"Na verdade, uma teoria filosófica é uma questão desenvolvida e nada mais que isso: por ela mesma, nela mesma, ela consiste não em resolver um problema, mas em desenvolver até o fim as implicações necessárias de uma questão formulada." - Gilles Deleuze - Empirismo e subjetividade
Apesar
da queda do consumo com a crise econômica, o Brasil ainda é o décimo maior
consumidor de energia em todo o mundo e o maior na América do Sul. As
principais fontes energéticas do país são o óleo e outros combustíveis (39%
incluindo o etanol); as hidrelétricas (29%); e outras fontes renováveis (21%
principalmente biomassa). A energia elétrica, de acordo com o Ministério das
Minas e Energia (MME), tem as seguintes fontes: as hidrelétricas (70,6%); as
termelétricas (18,3%); a biomassa (7,6%); os reatores nucleares (2,4%); e os
geradores eólicos (1%) (EPE, 2013).
Em fevereiro
de 2016 o Brasil tinha uma potência instalada de 141.699.960 kW, gerada por
4.461 unidades produtoras (ANEEL, 2016). Os principais consumidores dessa
eletricidade foram a indústria (46,4%); o setor residencial (22,1%); o comércio
(15%); o setor público (7,6%); o agropecuário (4,3%); e outros serviços de
infraestrutura (4,6%).
Até
o final dos anos 1990 o Brasil sempre teve um superávit na geração de
eletricidade. No entanto, nos últimos quinze anos, a expansão da economia e o
rápido crescimento do consumo fizeram com que fosse constante a ameaça de falta
de eletricidade, o chamado “apagão”. Tal situação ainda foi mais acentuada com
as estiagens que afetaram o país nos biênios 2000/2001 e 2014/2015, provocando
a queda dos níveis de água dos reservatórios das hidrelétricas para volumes
mínimos.
Esses
fatores fizeram com que os governos deste período aumentassem investimentos em
termelétricas a gás e carvão e incentivassem o desenvolvimento dos mercados de
energia renovável. Como resultado deste esforço, o país aumentou sua capacidade
instalada de energia eólica de alguns poucos quilowatts em 2002, para 8,98 GW
em 2015 (Abeeolica, 2016). O setor de energia solar fotovoltaica também passa
por rápido desenvolvimento, principalmente depois criação do Programa de
Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica (ProGD), em dezembro
de 2015 pelo MME. Segundo publicação do setor, em 2016 o mercado de energia
fotovoltaica deverá crescer 300% (Portal Solar, 2016).
Com
relação à economia de energia, pouco tem sido realizado. Do total de energia
elétrica produzido no país, cerca de 10% são perdidos durante a transmissão e
distribuição da energia. Dados da Associação Brasileira das Empresas de Conservação
de Energia Elétrica (ABESCO) dão conta que o Brasil desperdiça o equivalente a
uma usina Belo Monte por ano (4.600 MW médios). Este volume, segundo a
associação, seria suficiente para abastecer 40% do consumo residencial do país.
Em 2007 a Eletrobrás (empresa de energia do governo federal) e a Confederação
Nacional da Indústria (CNI) realizaram um levantamento para detectar o
potencial de redução de energia no setor industrial. Naquele ano este potencial
já era de 25,7%; 82% dos quais em redução do uso de combustíveis e adaptação de
fornalhas e caldeiras.
Em
2014 o Conselho Americano para uma Economia de Energia Eficiente (American
Council for an Energy-Efficient Economy – ACEEE) fez uma pesquisa sobre
práticas de uso de energia entre as 16 mais importantes economias do mundo.
Para avaliar como os países se utilizam do insumo, foram criados 31
indicadores, distribuídos em quatro áreas-chave: indústria, transportes,
edificações e esforços nacionais. Num total de 100 pontos possíveis, o Brasil
atingiu 30 pontos. No quesito “esforços nacionais”, o país fez quatro pontos de
25 possíveis (foram avaliadas legislação e políticas nacionais); no quesito “eficiência
energética nas indústrias” alcançou dois de 25 pontos possíveis; em
“edificações” alcançou 10 de 25 pontos; e em “transporte” fez 14 de 25.
(Revista Exame julho 2014). Como resultado da pesquisa o Brasil ficou em
penúltimo lugar, acima apenas do México. O primeiro lugar ficou com a Alemanha.
