"Todas as grandes tragédias têm um final feliz. Mas quem as suportaria até o final?" - Stanislaw Jerzy Lec - Últimos pensamentos desarrumados
Deste
que surgiu, a pandemia do coronavírus tem afetado todas as áreas das atividades
humanas. Estas pequenas “partículas infecciosas”, invisíveis a olho nu,
tornaram-se o maior fator de mudanças econômicas, sociais e culturais na nossa
civilização globalizada. Todas as atividades humanas, atuais e futuras, estão
sendo influenciadas por esta estranha criatura que, segundo a biologia, nem
pode ser classificada como um ser vivo.
Sabe-se
hoje, definitivamente, de que a pandemia teve início quando o vírus, que tinha
o seu habitat em animais selvagens sem prejudica-los, se adaptou ao organismo
de animais domésticos e desses passou para o homem. O processo é conhecido e
ocorreu de modo similar com outros vírus, ocasionando, por exemplo, a Gripe
Espanhola de 1918/19. Bactérias e vírus ainda desconhecidos se estabelecem nos
organismos de seres humanos quando estes, através de atividades como
desmatamento, caça, comércio ilegal e criação de animais selvagens, entram em
contato direto ou indireto com estes microrganismos.
Na
área ambiental a pandemia provocou um efeito imediato. Bilhões de pessoas foram
forçadas a permanecer em casa, ou pelo menos reduzir sensivelmente seus
deslocamentos, o que rapidamente diminuiu as emissões de gases poluentes
gerados por automóveis, transporte público, aviões, trens e navios. Durante a
crise financeira de 2008, que também teve um forte impacto na economia mundial,
as emissões mundiais de gases de efeito estufa (GEE) caíram 1,3% ao longo
daquele ano. Este ano prevê-se uma redução de cerca de 5% nas emissões de GEE
globais. Somente a China, o maio emissor de GEE do planeta, já teve uma queda
de 25% no primeiro trimestre do ano, com redução de 40% no consumo de carvão
usado para acionar seis de suas maiores termelétricas. Através de imagens de
satélites é possível detectar a diminuição das manchas de poluição atmosférica
na Ásia, Europa e Estados Unidos. No Brasil, as fotografias aéreas também
mostram a diminuição da nuvem de poluição que constantemente paira sobre a região
metropolitana de São Paulo, a mais carregada de GEE do país.
Com
a queda na frequência dos transportes e da distribuição de produtos, caiu igualmente a
demanda por combustíveis fósseis. Segundo relatório recente da Agência
Internacional de Energia (IEA), dados indicam que haverá uma queda de 20% na
demanda global de petróleo durante 2020, o que já fez com que o preço do barril
de petróleo diminuísse de US$ 70,00 em meados de 2019, para US$ 33,00 em março
deste ano.
A
pandemia também provocou a paralização do setor industrial em todo o mundo – na
China e em alguns países da Europa a atividade industrial está recomeçando
lentamente. No Brasil, a Confederação
Nacional da Indústria (CNI) reportou, através de um relatório publicado no mês
de março de 2020, que 79% das indústrias pesquisadas notaram uma redução nos
pedidos e 53% informam que a queda foi intensa. Essa situação reduziu a demanda
por matérias primas, insumos e componentes. Por outro lado, com a interrupção
das atividades fabris houve um abrandamento dos impactos ao meio ambiente, ao
longo da cadeia de produção dos produtos.
A
queda brusca nas atividade econômicas aumentou o desemprego em todo o mundo,
que já vinha crescendo principalmente nas economias periféricas, como a do Brasil.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (IWO) cerca de 1,6 bilhão de
trabalhadores estão com as rendas de subsistência comprometidas, devido à crise
econômica. A onda de desemprego mundial, no entanto, ainda não se fez notar com
toda a sua força, dado que muitos governos estão liberando empréstimos para
empresas e trabalhadores, caso dos países europeus, os Estados Unidos e também do
Brasil. Nessa situação, trabalhadores de todo o planeta serão forçados a
reduzir seu consumo de bens.
Mesmo
assim, em termos gerais, pode-se dizer que a redução da atividade industrial e comercial,
em todo o globo, trouxe visíveis benefícios ao meio ambiente. O que muitos
cientistas se perguntam, é como fazer com que mesmo com a retomada da economia,
estas melhorias – como a redução das emissões, da exploração dos recursos
naturais, da geração de resíduos, da poluição do solo e dos recursos hídricos
–, possam ser mantidas. As respostas a essa pergunta passam em grande parte por
soluções que já são conhecidas há anos. O principal incentivo para que agora
efetivamente sejam utilizadas, está na possibilidade de ocorrer uma nova
pandemia, com impactos e letalidade ainda maiores. Algumas destas soluções
englobam:
- Segundo
o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), há alguns aspectos a
serem observados daqui em diante, para evitar o aparecimento de novas epidemias,
entre os quais: a) reduzir o desmatamento e a ocupação desnecessária de áreas
virgens; b) proibir o comércio ilegal e a caça de animais selvagens; c) evitar
a criação intensa (concentrada em pouca área) de animais; c) evitar o uso de
antibióticos na criação de animais, a fim de impedir o surgimento da
resistência aos antibióticos; d) estancar as mudanças do clima, que podem
forçar o deslocamento de espécies para
outras regiões (inclusive bactérias e vírus);
- A
Agencia Internacional de Energia (IEA) sugere que sejam feitos grandes
investimentos em fontes de energia renovável, com o apoio financeiro de
governos e instituições internacionais. A dependência dos combustíveis fósseis
deve ser gradualmente reduzida a praticamente zero até por volta de 2050. Já há
uma tendência nos países ricos em se tornarem cada vez menos dependentes desta
fonte energética. Na Alemanha, as grandes empresas do setor privado solicitaram
recentemente ao governo Merkel, de que condicione qualquer ajuda financeira do
governo ao setor privado às ações de redução de emissões de GEE;
-
Nos países pobres e menos desenvolvidos será necessário implantar uma rígida
agenda de melhoria da infraestrutura; principalmente no que se refere à questão
do saneamento, condições de moradia, transporte público e saúde. Na atual
pandemia ficou patente que as populações mais pobres são as mais afetadas pelas
consequências sanitárias e econômicas da crise;
-
Além dessas, há uma série de outras iniciativas sendo discutidas, para as quais
governos e ONGs estão criando estratégias de atuação, envolvendo: consumo consciente,
extensos programas de redução na geração de resíduos e de agricultura orgânica.
(Imagens: mosaicos bizantinos)
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