Depois de chegar a ser o sexto maior Produto Interno Bruto (PIB) do mundo em 2012 - atrás apenas dos Estados Unidos, China, Japão, Alemanha e França -, sonhando com a possibilidade de desbancar os franceses e chegar ao quinto lugar, a crise econômica derrubou a economia brasileira. Escorregamos e rapidamente caímos para a nona posição em 2015, quando as atividades econômicas do Brasil tiveram uma retração de 3,8% em relação a 2014. Em 2016, quando o PIB brasileiro alcançou R$ 6,266 trilhões, o Fundo Monetário Internacional (FMI) previa que em 2017 voltaríamos ao oitavo posto, ultrapassando a Itália. No entanto, dada a pífia recuperação de nossa economia prevista para esse ano, parece que só voltaremos a galgar posições mais altas no futuro.
Por ordem de PIB per capita o Brasil ocupa a posição 65,
abaixo da Argentina (posição 53) e do Chile (59). Devido à paralisação da
economia, nosso PIB per capita caiu
0,4% em 2014, 4,6% em 2015 e 4,4 em 2016. De acordo com as estatísticas,
ficamos cerca de 10% mais pobres em três anos, apesar da crise não ter afetado
a todos igualmente - muitos até estão lucrando com ela.
Os gastos do Estado
brasileiro correspondem a 40% do PIB, o que em 2016 correspondeu a mais de R$
2,5 trilhões. O custo da máquina estatal só vem crescendo ao longo das últimas
décadas. Desde a criação do Plano Real, em 1993, quando a carga tributária já
chegava a quase 26%, os impostos aumentaram em mais de 13%, alcançando quase
40% do PIB em 2015. No entanto, o retorno sobre os impostos pagos é o pior do
mundo. Nos últimos anos, o Brasil tem mantido seu lugar como a nação que
oferece o pior e mais baixo retorno à sua população, sobres os impostos pagos. Os
dados abaixo, referem-se ao ano de 2013 e foram publicados pela revista EXAME
em 1/6/2015:
Índice de retorno ao bem estar da sociedade
POSIÇÃO PAÍS CARGA TRIBUTOS SOBRE
PIB ÍNDICE
1º Austráilia 27,30% 162,91
2º Coréia do
Sul 24,30% 162,79
3º Estados
Unidos 26,40% 162,33
4º Suíça 27,10% 161,78
5º Irlanda
28,30% 158,87
6º Japão 29,5% 156,73
7º Canadá 30,60% 156,48
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27º Hungria 38,90% 139,80
28º Dinamarca 45,20% 139,52
29º Finlândia 44.00% 139,12
30º Brasil 38,90% 137,94
Pode-se concluir que a recessão que afeta a economia brasileira desde 2014, tenha piorado ainda mais estes números, mantendo o Brasil na sua imbatível posição de pior colocado.
Além de significativa
parte da riqueza do país ser encampada pelo Estado, a cobrança dos impostos
também é feita de maneira prejudicial à maior parte da população. Grande parte
dos tributos incide sobre o consumo (veja o percentual de imposto nas suas
compras de supermercado) e menos ou quase nada sobre a renda e sobre bens -
principalmente na taxação de grande fortunas. Enquanto que nos Estados Unidos e
na Alemanha os impostos sobre a renda são mais altos do que por aqui - com mais
retorno para o cidadão, evidentemente - a taxação de grandes fortunas (a partir
de R$ 2 milhões nos padrões brasileiros) pode chegar a 40%, ao passo que no
Brasil alcança a alíquota máxima de 5%, para fortunas a partir de R$ 50
milhões. A Constituição federal de 1988 prevê a taxação de grandes fortunas mas
a lei complementar para sua regulamentação ainda não foi criada.
Qual será a
razão humanitária para poupar nossos afortunados? Nos Estados Unidos grandes
milionários, além de pagarem altos impostos, fazem doações para instituições de
caridade, hospitais, institutos de pesquisa, museus, universidades e incentivam
as start-ups. Por aqui, nosso milionários, com raras exceções, são sovinas, não
se interessam pela cultura ou pesquisa, e quando muito fazem uma
"doaçãozinha" para alguma instituições de caridade - se possível sob
os holofotes da mídia.
