"Políticos só podem ser levados a sério pelo mal que podem causar; nunca pelo bem que dizem poder fazer." - Ricardo Ernesto Rose - Considerações oportunas
A
maior parte das áreas de grande diversidade biológica está localizada em
florestas e savanas das regiões tropicais. Não por acaso, estes extensos territórios
com alta concentração de biodiversidade, estão situados em países onde por
fatores históricos, geográficos e econômicos, estas riquezas naturais ficaram
relativamente conservadas até as últimas décadas. O difícil acesso e o diminuto
interesse econômico que estas regiões despertavam, fez com que se conservassem
quase intactos muitos de seus ecossistemas ao longo da evolução da vida na
Terra.
Este
quadro quase idílico, no entanto, começou a mudar depois da Segunda Grande
Guerra. A expansão do capitalismo industrial para todos os continentes
habitáveis do planeta, incorporou estes países – muitos deles recentemente
criados – como consumidores de produtos e supridores de matéria de matérias
primas, ao sistema econômico mundial. Crescia a atividade econômica, chegavam
os avanços da moderna medicina, como a vacinação e o saneamento, e assim
aumentavam os índices de natalidade. Com mais pessoas a serem alimentadas, a
agricultura precisava avançar sobre territórios inexplorados, cobertos por
florestas e savanas, onde a biodiversidade ainda era alta.
Começava
assim a destruição das áreas remanescentes de biomas e ecossistemas originais,
em áreas tropicais. O processo teve início na década de 1950 e se estende até
os dias atuais. Ao longo desses sessenta anos, vastas extensões de floresta
foram destruídas, na maior parte dos países da Ásia, África e América Latina. Estima-se
que em 1800 a área de florestas tropicais era de cerca de 16 milhões de
quilômetros quadrados em todo o planeta. Em 2010 estimava-se que menos da
metade dessa área permanecia como floresta intocada, e cerca de um outro quarto
sobrevivia como floresta fragmentada e degradada (Jornal da Unicamp de
7/08/2017).
Segundo
o professor Luiz Marques, livre-docente do departamento de História da
IFCH/Unicamp, as florestas tropicais são o lar de 80% de todas as espécies
terrestres. Ainda segundo o professor, haveria entre 40 mil e 50 mil espécies
diferentes de árvores nas florestas tropicais da Ásia, África e América do Sul.
Segundo o docente, dados coletados por satélites em todo o mundo entre 1990 e
2010, mostram um aumento no desflorestamento de 62% na primeira década do
milênio. No Brasil o processo de derrubada da floresta vinha diminuindo nos
últimos dez anos, mas apresentou considerável crescimento, notadamente no
período 2017-2018.
Uma
rede de 120 cientistas de diversas especialidades e regiões do Brasil elaborou
recentemente o Primeiro Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade e Serviços
Ecossitêmicos. O trabalho identificou que 40% da cobertura florestal brasileira
está concentrada em 400 municípios, nos quais vivem 13% da população mais
economicamente carente do país. Estes municípios localizam-se principalmente na
região Norte e em parte menor no Centro-Oeste. Estas áreas, apesar de ainda
possuírem cobertura vegetal original considerável, apresentam índices de
desenvolvimento humano (IDH) bastante baixos.
O
baixo desenvolvimento econômico e social nessas regiões, classificado pelo
relatório como “pobreza verde”, representa uma ameaça à conservação da
floresta. A falta de perspectivas de sobrevivência, aliada à ausência de quase
todos os serviços oferecidos pelo Estado, faz com que a população se volte para
o aproveitamento da única riqueza imediatamente mais disponível: a floresta.
Começa assim o ciclo de degradação, que se inicia pela retirada da madeira com
algum valor comercial. Em seguida ocorre a derrubada e queima da vegetação,
seguida pela agricultura de sobrevivência e pela criação de gado. O solo, que
na maior parte da região é pobre, em poucos anos se torna degradado, não sendo
mais indicado para a agricultura ou criação de animais.
Ao
final deste processo, que pode durar alguns anos, a população não tem mais
possibilidade de exercer nenhuma atividade econômica baseada na terra, que está
esgotada. O passo seguinte é abandonar a região e dirigir-se para outras áreas
ainda inexploradas ou se estabelecer na periferia das pequenas cidades da
região. A falta de infraestrutura de saneamento, assistência médica e educação,
faz com que este processo, do uso incorreto da floresta até a fixação na
cidade, aumente a pobreza e o atraso nestas regiões.
Outro
aspecto é que geralmente a exploração da floresta e sua substituição pela
pecuária, não gera benefícios econômicos consideráveis para a região e seus
habitantes. A maior parte dos recursos auferidos pelo comércio de madeira e do
gado é recebido pelo dono (ou grileiro) da terra e do gado. Os impostos, quando
devidamente pagos, pouco beneficiam as prefeituras e, indiretamente, a
população local. Findo o processo de derrubada da floresta e exaurimento da
terra, nada sobra para a região.
Para
beneficiar econômica e socialmente estas regiões e suas populações, o relatório
propõe uma série de iniciativas baseadas na manutenção da vegetação e a criação
de cadeias de produção, com a utilização dos recursos naturais da floresta. “A
mensagem principal do diagnóstico é que biodiversidade e serviços
ecossistêmicos não podem ser vistos como obstáculos ao progresso”, diz o
biólogo Carlos A. Joly, professor de ecologia da Universidade de Campinas e um
dos especialistas que participaram na elaboração do documento, em declaração ao
jornal Valor.

(Imagens: desenhos do arquiteto Tadao Ando)
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