Depois
de abordar temas de impacto, como a ocorrência de grandes incêndios, ataques de
tubarões, destruições provocadas por imensos maremotos e furacões, além dos
espetaculares ataques alienígenas, o cinema-catástrofe americano encontrou mais
um tema sobre o qual criar suas tramas: as mudanças climáticas. Também chamada
de crise climática por aqueles que querem dar mais relevância e seriedade ao
assunto, as consequências do fenômeno – o aquecimento da atmosfera terrestre
devido às emissões de gases – foram tratadas em filmes como O dia depois de amanhã (2014) e Tempestade:
planeta em fúria (2014). Além disso, existe uma série de documentários
melhor fundamentados, que tratam da crise climática de forma científica. Dentre
estes, destacamos Uma verdade
inconveniente (2007); A última hora (2007);
Faça as contas (2013); Cowspiracy (2014) e Nosso Planeta (2019), entre outros.
A
crise climática volta às manchetes das mídias regularmente a cada final de ano,
quando se realizam as reuniões anuais da Conferência das Partes (COP). Em 2020,
por causa da sindemia da Covid, a reunião não foi realizada, tendo sido
transferida para este ano. A COP 26 ocorreu em Glasgow, na Escócia, entre os
dias 31 de outubro e 12 de novembro. No momento em que escrevemos este texto
(1/11) ainda são poucas as informações sobre o evento, já que os trabalhos
tiveram início há pouco. No entanto, já antes do início da conferências,
diversos empresários e políticos de projeção mundial declaravam que os gastos
para reduzir as emissões de gases seriam muito altos e exigiriam bastante
esforço de todos. Jeff Bezos, fundador do Amazon e segundo indivíduo mais rico
do planeta, afirmou em março de 2020 que doaria 10 bilhões de dólares (cerca de
57 bilhões de reais) até o ano de 2030. Mesmo assim, afirma o bilionário, será
necessário muito mais para diminuir o aquecimento global. “Serão necessários
trilhões de dólares, para fazer a mínima coisa com relação à mudança do clima”,
declarou Bezos (https://abcnews.go.com/International/live-updates/cop26/?id=80799651#80907837).
As
expectativas em relação aos resultados da COP 26 não são muito diferentes das
edições anteriores. As atenções voltam-se, como sempre, às ações programadas
pelos grandes poluidores; a China, os Estados Unidos e a Europa, que juntos
contribuem com o maior parte do volume de gases de efeito estufa. O presidente
dos Estados Unidos, Joe Biden, já havia anunciado metas de redução para seu
país em abril de 2020, e não trouxe novidades para a Conferência. O governante
da China Xi Jinping não compareceu ao evento, alegando outros compromissos
internos. Segundo informações preliminares de pesquisadores, a Argentina, o Canadá,
a União Europeia, África do Sul, Reino Unido e os Estados Unidos foram os
únicos países que apresentaram compromissos de reduções de emissões. Coreia do
Sul, Japão e China limitaram-se a anunciar cortes, mas não chegaram a
apresentar planos concretos. México e o Brasil foram os únicos países do G20 que
elevaram suas previsões de emissões, em relação ao que já anteriormente haviam
prometido reduzir até 2030 (nesse interim, parece que o Ministério do Meio
Ambiente voltou atrás e reviu suas previsões para baixo, repetindo números
anteriores - “pedalada climática” dizem os especialistas).
Espera-se
que nesta reuniões possam avançar as negociações em relação à criação de um
mercado mundial de créditos de carbono, prática que chegou a tomar fôlego no
início da década passada, na Europa e nos Estados Unidos. O Brasil, foi um dos
países que chegaram a implantar dezenas de projetos de crédito de carbono e,
caso as negociações voltem a avançar, poderá ser um dos grandes beneficiados na
implantação de novos empreendimentos. Projetos de crédito de carbono são atividades
que reduzem ou eliminam emissões de gases de efeito estufa (metano, dióxido de
carbono, ozônio, óxido nitroso, entre outros). Por exemplo, ao invés de instalar
um gerador movido a óleo diesel, um empresário pode optar por gerar energia a
partir de células fotovoltaicas, queima de biomassa em uma caldeira ou instalar
um gerador eólico. A diferença entre as emissões que este empresário geraria
com um gerador a diesel (100 t/ano, por exemplo) e um gerador eólico (zero
t/ano), torna-se crédito. Ou seja, determinado número de toneladas de dióxido
de carbono (CO²) – neste caso hipotético 100 t/ano – deixarão de ser emitidas.
Como a tonelada de CO² não gerada tem uma remuneração (atualmente cerca de 50
Euros – 330 reais), o projeto deste empresário poderá gerar um crédito (330
reais X 100 = 33.000 reais/ano). Este crédito pode ser comprado por outras
empresas que, por emitirem acima de um limite, precisam abater esta diferença
emitida a mais, através da compra de créditos.
Há
vários encontros da COP espera-se que os países ricos disponibilizem recursos
para que os países em desenvolvimento possam adquirir know-how e tecnologia a fim de reduzirem suas emissões e tornarem
suas economias menos carbono-dependentes. Modernização de equipamentos,
substituição de combustíveis e matérias primas, retrofitting de unidades de produção e de operação; são medidas de
eficiência que podem reduzir significativamente as emissões de gases em diversos
setores da economia. Os recursos existentes são escassos e sem a ajuda das
nações industrializadas será difícil que os países pobres e em desenvolvimento possam
atingir os objetivos globais de redução de emissões em 2030 e 2050.
Os
países que mais serão atingidos pelos efeitos das mudanças climáticas são
principalmente os países do hemisfério Sul, em sua maioria nações pobres na
América Latina, África e Ásia. Países-ilha do Pacífico Sul, como Kiribati e
Tuvalu estão começando a desaparecer do mapa, devido ao aumento do nível do
mar. As Filipinas vêm sendo constantemente afetadas por fortes tufões e o
arquipélago de Figi vê o número de ciclones aumentar gradativamente – só para
citar alguns exemplos. Isto sem considerar o forte impacto que as mudanças do
clima terão na agricultura de países como a Indonésia, a Índia, o Brasil e os
países africanos, cujas economias dependem em grande parte dessa atividade.
Os
maiores emissores de gases de efeito estufa da economia mundial são os setores
de transporte, geração de eletricidade e a indústria. Não por coincidência, a
maior parte das atividades relacionadas a estes setores situam-se no hemisfério
Norte. Quanto mais alto o padrão econômico de uma sociedade, maior o número de deslocamentos
(automóveis, caminhões, trens, aviões, navios, etc.), mais alto o consumo de
energia (combustível, aquecimento, eletricidade, etc.) e mais diversificada a
atividade industrial (bens de consumo, bens semiduráveis e duráveis, etc.)
A desigualdade na economia mundial e a exploração dos países pobres pelos ricos espelha-se, assim, nas consequências das mudanças climáticas. Apesar dos discursos filantrópicos e benevolentes dos organismos multilaterais – ONU, OMC, FMI, Banco Mundial, etc., e dos países ricos -, os maiores prejudicados com os efeitos de uma ordem econômica mundial iníqua, da qual os pobres pouco aproveitaram, serão as próprias nações pobres.
(Imagens: pinturas de José Vital B. Malhoa)
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