Desde o Plano
Real (1993), com a eliminação da inflação, as condições de vida melhoraram para
grande parte da população mais pobre. Nos dois governos Lula, o poder de compra
das classes mais baixas aumentou mais ainda. A expansão econômica através da
ampliação do consumo, fez com que aumentassem consideravelmente os postos de
trabalho e subisse o valor médio dos salários nas faixas mais baixas até três
salários mínimos. Em um curto espaço de tempo de menos de dez anos, a economia
incorporou cerca de 30 milhões de novos consumidores. No entanto, a inserção
destes novos trabalhadores e consumidores na economia estava acontecendo sob
bases bastante frágeis. Instituições internacionais, já em 2013, alertavam para
uma queda do nível de atividade econômica e a consequente volta destas
populações aos níveis mais baixos de pobreza. Em março de 2017 o jornal O Globo
publicou os seguintes números, sobre os países com maior diferença de renda no
mundo:
Os países mais desiguais do mundo
Ranking do Índice de Gini, indicador de
disparidade de renda. Quanto maior, mais desigual.
África
do Sul 0,634
Namíbia 0,610
Haiti 0,608
Botsuana 0,605
Rep.
Centro-Africana 0,562
Zâmbia 0,556
Lesoto 0,542
Colômbia 0,535
Paraguai 0,517
Brasil 0,515
Suazilândia 0,515
Guiné-Bissau 0,507
Panamá 0,507
Honduras 0,506
Chile 0,505
Ruanda 0,504
Congo 0,489
Guatemala 0,487
Costa
Rica 0,485
Quênia 0.485
Em um artigo
publicado na imprensa em 2013, escrevíamos:
" Em publicação recente, o Banco Mundial (Bird)
informa que o número de miseráveis, classificados pela instituição como sendo
pessoas que vivem com uma renda equivalente a R$2,50 por dia, diminuiu de 43%
da população mundial em 1990 para 21% em 2010. Esta redução no percentual de
pobres em todo o globo estava prevista para acontecer somente a partir de 2015.
O fato é auspicioso, já que apesar da crise econômica mundial desde 2008, a miséria pôde ser
reduzida em muitas regiões.
O
que também contribuiu para a diminuição global da pobreza extrema foi o
crescimento da economia de grande parte dos países em desenvolvimento,
notadamente na Ásia onde milhões de chineses, indianos, vietnamitas, cambojanos
e outros, foram galgados para uma melhor condição econômica, com a criação de novas oportunidades de
trabalho. O mesmo aconteceu no Brasil, México, Peru, Colômbia; países onde a
criação de renda e programas sociais resgataram milhões de cidadãos de uma situação de
penúria extrema.
Grande
parte dessas pessoas, segundo o Banco Mundial, ainda se encontra em situação
economicamente vulnerável, ou seja, sujeita a voltar à situação de miserável
caso a economia de seus países seja afetada por nova crise. Diz o banco que a
linha da pobreza moderada situa-se numa renda de R$ 8,00 (ou equivalente em
outras moedas) por dia. Quem ganha entre R$ 8,00 e R$ 20,00 é considerado
"vulnerável". No Brasil, no entanto, é considerado “classe média”
aquele que recebe entre R$ 12,00 e R$ 40,00 por dia – o que significa que uma
parte da classe média brasileira ainda está na faixa dos vulneráveis, podendo
voltar à condição de miserabilidade caso a economia pare de crescer.
Mas
não é somente a melhoria da renda que tira o cidadão da situação de miséria. É
preciso que o Estado garanta uma estrutura de apoio social, formada por
serviços de saúde, saneamento, educação, habitação, segurança e transporte,
assegurando que estas pessoas consigam manter-se permanentemente acima da linha
de pobreza. Os
países em desenvolvimento precisam fazer grandes investimentos em
infraestrutura e serviços básicos, possibilitando que seus cidadãos possam
manter-se em aceitável situação econômica e social, proporcionando assim uma
vida melhor aos seus filhos, dando início a um ciclo virtuoso.
Nesse
ponto o Brasil vem patinando há anos. Apesar do efeito positivo dos programas
de distribuição de renda, grandes contingentes da população correm o risco de
voltar à miséria. Falta de planejamento, incapacidade de coordenar projetos,
afora os casos de malversação de recursos públicos, impediu que o Estado
realizasse maior número de obras de infraestrutura. Estradas e portos
congestionados; hospitais, escolas e órgãos públicos desaparelhados; a
segurança do cidadão sob ameaça constante. Enfim, o governo errou na previsão:
achou que só o consumo levaria o país
adiante e quem perdeu foi o povo."
Ainda com
relação ao Estado é preciso falar de sua máquina burocrática. Em todos os
países desenvolvidos criou-se já há muitas décadas uma estrutura de
profissionais capacitados, cuja função é administrar a máquina do Estado, nos três
Poderes e em todos os níveis; federal, estadual e municipal. Muitos governos
criaram há mais de um séculos escolas especializadas, para capacitação de
futuros servidores públicos. No Brasil esta prática é relativamente recente e
ainda falta um real incentivo para que os profissionais efetivamente frequentem
escolas (como a Escola Nacional de Administração Pública e as Escolas de
Governo) e cursos relacionados com a administração pública.
