"A filosofia bem sucedida (ou 'verdadeira') já não definida por uma explicação (ou representação) da totalidade do ser que seja suscetível de verdade [truth-apt], mas que por sua capacidade de dar conta das ilusões, ou seja: de explicar não apenas por que ilusões são ilusões mas também por que elas são estruturalmente necessárias e invitáveis e não simples acidentes." - Markus Gabriel e Slavoj Zizek - Mitologia, loucura e riso
As primeiras indústrias surgiram no Brasil no final do século XIX,
com o aparecimento de tecelagens e metalúrgicas. Durante o início do século XX
o numero de indústrias cresceu, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo.
Ao final dos anos 1930 o País já possuía um parque industrial capaz de atender
as necessidades básicas do mercado consumidor interno. A industrialização
inicia-se efetivamente a partir da década de 1950, quando o Brasil já dispõe de
uma pequena indústria de base, estruturada de modo a sustentar o crescimento de
outros setores. Fortemente impulsionada pela indústria automobilística e seus
fornecedores, seguiu-se toda uma cadeia produtiva de metalurgia, produção de
máquinas e equipamentos. Aliado a estes setores, ocorre a expansão da infraestrutura
(transportes e geração de energia) e a construção das primeiras refinarias,
base do desenvolvimento da indústria petroquímica na década seguinte. Ainda
durante este período, o governo de Juscelino Kubitschek institui o Plano de
Metas, cujos principais objetivos eram: combate ao subdesenvolvimento via
industrialização, diversificação da estrutura produtiva, reforma agrária,
distribuição de renda, planejamento econômico e reforma administrativa fiscal.
Concede-se às multinacionais prazos de isenção fiscal, terrenos, infraestrutura
e crédito oficial. Muitas delas se instalam com menos de 20% de investimento
efetivo de capitais. Ocorre assim forte fluxo de capitais, sobretudo dos EUA,
da Alemanha, do Japão e da França. O PIB (Produto Interno Bruto) cresce em
média 7% ao ano, contra 5,2% no período 1945-1955. A produção industrial
aumenta 80% em 1955-61, a
siderurgia 100%, a indústria mecânica 125%, a elétrica e de comunicações 300% e
o recordista setor de transportes cresce 600%.
Paralelamente ao processo de industrialização também sucedem
grandes mudanças no campo, a partir da década de 1960. A incorporação de uma
maior extensão de terras agricultáveis, através da expansão da fronteira
agrícola em estados como Paraná, Goiás e Mato Grosso, provoca uma demanda maior
por equipamentos e insumos agrícolas, iniciando o processo de mecanização do
campo. Este fato, aliado à grande oferta de empregos nos centros urbanos, fortalece
bastante o êxodo rural, que já vinga ocorrendo desde a década de 1940, mas se
tornará mais acentuado entre os anos 1950-1980. Neste processo haverá um
deslocamento de cerca de 30 milhões de pessoas do campo para as cidades. No
início dos anos 1950 aproximadamente 70% da população brasileira ainda vivia no
campo e 30% nas cidades. Apenas trinta anos depois, esta proporção havia se
invertido. É preciso não subestimar o impacto que estas migrações causaram nas
grandes metrópoles brasileiras, já que os investimentos na expansão da
infraestrutura não foram suficientes para atender a crescente demanda por
serviços públicos, vindo a provocar o colapso da qualidade de vida nas grandes
regiões metropolitanas.
Durante este período da história do país, chamado de "milagre
econômico", a questão da degradação ambiental não era discutida. O governo
da época, formado por militares e tecnocratas, estava mais interessado em
aumentar a produção industrial e na ocupação de terras virgens (como no caso da
construção da rodovia Transamazônica), do que na proteção dos recursos
naturais. A falta de preocupação ambiental era compreensível para a época, já
que o país tinha que crescer e gerar riqueza para a maior parte de sua
população. Em consequência desta orientação, inexistia praticamente uma
legislação ambiental, não havia órgãos de controle ambiental e a ação de ONG's
era fortemente cerceada. A opinião pública não tinha acesso a informações e
desconhecia a degradação ambiental em andamento - a proteção dos recursos
naturais provavelmente não passaria pela cabeça da maior parte dos brasileiros
à época.
Aproveitando a completa ausência de controle ambiental, o setor privado – nacional e estrangeiro – também não realizava quaisquer investimentos para atenuar o impacto de suas atividades industriais. O setor público, principalmente governos estaduais e municipais, sempre priorizou o fornecimento de água potável, já que tais investimentos eram imediatamente percebidos pela população, geravam receita e tinham um custo de instalação menor do que o tratamento de esgotos domésticos. Quanto aos resíduos domésticos ou indústrias, não havia legislação específica ou diretrizes técnicas, e desta maneira eram destinados às valas ou "lixões", construídos de modo primitivo, sem qualquer tipo de proteção do solo.
No final da década de 1970, a situação econômica mundial e do Brasil
sofrem uma grande mudança. Os capitais de investimento, ainda fartos no mercado
mundial antes da segunda crise do petróleo (1979), tornaram-se escassos. Os
países ricos redirecionam seus investimentos, há uma retração geral dos
mercados em desenvolvimento e a economia brasileira deixa de crescer nos níveis
médios de 5% ao ano, registrados nos 15 anos anteriores (1964-1979). No quadro
político interno tem início o processo de redemocratização, que culmina com a
votação da Constituição em 1988 e a convocação das eleições presidenciais
diretas em 1989.
Com relação ao meio ambiente, em meados da década de 1970 já se
esboça um maior controle, através da criação de leis mais específicas e do
surgimento dos órgãos de controle ambiental. Esta preocupação, mesmo que ainda
incipiente, culmina com a votação de diversos artigos na Constituição, versando
especificamente sobre a proteção ao meio ambiente.
