"A crise que a humanidade enfrenta, de acordo com Husserl, é de que nós tomamos este mundo vivo como evidente e sem pensar erigimos sobre ele os edifícios conceptuais da lógica, matemática e ciências." - Stephen Batchelor - Confessions of a buddhist atheist
O
polímero sintético produzido a partir de derivados de petróleo e conhecido
comumente como "plástico" teve seu uso popularizado depois da 2ª
Grande Guerra. As pesquisas aumentaram a oferta de diferentes tipos de
plástico, o que ampliou bastante seu campo de aplicação. Hoje seu uso se
estende aos mais diversos setores da economia - infraestrutura, indústria, lazer
e medicina, entre os principais. Dois dos setores da economia que mais se
desenvolveram graças à popularização do plástico foram a indústria alimentícia
e a de bens de consumo em geral.
Atualmente,
a economia mundial produz aproximadamente 8,3 bilhões de toneladas de plástico
de todos os tipos. Deste volume total, segundo estimativas, 9% são reciclados e
12% são incinerados - em grande parte para geração de energia. Os restantes 79%
acabam em aterros, lixões ou, no pior dos casos, diretamente no meio ambiente.
Os impactos do plástico ao meio ambiente são inúmeros, desde o entupimento de
bueiros e canalizações, poluição de rios e lagos, até a formação de criadouros
de mosquitos transmissores de doenças no ambiente urbano. Segundo um estudo
elaborado pela ONU e publicado em 2014, os prejuízos ambientais relacionados ao
plástico - as externalidades negativas, segundo os economistas - excedem os US$
75 bilhões, dos quais 30% são referentes às emissões de gases de efeito estufa
e à poluição durante a fase de produção.
No
entanto, é nos oceanos que o plástico exerce seu maior impacto ambiental. Em
2010, quando se realizou o até agora mais completo estudo sobre o assunto, já
se estimava que aproximadamente oito milhões de toneladas de plástico vão parar
nos oceanos anualmente. A maior parte deste volume de detritos não é jogada lá
diretamente, mas carregada através dos rios. 90% de todo este plástico, apontam
estudos, são jogados nos mares por dez rios: rio Yangtze (China); rio Indo
(Paquistão); rio Amarelo (China); rio Hai (China); rio Nilo (Egito); rio Ganges
(Índia); rio das Pérolas (China); rio Anum (Gana), rio Níger (Nigéria) e rio
Mekong (Vietnã). Provavelmente, se fluísse em direção ao oceano Atlântico, o rio
Tietê também seria incluído nesta lista.
Todos
estes rios têm algo em comum. Percorrem regiões densamente povoadas (e alguns países),
que na maior parte dos casos não dispõem de serviços adequados de coleta de
lixo e de reciclagem, aliado ao baixo nível da educação ambiental das
populações. Na América Central ocorre um fato que, noticiado recentemente pelo
site BBC Brasil, é um exemplo desta situação. O rio Motagua nasce na região
Oeste da Guatemala e em seus últimos quilômetros, antes de desembocar no mar do
Caribe, faz divisa com Honduras. O rio recebe descargas tão volumosas de lixo,
que ao longo da região costeira, tanto da Guatemala quanto de Honduras, se
estende uma imensa ilha de embalagens plásticas. Honduras acusa a Guatemala de
ser o poluidor do rio porque os municípios guatemaltecos jogam nele seus
resíduos. A Guatemala, por sua vez, também não quer assumir toda a culpa. A
discussão entre os países continua.
O
acúmulo de plástico nos oceanos começou a ser percebido como impacto ambiental
a partir dos anos 1970. De lá para cá os indícios são cada vez maiores. A maior
parte do plástico que vai para os oceanos acaba retornando às praias onde, se
não recolhida, o resíduo pode permanecer por várias décadas, até se desfazer.
No ambiente natural, os fatores que mais contribuem para a degradação do plástico
são a luz do sol, o oxigênio e a água. No entanto, através deste processo de
desintegração permanece um resíduo de micro ou nanopartículas do material, que
podem causar grandes danos aos organismos.
A
parte do plástico que, levada pelas correntes não retorna a terra, é muitas
vezes confundida com alimento pelas diversas espécies que vivem no mar,
causando acidentes no sistema digestivo e respiratório que muitas vezes resultam
em morte. Em grandes quantidades e levadas pelas correntes, este material se
degrada transformando-se em uma "sopa concentrada" de pequenas
partículas plásticas de tamanho menor que cinco milímetros.
Nas
regiões onde ocorre o encontro de correntes marinhas, como no Pacífico Norte,
na região do Caribe e na parte Sul dos oceanos Atlântico e Índico, a rotação
das águas forma imensas ilhas de plástico, com centenas de quilômetros de
extensão. A maior parte destas ilhas não é formada por resíduos grandes, como
garrafas e potes de iogurte, mas por partículas que já sofreram um processo de
desgaste, de poucos milímetros de tamanho e até menores. A maior destas formações até agora avistadas, a Grande Ilha de Lixo do
Pacífico possui, segundo fontes talvez exageradas, um tamanho equivalente ao
território dos Estados Unidos. Também existem evidências, de que gradualmente estas partículas micrométricas afundam e se juntam ao solo marinho.
O
problema está se tornando cada vez mais sério e as consequências a médio e
longo prazo são imprevisíveis. É certo que o volume de plástico continuará
aumentando cada vez mais e o tempo de degradação do material é relativamente
longo, podendo variar de 50 anos, no caso de um copo de isopor, até 600 anos
para a linha de pesca. Enquanto isso, aumenta a quantidade de plástico finamente
dissolvido na água, afetando toda a cadeia alimentar dos mares. Na Inglaterra,
por exemplo, já foi constatado que um terço dos peixes capturados tem resíduos
de plástico em seus tecidos, na forma de micropartículas.
Em
dezembro de 2017 mais de 200 países presentes à Assembleia das Nações Unidas
sobre o Meio Ambiente, em Nairóbi, se comprometeram a reduzir gradualmente o
descarte de embalagens plásticas nos oceanos. A solução, todavia, é bem
mais custosa e complicada do que parece, já que envolve a implantação de planos
de gestão de resíduos em todos os municípios que tenham alguma ligação com o
mar, como vimos acima.
O
Brasil, segundo um estudo da revista Science de 2015, ocupa o 16º lugar entre
os países mais poluidores dos oceanos. A pesquisa levou em conta o número de
habitantes dos países vivendo em regiões litorâneas, o tamanho da costa e o
nível de desenvolvimento dos programas de gestão de resíduos. É previsto que a
partir desse ano (2018) as regiões metropolitanas já comecem a implantar a Política
Nacional de Resíduos Sólidos. Sucessivamente, até 2022, todos os 5.570
municípios brasileiros deverão ter instaurado a política.
(Imagens: fotografias de Jean Manzon)
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