É fato que a falta
de preparo dos profissionais, desde o nível mais baixo ao mais elevado, a
ingerência política depois de cada eleição, a desorganização das carreiras
profissionais e a baixa remuneração, principalmente nos níveis profissionais
mais baixos, são fatores que limitam a qualidade do serviço público. Mesmo
assim é necessário enfatizar que ao longo dos últimos quinze anos, a carreira
pública tem atraído cada vez mais candidatos. Estabilidade no emprego,
independentemente da qualidade da atuação; salários acima da média mais
gratificações, benefícios e adicionais; jornada de trabalho geralmente menor e
não vinculada a resultados; e aposentadoria integral, muitas vezes com as
mesmas vantagens do pessoal que está na ativa.
Todos estes fatores contribuem
para que a máquina pública se torne lenta, desorganizada e algumas vezes sujeita
a corrupção, proporcionando um atendimento sofrível, se não ruim, na maioria
dos casos. Mesmo assim - ou até por isso - o número de funcionários públicos municipais,
por exemplo, aumentou em 66,7% entre 2001, quando o país tinha 3,9 milhões de
servidores municipais, e 2014, quando este número subiu para 6,5 milhões.
Assim, podemos
resumidamente enumerar alguns fatores que acabaram conduzindo o país a esse
beco sem saída no qual se meteu:
- Políticas de
gestão econômica e fiscal desencontradas, que fizeram com que a economia
entrasse em um profundo processo recessivo;
- Manutenção de
um Estado grande, lento, mal preparado e por vezes corrupto (basta ver o caso
do estado do Rio de Janeiro), que passou a demandar cada vez mais recursos (que
nem sempre eram bem investidos);
- Economia
pouco dinâmica, com forte ingerência do Estado e beneficiamento de empresas com
boas relações com o poder;
- Agências
reguladoras que ao invés de zelarem por relações comerciais equânimes entre
fornecedores e consumidores, nem sempre cumpriram este papel;
- Aversão a uma maior participação da iniciativa
privada em atividades antes reservadas ao Estado (e que não soube e não pôde
cumprir), como construção e operação de obras de infraestrutura de transporte,
saneamento, geração de energia, etc.
A mentalidade,
ainda muito forte em certos setores da sociedade brasileira, de que o Estado
deva ser o provedor e o gestor de grande parte dos serviços públicos tem contribuído
para levar o país à atual situação. A história da administração diz que os
governos são maus gestores de recursos e que devem se limitar às suas funções
básicas (neste caso o poder Executivo) de prover educação, saúde, segurança e aplicação das leis; além de gerir a máquina
púbica que por sua vez atuará como fiscalizadora das demais atividades a cargo
do setor privado.
Há uma série de
outros aspectos que são parte do problema que descrevemos acima e que precisam
definitivamente receber um encaminhamento, como:
- O aumento da
pobreza no país. Depois da momentânea euforia dos anos 2005-2013, a economia
voltou a demitir (hoje mais de 14 milhões de desempregados oficiais, mas estimamos cerca de 18 milhões) e o padrão de vida
de grande parte da população só vem caindo;
- O problema da
criminalidade, resultado da ação do crime organizado, que estabeleceu sua influência em
todos os níveis - executivo, legislativo e judiciário;
- A falta de confiança
nas instituições em geral, fator que vem se agravando há décadas. São cada vez
menos instituições que têm alguma (mínima) credibilidade perante a opinião pública;
- A falência
dos valores e dos ideais da modernidade. Civilidade, cidadania, tolerância,
laicismo e cultura estão desaparecendo; substituídos por discursos de
intolerância, autoritarismo, fundamentalismo religioso e político, obscurantismo
e mentalidade anticultural.
Talvez tenhamos
chegado ao ponto em que "o barco pode afundar com todos dentro";
elites econômicas e políticas, grupos privilegiados, corruptos e corruptores
contumazes, "novos ricos", classe média tradicional e "nova
classe média", trabalhadores, pequenos empresários e desempregados, pobres e miseráveis... E
isso pode ocorrer em não muito tempo. O processo de entropia econômica, social
e cultural está avançando, basta acompanhar a mídia (não só a oficial chapa
branca), ou percorrer as cidades e as ruas do país, observando e conversando
com as pessoas.
Se a mudança
não começar, até quando poderemos manter a estabilidade política e social da nação?
(Imagens: Georgina de Albuquerque)
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