"O fato é que a prova físico-teológica sofreu muito com o progresso das ciências: o que há de ordem e de aparente finalidade (o movimento dos planetas, a teleonomia dos seres vivos) se explica cada vez melhor; o que há de desordem e de acaso é cada vez mais constatável." - André Comte-Sponville - O Espírito do ateísmo
O
consumo de massa é de origem recente no Brasil, tendo surgido no final da
década de 1960 e início dos anos 1970. Mesmo assim, este consumo sempre foi
bastante restrito por diversos aspectos. O país começou sua industrialização na
segunda metade dos anos 1950 e até os anos 1970 nossa indústria de bens de
consumo era pouco desenvolvida. Não tinha capacidade de produzir artigos mais
sofisticados, voltados para uma restrita faixa de consumidores com maior poder
aquisitivo e acostumados a comprarem produtos estrangeiros.
Outro
aspecto é que não havia uma massa crítica de consumidores que permitisse variada
produção de bens de consumo, como acontecia na mesma época nos Estados Unidos e
na Europa. Nesse período a classe média brasileira era reduzida e estava
lentamente se ampliando. Os novos empregos criados na indústria e no setor de
serviços estavam aumentando a renda média de milhões de pessoas, permitindo que
gradualmente melhorassem seu padrão de consumo.
Portanto,
os produtos de consumo de massa eram relativamente simples, dada a baixa
sofisticação de nossa indústria. Bens de consumo mais elaborados eram
importados. Mas, devido à política de proteção à indústria nacional, implantada
pelos governos militares da época, as alíquotas de importação de tais produtos
eram muito altas, havendo muitos casos em que a importação destes produtos era
proibida. Consumir produtos da moda, aqueles anunciados em revistas
estrangeiras, somente era algo possível à classe média alta ou para os ricos. Estes
segmentos sociais da população eram praticamente os únicos que tinham
oportunidade de adquirir estes bens, geralmente durante viagens ao exterior.
A
abertura da economia brasileira ocorreu lentamente, a partir do final da década
de 1980. Sucessivos governos passaram a reduzir ou eliminar barreiras
alfandegárias e abriram o mercado para produtos importados. Mudanças na
política industrial permitiram a entrada de novos concorrentes do exterior, alterando
lentamente a estrutura de um setor bastante oligopolizado. No início dos anos
1990 começam os processos de privatização de empresas estatais e cai o
monopólio público em diversos serviços, através da Lei das Concessões.
Em
1990 também foram criados dois importantes instrumentos de defesa do
consumidor: o Código de Defesa do Consumidor e os Procons (Programa de Proteção
e Defesa do Consumidor), destinados a mediar conflitos entre os consumidores e
fornecedores de produtos e serviços. Na mesma época o governo federal cria as
agências reguladoras, com o objetivo de regular e fiscalizar determinados
setores da economia, como o de telecomunicações, produção e comercialização de
petróleo, recursos hídricos, mercado de fármacos, os planos de seguro e saúde
suplementar e a aviação civil, entre outros.
Nos
últimos trinta anos o mercado brasileiro de produtos e serviços evoluiu em
todas as áreas. O desenvolvimento de nosso mercado de consumo é quase
comparável aos dos países industrializados. O setor de serviços também avançou,
comparado à situação de trinta ou quarenta anos passados.
Mesmo
assim, todavia, temos vários problemas que afetam o consumidor. Qualidade de
produtos e serviços ainda deixam muito a desejar. Os serviços de proteção ao
consumidor ainda são lentos e burocráticos. A mão de obra do setor de serviços
precisa de capacitação e treinamento. E, acima de tudo, o consumidor precisa
ser tratado com mais respeito pelos fornecedores, no que se refere ao
cumprimento de contratos.
Apesar
da relativa rápida evolução do mercado de produtos de consumo e serviços no
Brasil, ainda há um longo caminho até que possamos atingir o padrão ideal de um
mercado regido pela ética nas relações entre fornecedores e consumidores.
(Imagens: pinturas de Eduardo Paolozzi)
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