“O
que a ciência apresentou no século XX pode ser visto como uma imensa renovação
do antigo movimento copernicano, envolvendo agora a estrutura dos próprios
conceitos com os quais tentamos compreender a realidade – o que estamos
chamando, simplificadamente, de “dialeto newtoniano”. Dito de modo mais
incisivo: os conceitos convencionais de descrição da realidade não devem ser
considerados universais. Essa questão transcende o território restrito e
limitado do conhecimento técnico gerado pela física. Derrama-se, de fato, sobre
toda nossa construção racional do mundo. Entretanto, para a maioria dos
cientistas, a alternativa que está sendo sugerida – a descrição do mundo por
meio de um novo dialeto não newtoniano – ainda aparece hoje como uma alucinação,
um possível retrocesso a uma era não científica, com revalorização do
transcendental. Não se trata disso. A razão desta reação deve ser procurada no ‘orgulho
da espécie’, em que habita nosso profundo narcisismo.
Na
história da humanidade nos tempos modernos, Freud identificou três grandes
alterações, produzidas pela ciência, que diminuíram dramaticamente o orgulho da
espécie, com consequências profundas em nossa visão do mundo. São elas: 1. A
perda do “centro do mundo”, graças a Copérnico: a Terra se move em volta do
Sol; 2. A perda da “formação divina do homem”, graças a Darwin: as espécies se
modificam; 3. A perda da crença no poder completo da “razão”, graças a Freud:
nossos pensamentos têm raízes no irracional. Talvez devamos acrescentar uma
quarta dificuldade: a não universalidade do modo de descrever a natureza.”
(Novello, págs. 25 e 26)
Mario Novello, Quantum e Cosmos: introdução à metacosmologia
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