Foi
notícia pouco divulgada a reunião de membros de uma entidade esotérica com o
Ministério das Minas e Energia para tratar, segundo se noticiou, do problema da
falta de chuvas no País. A versão foi posteriormente negada por representantes
do ministério. Segundo notícias publicadas no portal da revista Veja em
15/10/2021 (https://veja.abril.com.br/blog/veja-gente/cacique-cobra-coral-minas-energia-chuvas/),
o encontro foi realizado dia 14/10, entre membros da equipe técnica do ministro
das Minas e Energia, Bento Albuquerque, e um integrante da Fundação Cacique
Cobra Coral, Osmar Santos, representando a médium Adelaide Scritori. Scritori é
uma médium conhecida pelos políticos, com declarada capacidade de incorporar o
Cacique Cobra Coral, entidade espiritual que teria o poder de desviar chuvas e
controlar o tempo. Segundo Guilherme Godoi, um dos técnicos do ministério que
participou da reunião, “simplesmente ouvimos o que ele tinha a dizer, nosso
trabalho é técnico.” Já Osmar Santos garantiu que a médium trará “muita chuva”
para Minas Gerais, a partir do próximo mês (novembro).
Apelar
ao esotérico, à espiritualidade e mesmo à magia, nunca foi incomum na política.
Rosane Malta (ex Rosane Collor), ex-mulher de Fernando Collor, presidente do
Brasil entre 1990 e 1992 antes de sofrer impeachment, revela em seu livro Tudo o que vi e vivi (2014) que Collor
praticava rituais de magia negra (https://noticias.r7.com/brasil/ex-mulher-de-collor-diz-que-ele-fez-magia-negra-para-nao-concorrer-as-eleicoes-com-silvio-santos-30112014).
No livro, Rosane descreve o “trabalho” que seu então marido teria encomendado à
uma mãe no santo de Alagoas, para que o apresentador Silvio Santos não
concorresse à disputa nas eleições de 1989. A candidatura de Silvio Santos foi
impugnada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pouco antes da data das
eleições, por irregularidades no registro.
Parece
que o plano astral exerce influência na vida das pessoas comuns, na condução
da política nacional, mas também nas resoluções dos grandes líderes mundiais,
cujas decisões podem impactar a vida de milhões ou bilhões de pessoas. Durante
o governo do presidente americano Ronald Reagan (1981-1989), os astrólogos tornaram-se
grande influenciadores, principalmente sobre sua esposa, Nancy Reagan (https://elpais.com/diario/1988/05/04/internacional/578700005_850215.html).
O casal, especialmente Nancy, consultava regularmente astrólogos antes de viagens
ou discursos, que podiam ser alterados, dependendo do que projetavam os mapas astrais. À
época, quando a notícia começou a circular nos jornais, Ronald Reagan se
defendeu, afirmando que nunca teria tomado uma decisão política baseada nas
previsões de seus astrólogos.
No
México, o jornalista e escritor José Gil Olmos lançou na década passada dois
livros, Los brujos del poder 1 e Los brujos del poder 2, tratando da relação dos políticos de
seu país com a magia e os bruxos, a fim de alcançarem seus objetivos políticos.
Presidentes, governadores e ministros, utilizavam-se da ajuda do sobrenatural para
alcançarem ou manterem seus cargos e tirarem eventuais concorrentes do caminho. No segundo livro, o jornalista relata como a então presidente do Partido
Revolucionário Institucional (PRI), Beatriz Paredes, recorreu aos préstimos do
feiticeiro Wenceslao Flores Xala, conhecido como “El Gato Negro”, para afastar
as “más vibrações” e recuperar seu poder político.
Na
Tanzânia, onde segundo o centro de estudos Pew
Research Center (https://www.pewresearch.org/)
93% da população acredita no poder da magia, a relação das práticas mágicas com
a política são ainda mais fortes. Artigo publicado no jornal eletrônico da
agência Aljazeera em julho de 2015 (https://www.aljazeera.com/features/2015/7/21/brutal-black-magic-in-tanzanias-election),
mostra que são comuns os sacrifícios de animais, especialmente de gatos, feitos
por feiticeiros locais a pedido de políticos e candidatos à função. Manyaunyau,
um motorista de ônibus que passou a se dedicar à bruxaria, recebe muitos
pedidos de “trabalhos” de seus clientes. “Quando chegam as eleições, é quando
nós, feiticeiros, adquirimos muito respeito, porque todos estes políticos vêm
correndo até nós”, diz Manyaunyau. Segundo a reportagem, há poucos feiticeiros
que utilizam gatos em seus sacrifícios. Mais comum na Tanzânia é que em suas
práticas os bruxos se utilizem de pessoas albinas – mutação congênita que faz com
que olhos, cabelo e pele se tornem claros –, dos quais existem cerca de 1.400
indivíduos naquela nação. Vítimas em um país onde tais práticas mágicas são
comuns, as pessoas albinas são sequestradas, mutiladas, assassinadas ou
vendidas vivas para feiticeiros, que cobram uma pequenas fortuna para
encantamentos feitos com partes de seus corpos. Alguns países africanos
cultivam diversas crenças e mitos relacionados às pessoas albinas, o que faz
com que estas corram constante perigo de vida, apesar das leis expressas para coibir tais
práticas.
Além
do uso dessas práticas mágicas, a política também inclui diversas crendices,
reforçadas por acontecimentos posteriores, que se incorporaram ao folclore
político. Candidatos a prefeito, por exemplo, adquiriram o costume de não se
sentarem na cadeira do ocupante do cargo, antes de publicado o resultado das
eleições. Que o diga Fernando Henrique Cardoso, que antes de ocupar a presidência
do Brasil disputou a prefeitura de São Paulo, em 1985, quando era senador. Em
visita à prefeitura o ainda candidato foi instado pelos jornalistas presentes a
experimentar a cadeira do prefeito. Assegurado que a foto não seria publicada
antes do resultado de pleito, FHC acomodou-se na poltrona e foi fotografado.
Mas a fotografia vazou para a imprensa. Fernando Henrique perdeu a disputa para
o ex-presidente Jânio Quadro, por um percentual reduzido – 34,1% a 37,5%. No
dia da posse, Jânio Quadros, sempre teatral, borrifou inseticida na cadeira,
dizendo ironicamente aos jornalistas: “A poltrona de prefeito foi ocupada por
nádegas indevidas”.
Outra
crença do folclore político bastante arraigada mas, posteriormente desmentida
pelos fatos, é a de que candidatos à presidência não devem usar cocar
de índios, antes de serem eleitos. Juarez Távora, que disputava a presidência
em 1955, pousou com o adereço e perdeu as eleições. Mário Andreazza, na
campanha presidencial de 1984, colocou um cocar na cabeça, mas perdeu a
convenção de seu partido, o PDS. Tancredo Neves usou um cocar, ganhou as
eleições de 1984, mas morreu sem tomar posse. O mesmo aconteceu com o deputado
Ulysses Guimarães, que disputou e não se elegeu. A má sorte, segundo o folclore político, não vem do cocar,
mas das penas do pássaro de que é feito. Se a ave depenada tiver morrido, o
azar é maior ainda. Pelo sim, pelo não, o ex-presidente José Sarney nunca
aceitou ostentar o adereço indígena que lhe foi oferecido em diversas ocasiões.
Todavia Lula, Dilma e Bolsonaro não seguiram a recomendação dos antigos. Os
três, em diversas cerimônias, aceitaram usar o cocar e, apesar disso, foram
eleitos.
(Imagens: pinturas de Joaquin Sorolla y Bastida)
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