A abertura da economia brasileira que tem início no final dos anos
1980 e se amplia a partir de 1990 com o governo Collor, também trouxe
benefícios ambientais. As empresas brasileiras tiveram que melhorar sua
produtividade para poder enfrentar a concorrência dos produtos importados. O
aumento da produtividade também implicava um melhor uso das energias e insumos,
reduzindo, desta forma, os resíduos perdidos na produção. Empresas exportadoras
também foram pressionadas por seus compradores estrangeiros a implementarem
sistemas de produção mais limpos, já que os consumidores dos países ricos
preferiam produtos fabricados por processos ambientalmente corretos. Com mais
informações disponíveis, os consumidores e a opinião pública brasileira,
passaram a exigir melhores produtos e condições de vida, com qualidade
ambiental. O número de ONG's também aumenta rapidamente, atuando em diversos
segmentos, desde programas sociais que envolvem iniciativas de reciclagem de
materiais, ações populares exigindo o tratamento do esgoto doméstico, até
movimentos por moradias e reforma agrária. Os conceitos de "desenvolvimento
sustentável" e "tecnologias limpas" – discutidos durante o
Encontro Internacional sobre Meio Ambiente realizado no Rio de Janeiro, em 1992
(ECO 92) – passaram a ser gradualmente incorporados às estratégias das grandes
empresas brasileiras e estrangeiras e a muitos setores do governo federal.
O mercado ambiental brasileiro é o maior da América Latina. Devido
a sua população e extensão territorial, o governo brasileiro precisa fazer
grandes investimentos em saneamento e gestão de resíduos, além de outros
setores. Até o momento uma grande parte da população - cerca de 45% - ainda não
tem esgoto tratado. Na questão dos resíduos domésticos, a maioria dos
municípios ainda não dispõe de aterros sanitários corretamente instalados.
A indústria ambiental brasileira surgiu durante os anos de 1950,
como resposta a demanda que se iniciava no setor público (prefeituras) e
privado, principalmente na área de tratamento de água e efluentes. Os poucos
fabricantes de equipamento que existiam no mercado ainda não estavam
especializados e forneciam equipamentos para processos industriais, assim como
para o tratamento de água e efluentes. A demanda existente no mercado ainda era
muito pequena e deste modo não existia a especialização. Equipamentos não
disponíveis eram importados ou fabricados por empresas já atuando no setor,
dependendo do volume da demanda. O desenvolvimento da indústria ambiental ocorreu
em grande parte devido às necessidades específicas cada vez mais crescentes da
indústria, apesar de o setor público sempre ter sido o maior comprador de
equipamentos neste segmento.
O mercado da indústria de saneamento tomou impulso a partir da
década de 1970, quando o governo federal instituiu o PLANASA (Plano Nacional de
Saneamento), criando as companhias estaduais de saneamento. Estas companhias
receberam as concessões das prefeituras para assumirem os serviços de
tratamento de água e de esgoto das cidades. Deste modo, as companhias estaduais
de saneamento acabaram por centralizar estes serviços, tornando-se importantes
interlocutores para as empresas privadas, fabricantes de equipamentos e
consultorias fornecedoras de serviços especializados. Atualmente existem 27
companhias estaduais de saneamento, atendendo cerca de 3.800 municípios. Os
1.700 municípios restantes possuem serviços de tratamento de água e esgotos
autônomos.
A demanda do mercado é suprida por fabricantes estabelecidos no
Brasil; empresas de capital nacional ou multinacional. Como o mercado de
equipamentos de saneamento estava fechado às importações até 1990,
desenvolveu-se internamente uma forte base industrial, capaz de suprir a maior
parte das demandas de equipamentos e serviços do setor. Existem nichos de
mercado, como instrumentação de controle e monitoramento, análise e
automatização, que ainda não são supridos pela indústria nacional em sua
totalidade. Estas tecnologias são supridas por importações, realizadas através
de representantes brasileiros de fabricantes estrangeiros.
O mercado para as tecnologias para gerenciamento de resíduos
desenvolveu-se em época posterior ao do das tecnologias de tratamento de água e
de efluentes. A maior parte da legislação relacionada com o transporte,
manuseio, recuperação e destinação final de resíduos só foi desenvolvida
durante a década de 1980. Por outro lado, o transporte e a disposição dos
resíduos domésticos são de responsabilidade das prefeituras, que estão em
situação deficitária em sua maioria, impossibilitadas de realizarem novos
investimentos. Para dar uma destinação correta a seus resíduos, as empresas privadas
se utilizam em principalmente da oferta de serviços e equipamentos já existente
no mercado nacional. A exemplo do mercado de saneamento, o setor de
gerenciamento de resíduos é dominado por empresas brasileiras, principalmente
quanto aos equipamentos. Existem algumas empresas de consultoria atuando em
associação com empresas estrangeiras, mas sua quantidade ainda é muito diminuta
em relação ao potencial do mercado.
O
mercado ambiental brasileiro continua em constante evolução. A nova legislação
referente ao gerenciamento, a Política Nacional de Resíduos Sólidos está
criando novas mudanças no mercado, abrindo novas perspectivas de negócios para
as empresas. Igualmente as tecnologias de energias renováveis estão se tornando
cada vez mais representativas na matriz energética. O grande impulso, no
entanto, virá da melhoria do controle ambiental e de uma maior conscientização
por parte da população, exercendo papel fiscalizador sobre as ações do governo.
(Imagens: pinturas de Herbert Kornfeld)
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