"Mas há um ponto crucial: para se ter vontade de consumir, é preciso estar em estado de insatisfação, situar-se dentro de uma lógica do desejo que prioritariamente se caracteriza pela carência." - Luc Ferry - Famílias, amo vocês - Política e vida privada na era da globalização
A alimentação representa o
mais antigo e fundamental vínculo que o ser humano tem com a natureza. Apesar
de todo avanço da tecnologia agrícola, são as condições ambientais - como a
temperatura e o ritmo de chuvas e as características do solo e de seus micro-organismos
- que continuam sendo determinantes na produção dos alimentos. Durante centenas
de milhares de anos nos alimentamos principalmente de carnes, acompanhadas de algumas
raízes e eventuais frutos. Foi apenas nos últimos 10 mil anos, quando passamos
a praticar a agricultura, que a base da nossa dieta passou a ser de cereais e grãos
- trigo, aveia, arroz, milho.
Os primeiros alimentos
processados industrialmente surgiram no final do século XIX, tornando-se
populares depois da 2ª Grande Guerra. Atualmente é quase impossível fazer uma
refeição, sem ingerir algum alimento processado. Durante sua preparação, são
adicionados aditivos químicos - corantes, aromatizantes, conservantes,
antioxidantes, estabilizantes e acidulantes - que têm a função de dar sabor,
cheiro, aspecto natural e durabilidade ao alimento. Outros componentes bastante
importantes, dosados de modo a tornar os alimentos mais agradáveis ao paladar -
mas nem por isso mais saudáveis -, são o sal, o açúcar e a gordura hidrogenada.
São estas substâncias que aumentam o impulso de consumo de produtos como
refrigerantes, batatas fritas, salgadinhos, biscoitos, sorvetes e bolos.
Há mais de quarenta anos é
conhecida a estreita relação entre o sal, o açúcar, a gordura trans
(hidrogenada) e as doenças cardiovasculares, o diabetes, o excesso de peso e
certos tipos de câncer. Na Europa e nos Estados Unidos, campanhas governamentais
e iniciativas de ONGs procuram conscientizar os consumidores sobre o perigo do
excesso de sal, açúcar e gordura, contidos em determinados alimentos. Recentes
legislações nestes países limitam a adição destas substâncias às comidas e
exigem que os fabricantes incluam informações mais claras nos rótulos dos
produtos.
No Brasil o problema mal
começou a ser discutido. O percentual de pessoas adultas com sobrepeso e obesas
está em torno de 52% da população e o de crianças em 39%. O aumento de peso das
crianças se dá principalmente entre a população mais pobre, que consome quantidades
maiores de alimentos processados, por serem mais baratos que os outros. Esta
população tem menos acesso à informação e a recursos como médicos e clínicas
especializados, academias e remédios. O filme brasileiro "Muito além do
peso" (https://www.youtube.com/watch?v=8UGe5GiHCT4) aborda este problema,
em reportagens sobre a má educação alimentar infantil no país.
No Brasil, o controle da
qualidade dos alimentos é partilhado por diversos órgãos e entidades da
administração pública, como o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS),
Sistema Único de Saúde (SUS), Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA), entre outros. A falta de clareza na competência do controle gera
problemas, além das legislação excessivamente detalhada e nem sempre revisada. Segundo
o jornalista americano Michael Moss, autor do livro traduzido "Sal, açúcar
e gordura - Como a indústria alimentícia nos fisgou", o setor está
dominado por grandes empresas, que exercem forte pressão sobre o governo e a
mídia. Assim, para ter melhor qualidade de vida, a sociedade civil precisa se
organizar e reivindicar.
(Imagens: pinturas de Vladimir Baranov-Rossine)
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