"Persiste, no Brasil, uma crença generalizada de que 'ciência é coisa do Primeiro Mundo' ou, pelo menos, alheia ao país. Ignora-se, ou não é levada a sério, a ciência feita no Brasil." - Iván Izquierdo - Releitura do óbvio
Durkheim foi o grande sistematizador da sociologia.
Defendia que a principal tarefa da sociologia era a análise dos fatos sociais,
já que estes tinham uma existência externa e independente dos indivíduos. Outra
característica dos fatos sociais é que estes têm um poder coercitivo sobre os
indivíduos, que muitas vezes nem percebem esta ação. Exercem seu poder
condicionador sobre os indivíduos através de formas que podem variar de um simples
mal-entendido (como no caso do uso de uma palavra errada em uma conversa) até o
castigo ou pena (no caso de uma infração ou crime). Os fatos sociais, ensina
Durkheim, são intangíveis e só podem ser analisados através dos seus efeitos,
como as leis escritas, as normas técnicas, etc. Para estudá-los, o pesquisador deve
deixar de lado ideias preconcebidas e utilizar-se de conceitos gerados apenas
na práxis científica.
Uma das primeiras questões que Durkheim se colocou
em seus estudos é como um grupo de indivíduos pode constituir uma sociedade e
como esta se mantém coesa, persistindo no tempo? Chamou a este fenômeno de
solidariedade social e moral, ou seja, a maneira como os membros de um grupo
permanecem unidos, compartilhando um conjunto de valores e costumes. Mas, o que
é e como se dá esta solidariedade?
Em sua obra A
divisão social do trabalho (1893), Durkheim criou os conceitos de
solidariedade mecânica e solidariedade orgânica, para explicar a origem da
coesão entre os membros de uma sociedade. A solidariedade mecânica é aquela das
sociedades onde os indivíduos não se diferenciam. Quando uma sociedade é pouco
desenvolvida cultural e tecnologicamente existe pouca diferença entre seus
membros. Os componentes do grupo social se assemelham em diversos aspectos; têm
os mesmos sentimentos, os mesmos valores, iguais objetivos, as mesmas posses.
Este fato é observado em sociedades primitivas do passado e nas sociedades
não-letradas ainda espalhadas pelo mundo, como a tribo indígena dos Pirahã, da
região amazônica de Manicoré, quando foi contatada nos anos 1970. Existe uma
coesão entre os vários integrantes da aldeia neolítica ou da tribo indígena,
porque seus membros pouco se diferenciam, sendo em sua maioria intercambiáveis.
“Nas sociedades primitivas”, escreve
Aron, “cada indivíduo é o que são os
outros; na consciência de cada um predominam, em números e intensidade, os
sentimentos comuns a todos, os sentimentos coletivos” (Aron: 2008, p. 459).
Em tais grupos, a crença comum é de natureza repressiva – basta lembrar as
sociedades que têm proibições extremas, como os tabus – na quais os indivíduos
que desrespeitam as convenções são prontamente castigados.
A solidariedade orgânica representa uma nova fase
nas sociedades. A industrialização e a urbanização, que tiveram um forte
impacto sobre as sociedades européias do século XIX (e sobre as sociedades dos
países pobres e em desenvolvimento na segunda metade do século XX), propiciaram
o surgimento de uma maior divisão do trabalho. O aumento da atividade
econômica, o desenvolvimento tecnológico, criam uma especialização cada vez
maior, ao mesmo tempo em que cada atividade ou tarefa depende cada vez mais das
outras.
Cada indivíduo tem uma função diferente na
sociedade. No entanto, sua atividade contribui para a harmonia social. Cada
membro atua como se fosse um órgão, essencial para o funcionamento de um grande
organismo – daí o nome de solidariedade orgânica. O fato que era visto como
auspicioso por Durkheim em sua análise da sociedade industrial, é que apesar da
diferença entre seus membros, a dessemelhança contribuía para uma harmonia
maior, mantendo a sociedade coesa.
Fontes
consultadas:
Aron,
Raymond. As etapas do pensamento
sociológico. São Paulo. Martins Fontes: 2008, 884 p.
Giddens,
Anthony. Sociologia. Lisboa. Fundação
Calouste Gulbenkian: 2010, 723 p.
Sociologia e Modernidade: Durkheim. Filósofo Paulo
Ghirardelli. Disponível em
(Imagens: croquis de Daniel Libeskind)
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