O
Brasil possui alguns programas relacionados com a eficiência energética; todos,
porém, de ação limitada:
- O
mais antigo é o PROCEL – Programa Nacional de Conservação de Energia, criado em
1985. O objetivo principal do programa é incentivar a produção de produtos
energeticamente mais eficientes. Até o final de 2015 o programa incluía 32
categorias de produtos (eletroeletrônicos, eletrodomésticos, ferramentas,
automóveis, máquinas, etc.), totalizando 3.784 produtos e reunindo 209
companhias (a maior parte delas de grande porte). O PROCEL continua
gradualmente se expandindo e ganhando novos associados voluntários. Seu
crescimento, porém, é quase vegetativo, já que o país ainda não dispõe de uma
legislação e normas técnicas referentes à melhoria da eficiência energética de
produtos.
- Outra
iniciativa é o Programa Nacional da Racionalização do Uso de Derivados de
Petróleo e do Gás Natural – CONPET, criado em 1991. O programa visa promover o
uso racional dos derivados de petróleo e do gás natural. Para isso,
determinados produtos, como fogões, fornos domésticos e aquecedores a gás podem
obter a etiqueta de padronização da instituição. Além disso, o programa também
atua no setor de transportes, através de treinamento e verificação/certificação
(voluntárias) de veículos de transporte.
- A
Lei da Eficiência Energética de 2001, estabelece padrões de consumo para
diversos produtos e máquinas, como motores elétricos trifásicos, lâmpadas,
fogões e fornos a gás, condicionadores de ar, aquecedores a gás e reatores
eletromagnéticos. Os padrões de consumo de energia são estabelecidos por uma
comissão formada por especialistas de diversos ministérios.
- O PROCEL
Edifica e PBE Edifica, criados respectivamente em 2003 e 2004, tem como objetivo
implantar medidas de conservação de energia em construções (PROCEL Edifica) e
certificá-las, conferindo-lhes um selo de conformidade (PBE Edifica). A adoção
dos padrões PROCEL Edifica e a certificação pelo PBE Edifica são voluntários,
tanto nas novas construções, quanto no retrofit. Em 2014 o governo federal
publicou decreto que torna obrigatória a Etiqueta Nacional de Conservação de
Energia (ENCE) em reformas e novas construções de prédios públicos, com área de
construção acima de 500 m². Atualmente existem cerca de 50 prédios públicos que
possuem esta etiqueta.
- Em
outubro de 2011 foi lançado o Plano Nacional de Eficiência Energética (PNEf),
que ainda está em fase de implantação e conta com o apoio de instituições
internacionais como a alemã GIZ. Em um de seus pontos o plano prevê uma redução
do consumo de 10% até 2030, o equivalente a 106 TWh, evitando a emissão de 30
milhões de toneladas de CO²e. Outro aspecto do PNEf é aumentar os investimentos
em smart grid. No momento já foram implantados projetos-piloto espalhados pelo
Brasil, com a colaboração de distribuidoras regionais de energia (Copel,
Eletropaulo, Light, CEMIG, Bandeirante, Coelce e Eletrobrás). Dentro deste
mesmo plano, o MME prevê a troca de todos os medidores domésticos no país até 2021,
para mais facilmente inserir o consumidor doméstico nos projetos de smart grid.
Grande
parte das iniciativas na área da eficiência energética, com exceção do programa
PROCEL, ainda está em fase de desenvolvimento. Mesmo assim, de acordo com
International Partnership for Energy Efficiency Cooperation (IPEEC), entre 2008
e 2011 a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) registrou 914 projetos de
eficiência energética, gerando uma economia de cerca de 2,06 milhões de MWh por
ano. Os investimentos, que totalizaram US$1,3 bilhão, incluíram projetos nas
áreas de: melhoria de iluminação; programas educacionais; melhorias em estações
de tratamento de água; eficiência energética em construções, entre outros.
No
mercado brasileiro de eficiência energética não existem incentivos, tais como
isenção de impostos para equipamentos. No entanto, existem linhas de
financiamento de bancos privados e do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) para equipamentos e serviços, com taxas de juros
abaixo das oferecidas pelo mercado. Para obter estes recursos a empresa precisa
estar estabelecida no Brasil.
Segundo
o IPEEC (International Partnership for Energy Efficiency Cooperation) os
maiores impedimentos para o desenvolvimento mais rápido deste mercado no Brasil,
são:
-
Empresas não dedicam atenção ao tema;
-
Payback time é muito longo;
-
Não existe suficiente financiamento;
-
Incerteza quanto às efetivas economias geradas pelo projeto;
-
Falta de conhecimento para identificar as oportunidades de economia de energia;
Para
alguns especialistas do setor, no entanto, os projetos de eficiência energética
devem ser baseados em soluções de mercado, sem mecanismos como incentivos,
isenções e fomentos, que poderiam distorcer o funcionamento deste mercado. O
melhor exemplo de um setor que se desenvolveu rapidamente apenas com mecanismos
de mercado é o da energia eólica.
(Imagens: pinturas de Mikhail Larionov)
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