“Morin (2011), ao criticar a modernidade, afirma que nossa era está alicerçada,
fundamentalmente, sobre a supremacia da razão e a crença no progresso do
conhecimento. Porém, estas crenças, descritas nas obras de Morin e que
começaram a ganhar corpo no início da modernidade, só foram possíveis graças ao
renascimento de uma concepção de filosofia, arte e cosmogonia que remonta ao
iluminismo grego e, tal como ele, mitifica a razão. O renascimento cultural
europeu, alicerçado no iluminismo grego, colocou em evidencia a antiguidade
clássica, cujo cerne da reflexão filosófica é a tese da autonomia da razão como
precondição para o conhecimento avançar rumo ao desconhecido. ‘Afinal: cada
civilização representa uma resposta às interrogações que o universo suscita;
mas o mistério permanece intacto; outras civilizações, com outras curiosidades,
se aventurarão nele, igualmente em vão, pois cada uma delas é apenas um sistema
de equívocos.’ (Cioran, 2011a, p.149)
Nesse
aforismo, Cioran expressa, mais uma vez, seu ceticismo em relação a busca por
explicações sobre o cosmo, a história e a vida, que tornou-se uma rotina na
história da humanidade. Por isso, ele afirma que a valorização de explicações
racionais sobre o cosmo e a vida, que marcou o iluminismo grego, criticando e
demolindo as explicações mitológicas presentes nas obras de Hesíodo e Homero,
conferiu ao homem uma importância duvidosa. Em decorrência disto, ‘Maldito ou
não, o homem experimenta uma necessidade absoluta de estar no centro de tudo’ (Cioran, 2010, p.33) . Posição que teria criado uma concepção
antropocêntrica de mundo e é esta concepção que fora duramente criticada por
Cioran. Afinal, há algo mais antropocêntrico do que apresentar-se como
protagonista da história e da própria vida?
Mas
se as releituras dos filósofos gregos possibilitaram um novo olhar sobre a arte,
o homem, o conhecimento, enfim, sobre todo o cosmo, elas ofereceram a
possibilidade de nos armarmos com a dúvida e a desconfiança em relação aos
mitos e novos simulacros de deuses. O termo simulacro de deuses é utilizado por
Cioran para se referir às crenças e novas idolatrias que nasceram no mundo
moderno e se perpetuaram com novas máscaras. Por isso, Cioran, no início da sua
obra Breviário de Decomposição, é
enfático ao dizer que mesmo afastando-se da religião, os homens permanecem
fiéis a ela.
E,
tal como os filósofos gregos que desconfiaram das explicações mitológicas e
depois ergueram novos deuses, os filósofos modernos acabaram seguindo o mesmo
caminho e depois amargaram as mesmas decepções, segundo Cioran. Sendo assim, a
crítica aos mitos não se define apenas por uma atitude filosófica, mas deve ser
compreendida como um modo de viver e perceber o cosmo.” (Petean, págs. 13 e 14)
Antonio Carlos Lopes Petean, Fanatismo, dúvida e suicídio em Cioran
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