Amazônia queima

sábado, 7 de setembro de 2019
"Tecnologia é a resposta, mas qual era a questão?"   -   Cedric Price


A floresta amazônica é uma das poucas regiões ainda parcialmente intocadas pela moderna civilização. Junto com áreas remanescentes da floresta tropical da Indonésia e da África Central, é um dos hotspots que concentra ecossistemas e biodiversidade, grande parte endêmica. Hoje, através de pesquisas, sabemos que a floresta já teve uma ocupação no passado, antes da chegada dos europeus, quando povos indígenas estabeleceram aldeias e áreas de plantio em partes da região. O bioma, portanto, já é objeto de interferência do homem há milhares de anos. Estas ocupações, no entanto, nunca chegaram a atingir a extensão e a voracidade atual.

Desde sempre ocorreram derrubadas e queimadas das matas brasileiras. A prática, chamada de coivara, o colonizador aprendeu dos indígenas. Derrubava-se a vegetação, colocava-se fogo nas roçadas e a cinza ajudava a adubar o solo para algumas colheitas. Na Amazônia o processo se acentuou a partir da década de 1970, quando governos militares da época decidiram ocupar a região, temendo possíveis invasões estrangeiras. Nesse processo houve deslocamento de populações do Nordeste e do Sul do país para esta região, visando ocupar a área e desenvolver atividades agrícolas e pecuárias. Meio século depois, os dados indicam que aproximadamente 20% do área da floresta amazônica foi desmatada; cerca de 1 milhão de quilômetros quadrados.

Nas últimas semanas de agosto de 2019 cresceram as queimadas na floresta amazônica, segundo diversas fontes: a Agência Espacial Americana (NASA), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e observadores de diversas organizações governamentais (ONGs). Os focos de incêndio aumentaram significativamente em 2019, em comparação com 2018 e outros anos. O fato despertou protestos de ONGs locais e internacionais e provocou manifestações de diversos países europeus, notadamente a França, Noruega e Alemanha. Os dois últimos países são provedores de um fundo, o Fundo da Amazônia, criado para implantar ações de preservação da floresta. Com a França, o governo Bolsonaro teve atrito diplomático, o que chegou a arranhar a imagem internacional do País.

Durante os acontecimentos, as redes sociais brasileiras foram inundadas por fake news, com os mais diversos conteúdos, aproveitando-se do pouco conhecimento que parte da população brasileira tem sobre o assunto. Culparam-se as ONGs, que estariam a soldo de interesses estrangeiros colocando fogo na mata; acusaram o agronegócio, os povos indígenas, e muito mais. O governo chegou a colocar em dúvida os dados sobre os índices de desmatamento apresentados pelo INPE e por outras instituições de renome. O mais provável é que a queima da floresta, que está bastante seca neste período do ano, tenha sido causada por grileiros e outros grupos – fala-se nas milícias – com interesse em ocupar terras federais e parte de reservas indígenas, através destas práticas criminosas.

O governo interviu ainda a tempo e espera-se que o fogo e a confusão sejam debelados ao longo das próximas semanas. Há muita coisa em jogo nesta situação. Grupos de interesse podem tirar vantagens do setor agrícola, pecuário, madeireiro, da indústria alimentícia, entre outros. É preciso gerir a floresta fortalecendo órgãos, instituições, agentes econômicos e populações, que efetivamente contribuem na conservação, ocupação e uso sustentável do bioma.

(Imagens: Fillipo de Pisis)

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