O Brasil é um dos países da América Latina com o menor índice de tratamento de esgoto. Cerca de 55% dos efluentes domésticos são coletados, dos quais efetivamente 40% são tratados (dados de 2014). Os principais aspectos no baixo índice de coleta e tratamento de esgotos domésticos está relacionado aos seguintes principais fatores:
a) Aspectos históricos
O tratamento e a coleta de
esgotos não fazem parte da história do Brasil. Durante o processo de
colonização e até o início da industrialização, no final do século XIX, a maior
parte das cidades populosas situava-se à beira mar ou rio (Belém, São Luiz,
Recife, Salvador, Rio de Janeiro) e os esgotos eram descarregados diretamente
nas águas, sem tratamento (o que em parte ainda ocorre atualmente). Com a
industrialização e a movimentação de grandes contingentes populacionais para os
grandes centros urbanos, que surgiu a real necessidade de implantar sistemas de
tratamento de esgoto. As grande obras de saneamento só foram iniciadas durante
os anos 1970, quando o governo militar deu início a projetos de longa duração
(construção de rodovias, hidrelétricas e estações de tratamento de esgoto).
b) Aspectos
político-administrativos
A tradição política e a
administração pública no Brasil sempre teve objetivos imediatos; projetos de
alto impacto e de curta duração, que pudessem ser implantados
durante uma administração (quatro anos) municipal ou estadual. Projetos de
longo prazo eram raros. Obras de saneamento
geralmente requerem prazos mais longos. Por isso, geralmente quando se falava
em saneamento, queria se dizer tratamento de água. É impossível abrir novos
bairros ou loteamentos sem disponibilidade de água. No entanto, para o esgoto
haviam as fossas céticas e a descarga dos efluentes em rios e no mar. Existe
também o aspecto de que obras de saneamento, principalmente o tratamento de esgoto,
têm custo elevado e não têm impacto político alto. Ficou famoso o bordão de
gerações de políticos brasileiros: "Obra enterrada não traz votos!".
A Lei da Concessões (1995)
permitiu que investidores privados pudessem atuar em serviços públicos (energia,
saneamento, transporte), através do investimentos em projetos e posterior
exploração dos serviços. A lei abriu uma série de oportunidades, mas aspectos
legais ainda impedem que o setor se desenvolva plenamente.
c) Aspectos
econômico-financeiros
Não haviam fontes constantes
de financiamento para a construção de grandes obras. Os grandes projetos de
saneamento nas regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo
Horizonte, Recife, Porto Alegre) tiveram início nos anos 1990, quando fundos
internacionais - como o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), o alemão
KfW (Kreditanstalt für Wiederaufbau) e o japonês JICA (Japan International
Cooperation Agency) - estiveram disponíveis para, junto com a contrapartida
nacional (fundos estaduais e federais), financiarem grandes obras de
saneamento.
À mesma época, o BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e a iniciativa privada -
através de projetos BOT (build, operate & transfer) e PPP (parceria
público-privada) - também passaram a investir em obras de saneamento. Cidades
como Americana, Ribeirão Preto e Jundiaí, transferiram seus serviços de
saneamento para o setor privado.
Não existem fatores que
impeçam o reuso de efluentes tratados no Brasil. Afora a legislação que
estabelece determinados padrões de qualidade da água a ser reutilizada -
equivalentes aos internacionais - não há impedimentos no reuso do líquido. O
que ocorre é que até o momento são poucas as iniciativas para a reutilização de
efluentes, principalmente em grande escala. Empresas privadas, dependendo de
sua área de atuação já reutilizam seus efluentes no processo produtivo. No
setor público o maior projeto nesta área no Brasil é o de reaproveitamento de
efluentes na região de Capuava, na grande São Paulo. O projeto é uma parceria
entre a SABESP (companhia estatal de saneamento do estado de São Paulo) e a
construtora Odebrecht, reciclando 395 milhões de litros de efluentes domésticos
por mês.
A reutilização de água para
outros fins ainda é ideia recente no Brasil, já que os custos da água eram
relativamente baixos. A indústria e a agricultura até há pouco nada pagavam
pelo uso da água de rios e lagos - a lei de pagamento do uso da água é de 1997 e
ainda está em fase de implantação pelos Comitês de Bacias Hidrográficas. As
estiagens de 2000/2001 e 2014/2015 aumentaram a conscientização em relação à
água e forçaram um maior número de empresas a implantarem medidas de reuso e
uso eficiente de água/efluentes.
De acordo com especialistas,
alguns fatores que influenciariam o desenvolvimento deste mercado, seriam:
- Não existem impedimento
legais/técnicos para reuso de efluentes, afora normas referentes aos padrões de
qualidade da água. O maior impedimento continua sendo a relativa facilidade de
se obter água limpa a custo razoável, em comparação ao custo da água de reuso;
- O mercado demanda tecnologias
que barateassem o custo de tratamento de água de reuso;
- Dependendo da destinação a
ser dada a água de reuso, existe a prevenção em relação à origem do líquido. Um
projeto recente da SABESP, utilizando água de reuso para consumo humano - cujo
equivalente existe na Califórnia, nos EUA - teve que sofrer alterações, dada a
resistência da população. Neste caso, uma campanha de divulgação e
esclarecimento pudesse trazer mudança de mentalidade na opinião pública. (Cabe
ressaltar que quase todos os rios e lagos cujas águas são usadas para
tratamento e posterior consumo humano recebem cargas de efluentes domésticos
sem tratamento - caso da represa Guarapiranga e do rio Piracicaba, por
exemplo);
- Financiamento de projetos
públicos e privados de reuso de água/efluentes, desde que tivessem relevância
para divulgar o conceito;
- Incentivos fiscais e
isenção de taxas para projetos.
(Imagens: pinturas de Peter Huntoon)
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