O que será este impulso, a vontade inconsciente que todo ser vivo tem de sobreviver? E no ser humano, uma vontade de sobreviver eternamente?
No
caso de nós humanos, pressupõem-se que esta sobrevivência seja de modo
positivo, ou seja, que traga ao indivíduo uma situação prazerosa por longo
tempo - o máximo possível.
Mas,
e quando não é assim? Não há casos em que indivíduos, dotados de todas as suas
faculdades, não têm mais vontade de viver, por causa de profundo desconforto
provocado, por exemplo, por uma doença? Há casos como esses relatados na
literatura, em filmes, e muitos conhecemos situações como esta na vida real.
Assim,
há situações nas quais nem todos os humanos tem vontade de viver/sobreviver -
pelo menos em condições ditas terrenas - eternamente. Quando chega a dor
provocada pela doença de qualquer tipo, a vontade de viver se reduz.
Poderia
se admitir que a maior parte das pessoas gostaria de viver muito/eternamente,
se as condições prazerosos de que gozam no momento fossem mantidas. Isto quer
dizer que a maior parte das pessoas não quer simplesmente "existir" eternamente;
quer, em outras palavras, eternizar sua situação de prazer.
Mesmo
se no momento não vivem em circunstâncias boas, agradáveis, prazerosas, esperam
que no além (no Paraíso, Plano Astral, ou outra denominação qualquer) possam "viver
olhando a face de Deus" (alguém sabe exatamente o que isso significa?),
"encontrar os entes queridos" (esquecem das brigas, dos
ressentimentos).
O
anseio, a sede pela vida eterna é principalmente a vontade de eternizar a
fruição dos prazeres da vida terrena, sejam quais forem (intelectuais, sensoriais,
emocionais, etc.).
Não
se pensa, por exemplo, como esta situação aparentemente prazerosa - pelo menos
sob a perspectiva daqui do "mundo terreno" - será por toda a
eternidade.
Não
é por outra razão que existem relatos, histórias e anedotas de quanto seria
tedioso o Paraíso. Por isso, muitas religiões, como o hinduísmo e o budismo
(principalmente em suas versões populares) e correntes de pensamento religioso,
como os espíritas kardecistas, fazem da vida além-túmulo uma atividade agitada
e variada, com toda sorte de peripécias. Encarnações diversas (passagens por
muitas vidas), inclusive no reino animal e no reino das divindades (no caso das
religiões orientais), encontro com seres de outros planetas, etc.
Enquanto
isso, as religiões monoteístas (qual seria a relação entre um forte monoteísmo
e a falta da metempsicose?) não têm muitas imagens e ideias sobre o além. Os
relatos sobre o mundo post mortem são
raros e as poucas histórias existentes são baseadas em alegorias e lendas
tecidas sobre a vida de santos e pessoas admiradas como extraordinárias
Concluindo,
temos que a "vontade de viver eternamente", dada por muitos como
fundamento de que tal vida eterna deve existir, não é nada mais que uma vontade
de fruir prazer por um longo tempo - já que não sabemos o que é eternidade.
Somos o resultado desta constante interação entre nossa constituição genética, nossa herança cultural e nossa capacidade (inata, mas nem sempre consciente) de fazer interagir estas heranças.
Então, admitindo de que existe qualquer tipo de sobrevivência depois da morte, o que de nós vai para o "além"?
(Imagens: Cenas da Divina Comédia - gravuras de Gustave Doré)
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