"Por isso é que, na formação de professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática." - Paulo Freire - Pedagogia da autonomia
A
correta gestão dos resíduos urbanos sempre foi um dos maiores desafios das
aglomerações urbanas. A primeira cidade europeia a construir uma aterro
sanitário planejado foi Atenas, na antiga Grécia, aproximadamente em 500 AEC. Nas
cidades medievais da Europa, não era incomum que se jogasse o lixo e os
resíduos sanitários pelas janelas das casas para a rua. A inadequada disposição
dos detritos poluía o lençol freático que abastecia as fontes públicas das
cidades, provocando frequentes epidemias de febre tifoide e outras doenças
ligadas à água contaminada. Apenas gradualmente, ao longo dos séculos, se impõe
a ideia de dispor os rejeitos urbanos longe do centro urbano, em local
relativamente isolado e sob controle.
Modernamente,
o gerenciamento do lixo urbano passou a ser tratado de modo científico primeiramente
na Inglaterra, onde em 1842 Edwin Chadwick publicou seu estudo “Relatório a
Respeito da Pesquisa sobre a Condição Sanitária da População Trabalhadora na
Grã Bretanha” (Report of an Inquiry into
the Sanitary Condition of the Labouring Population of Great Britain), provando
o vínculo entre o surgimento de doenças e as condições de saneamento das
cidades. Em 1848, o governo inglês estabelece com a “Lei de Saúde Pública” (Public Health Act) os marcos iniciais para
uma legislação de gerenciamento de resíduos públicos. Da Inglaterra estes
conceitos e práticas foram se estendendo a outros países, alguns dos quais –
como a França e a Alemanha – também já tinham obtido avanços nesta área.
No
Brasil a questão surge no período colonial, quando a disposição do lixo das poucas
cidades mais importantes já era um tema que despertava atenção. Em seu texto “Por
uma história do lixo”, publicado na Revista de Gestão Integrada em Saúde do
Trabalho e Meio Ambiente (InterfacEHS, 2006), a historiadora Dra. Rosana
Miziara escreve que uma das primeiras referências à limpeza pública na cidade
de São Paulo é uma comunicação da Câmara Municipal de 1623, escrita por ocasião
das festas religiosas, convidando os donos de casas a “limpar e carpir
testadas”. Em 1625, antes da Procissão de Passos, a Câmara Municipal
determinava que cada morador mandasse “seu escravo com sua enxada carpir o adro
da igreja e a praça da vila”. Numa cidade pequena e pobre como a São Paulo do
século XVII, a administração municipal não dispunha de recursos próprios para
zelar pela limpeza pública.
Atualmente,
o Brasil continua enredado com a solução do problema da gestão do lixo. Em 2018
o país gerou 79 milhões de toneladas de resíduos urbanos, dos quais 92% (72,7
milhões de t) foram coletados. Deste total coletado, cerca de 40,5% recebem
destinação irregular, em aterros controlados (23%) e lixões (17,5%). Isto
significa que parte considerável das prefeituras – cerca de 3 mil em um
universo de 5.565 – ainda não dispõe de aterros sanitários regulamentados.
A
Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), criada em 2010, previa que até
2014 todos os município brasileiros eliminassem os lixões. Face à incapacidade
das prefeituras em atenderem a legislação, o prazo foi prorrogado para 2020. Em
decisão recente o Congresso estendeu o limite para 2024. Com estas
deliberações, a Câmara passa a mensagem de que se novamente a lei não for
cumprida, haverá outras prorrogações no futuro. Até quando o país vai esperar?
(Imagens: pinturas de Rick Griffin)
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