O
site New Humanist (https://newhumanist.org.uk/) publicou
recentemente o artigo A good death
(uma boa morte - https://newhumanist.org.uk/articles/5857/a-good-death),
do jornalista Jem Bartholomew, relatando o processo de desenvolvimento da
doença e morte de pessoas acometidas por câncer. O autor descreve a situação de
Rebecca, uma mulher de 53 anos, paciente de câncer na pleura, em processo de
metástase. O texto tem como tema principal o sofrimento dos doentes terminais,
principalmente aqueles com câncer, e a questão da morte assistida ou suicídio
assistido (eutanásia voluntária), diferente da eutanásia involuntária. Na morte
assistida, o paciente é o agente de sua morte, enquanto que na eutanásia esta
responsabilidade é de outros. O autor faz referência à instituição Dignitas, na Suíça, que ajuda pessoas a
cometerem o suicídio assistido.
Antes
de continuar, duas breves explicações. New
Humanist é o site pertencente à revista de cultura e ciência homônima,
fundada em 1885 pela Rationalist
Association (Associação Racionalista - https://rationalist.org.uk/).
A entidade foi criada pelo jornalista e editor Charles Watts, profissional dedicado
à divulgação do livre pensamento, da ciência e do secularismo, colocando-se
contra o irracionalismo e a intolerância religiosa.
A Dignitas (http://www.dignitas.ch/index.php?lang=en),
cujo lema é “viver com dignidade, morrer com dignidade” é uma associação sem
fins lucrativos, fundada em 1998 em Zurique, na Suíça. Em seu site, a
instituição informa que entre suas atividades está o aconselhamento em temas
relacionados ao fim da vida, prevenção ao suicídio, acompanhamento de pacientes
moribundos e assistência a pacientes com suicídio autodeterminado.
Muitos
doentes sofrendo de câncer, como explica o autor do artigo, são afligidos por
fortes dores, muitas vezes insuportáveis, o que torna o processo de morrer
bastante doloroso, especialmente em casos de câncer pulmonar. Ao relatar o contexto
do desenvolvimento da doença de Rebecca, o jornalista também apresenta casos de
outras pessoas e expõe a situação política e legal em relação à morte assistida,
no Reino Unido.
Os
casos de assassinatos de pacientes idosos e doentes em clínicas e hospitais,
como o caso do assassino em série inglês Harold Shipman, têm colocado
empecilhos à aprovação de leis que permitam o suicídio assistido no Reino Unido.
No momento a prática é legalizada em nove estados americanos, três estados
australianos, na Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Espanha e Suécia. Com algumas
mudanças, países como Portugal, Itália, França, Alemanha e Áustria também tornaram
o procedimento legal.
A
prática da eutanásia voluntária, no entanto, é bastante controlada, sendo
mandatório que o doente solicitante seja capaz e consciente, e que o processo
seja aprovado por uma comissão de avaliação. Por seu lado, o profissional
médico poderá alegar objeção de consciência, para se recusar a participar do
procedimento. Segundo reportagem da revista Exame sobre a legalização da
eutanásia na Espanha, em março de 2021 (https://exame.com/mundo/espanha-legaliza-eutanasia-saiba-como-funciona-em-outros-paises-europeus/)
“a norma prevê que qualquer pessoa com doença grave e incurável ou crônica e
incapacitante, solicite ajuda para morrer, evitando assim sofrimentos
intoleráveis”. O texto cita casos emblemáticos ocorridos na Espanha – e há
vários pelo mundo – como o de Ramón Sampedro, um galego tetraplégico, que
durante 29 anos reivindicou o direito ao suicídio assistido. Sua história foi
retratada no filme Mar Adentro, que
ganhou o Oscar em 2005.
A
discussão do direito à morte assistida, por uma mídia dedicada à divulgação do livre
pensamento e da ciência como o New
Humanist, mostra que o tema, mesmo em um país de tradição liberal e secular
como o Reino Unido, ainda sofre bastante resistência. Há que se considerar que
grupos religiosos colocam-se frontalmente contra a prática, e que numa
sociedade democrática utilizarão a legítima pressão política para barrar a
aprovação da prática. É digno de nota, no entanto, que em 2016 o arcebispo da
igreja anglicana, Desmond Tutu, Prêmio Nobel da Paz, colocou-se a favor da
proposta de lei da morte assistida no Reino Unido.
Por outro lado, existem também aqueles que por diversas razões temem um uso inadequado da morte assistida, sem um estrito controle. São pontos de vista que precisam ser considerados e discutidos. Somente quando a maior parte da sociedade estiver consciente da necessidade de incorporar mais este direito humano, a prática poderá ser regulamentada.
(Imagens: pinturas de Adolfo Guiard)
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