Há poucos dias participei de um debate bastante interessante, no qual foi colocada a seguinte pergunta aos participantes: a questão da preservação do meio ambiente é assunto racional ou moral? Vou aqui evitar entrar em detalhes a respeito do debate, para não cansar o leitor. Depois de quase duas horas de discussão, com vários argumentos, alguns momentos de discussões mais acaloradas, o grupo debatedor chegou a duas conclusões principais, que tentarei desenvolver um pouco neste artigo.
A primeira conclusão – e a principal – é que a questão da preservação dos recursos naturais é primordialmente um tema moral, um assunto que se refere à conduta ética do ser humano. Preservar a biosfera para as gerações futuras não se baseia em nenhum pressuposto racional. Não há nenhum argumento baseado na racionalidade, que nos force a deixar um mundo ambientalmente conservado para nossos descendentes.
No entanto, podemos alegar motivos racionais se falarmos, por exemplo, em problemas imediatos, como o do lixo, do esgoto ou da poluição atmosférica. Sem dúvida, é principalmente por motivos racionais que organizamos a coleta do lixo, construímos estações de tratamento de esgoto e criamos programas de controle de emissões veiculares. Aprendemos com a experiência e podemos inferir as conseqüências, que a ausência de tais serviços traria para a saúde pública e o próprio funcionamento de nossa sociedade. Os custos médico-hospitalares e as horas paradas, causados pela epidemia de cólera, de tifo ou pelas doenças pulmonares, seriam imensos e onerariam toda a sociedade, sejam empresas ou contribuintes. Esta é uma análise racional do problema.
Todavia, quando consideramos o sofrimento que estas enfermidades causariam às pessoas, temos um problema moral. A velha máxima, encontrada nas mais diversas tradições religiosas, “faça aos outros como gostaria que te fizessem”, ainda é válida e se aplica a toda a questão ambiental. Pois, como podemos ignorar o sofrimento que uma falha na organização da sociedade causa a nosso semelhante, que tem os mesmos direitos que nós à saúde? Então não custa lembrar que exatamente neste momento estão morrendo crianças em todo o Brasil – cerca de cem vidas ao dia – por falta de saneamento. A culpa por estas mortes recai sobre toda a sociedade; mas principalmente sobre aqueles que se propuseram – e por isto foram eleitos – a resolver também estes problemas. Assim, nesta análise, tem peso o aspecto moral da questão ambiental.
A segunda conclusão a que chegamos nesta discussão é conseqüência da primeira. Ela diz respeito ao fato de que apesar da preservação do ambiente natural ser um problema moral, ela não pode prescindir da abordagem racional, baseada nos conhecimentos da ciência. Não basta nos sentirmos compelidos a proteger os recursos naturais para as gerações futuras; temos que colocar tal imperativo em prática, através do uso de conhecimentos e recursos para a resolução do problema. Caso contrário aplica-se o ditado: “de boas intenções o inferno está cheio”.
Concluímos assim que a decisão de preservar os recursos naturais é uma questão moral. A dita “vontade política” é um outro nome para uma decisão moral – pode-se tomá-la ou não. Para colocá-la em prática, no entanto, não podemos prescindir do uso da razão, ou seja, da tecnologia e dos recursos financeiros.
(imagens: Guido Reni)
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