A publicidade
está sempre nos perseguindo em todas as mídias (e até fora delas). Nos jornais
e nas revistas impressas, na TV aberta, na TV a cabo, no Youtube, em outdoors e
no rádio. Há sempre alguém querendo nos mostrar um novo produto, um serviço,
alguma novidade que não conhecemos, mas que supostamente precisamos experimentar,
comprar. “É deste item que você precisa para ser feliz, ser admirado, ser você...
ser alguém.” O cidadão está sendo bombardeado constantemente com produtos, serviços,
ideias, “opiniões abalizadas de especialistas”, “recomendações de quem
experimentou”; para comprar, experimentar, usar. Uma pesquisa realizada pela
empresa americana Media Dynamics em 2014, mostrou que um americano médio era
exposto:
- a cerca de 5.000 “anúncios e marcas” em
média por dia;
- a uma média de 362 “anúncios” por dia;
- a uma média percebida de 153 “anúncios”
diários;
- a uma média de 86 “anúncios” diários dos
quais tinha conhecimento;
- a uma média de 12 “anúncios” que provocaram
alguma impressão (engajamento).
(Conforme New
Research Sheds Light on Daily Ads Exposure - https://sjinsights.net/2014/09/29/new-research-sheds-light-on-daily-ad-exposures/)
Entre a data da pesquisa (2014) e os dias atuais, estes números aumentaram mais ainda, com o surgimento de um número maior de mídias sociais. Artigo dos jornalistas Bruno Garattoni e Elisangela Roxo publicado na revista Superinteressante em 2011, mostrava que aos 60 anos o cidadão comum já pode ter visto cerca de 2 milhões de anúncios; aproximadamente 16 mil horas de mensagens – 1,8 anos ininterruptos só vendo publicidade –, apenas considerando a televisão. Estes dados nos levam a pensar o quanto de maneira consciente e, principalmente, inconscientemente, nossas ideias, intuições, opiniões, conceitos, preconceitos e impulsos são influenciados pelas milhares de horas de publicidade e propaganda, às quais todos somos submetidos desde a infância em maior ou menor grau.
Ale
Smidts (1958 -), cientista e professor de marketing na Universidade Erasmus, em
Rotterdam, na Holanda, criou o conceito do neuromarketing. A especialidade se
dedica ao estudos da influência de determinadas iniciativas de marketing no
comportamento dos consumidores. Este novo ramo do marketing, utilizando-se de
conhecimentos da neurologia, tenta compreender como certas informações e
impulsos atuam no cérebro humano, permitindo criar campanhas de marketing mais
efetivas. Pergunta-se, por exemplo, qual o impulso que leva a pessoa a comprar,
ou não, determinado produto ou serviço. Preço? Apresentação? Durabilidade? Que
outros fatores, mais sutis, também teriam influência na escolha do consumidor;
como a imagem do produto ou serviço, associada ao status de sua posse; a ideia de modernidade que transmite; a aceitabilidade
social; o conceito de diferenciação, etc.
A publicidade
moderna surgiu no início do século XX, nos Estados Unidos, quando campanhas de anúncios
na imprensa foram utilizadas para incrementar as vendas dos novos produtos
domésticos, elétricos e a gás, que começavam a ser lançados pela indústria
americana. Liquidificadores, geladeiras, fornos, batedeiras, máquinas de lavar,
torradeiras, entre outros. Produtos que até então eram desconhecidos pela
grande massa de consumidores, passaram a se tornar acessíveis para grande parte
das famílias. A publicidade na imprensa e mais tarde no rádio e no cinema, deu
sua contribuição àquilo que depois ficou conhecido com a “sociedade do consumo”.
No Brasil
a publicidade comercial de larga escala começou a se desenvolver mais amplamente
a partir dos anos 1930, veiculada através dos jornais, revistas e no rádio.
Assim como em toda a sociedade capitalista ocidental, a publicidade no Brasil também
acompanhou o gradual desenvolvimento da indústria e a sofisticação das técnicas
de venda no comércio. Grandes avanços ocorreram quando a televisão foi
introduzida no Brasil em 1950, que veiculou os primeiros anúncios comerciais em
1952. A possibilidade de criar enredos comerciais direcionados a milhões de
espectadores, fez com que a propaganda e o marketing brasileiro se
desenvolvessem solidamente, atingindo qualidade mundialmente reconhecida
através de diversas premiações.
Uma
das principais características da atual publicidade é a singular estratégia de
apresentação do produto. Em quase todas as campanhas, baseadas em um procedimento
abrangente de marketing, não se fala ostensivamente do item, de suas qualidades
(preço, durabilidade, etc). Foca-se a publicidade naquilo que o consumidor
obtêm (ou parece obter) ao consumir o produto: projeção social, segurança,
autoestima, satisfação, etc. É, por exemplo, a segurança da família naquele
carro específico, a autoestima e a satisfação em usar o xampu fabricado com
produtos ambientalmente corretos, a aplicação bancária no fundo de
investimentos que apoia grupos de artesãos da Amazônia, e assim por diante.
Outra
característica da publicidade, pelo menos no Brasil, é uma certa
artificialidade ao retratar lugares, pessoas, tipos sociais, estilos de vida,
etc. Apesar de ter avançado bastante neste quesito em relação ao que se
mostrava, principalmente na TV, há vinte ou trinta anos, nossos comerciais
continuam com um certo ranço de artificialidade. As ruas, as casas, são muito
limpas, arrumadas; as mesas de jantar ou de café da manhã são ajeitadas demais; as pessoas com roupas cuidadas e passadas; os ambiente internos das casas pintados,
ajeitados. Certos traços dos personagens são exagerados, às vezes em excesso,
dando uma certa artificialidade às peças publicitárias.
Ainda
há outro aspecto. Com exceção da publicidade de alimentos comuns e produtos de
consumo de baixo valor, parte dos comerciais parecem ser direcionados a apenas
uma parte da população brasileira: os 25%, formados por uma classe média com maior
poder de consumo e os ricos. Fica difícil imaginar que com uma renda média mensal
de R$ 2.543,00 em 2020 e uma inflação que deve ultrapassar os 10% até o final de
2021, a maior parte dos trabalhadores possa comprar parte
dos produtos anunciados nas TVs, revistas e outras
mídias. Quanto aos desempregados, subempregados e aposentados é mais difícil ainda.
A
continuar a situação de exclusão econômica de grande parte da população, a
publicidade terá que desenvolver outras abordagens, sob risco de falar apenas
para uma pequena parte dos consumidores. Os comerciais com seus personagens e
suas roupas, seus bairros, suas casas, seus hábitos de consumo, sua cultura,
farão cada vez menos sentido para a maior parte dos cidadãos (que em outras condições poderiam ser potenciais consumidores).
(Imagens: anúncios na imprensa em 1920-1950)
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