Ribeiro)
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