(Texto que originalmente publiquei na imprensa em 2009. Nada mudou em todos estes anos. Ao contrário, piorou)
Definindo o indefinível
O Brasil é um país tradicionalmente afeito às definições. No impasse, define-se uma nova política para isso e uma nova diretriz para aquilo, que muitas vezes acabam "esquecidas" e não são colocadas em prática. Tenta-se definir, detalhar e perde-se muito tempo olhando para as árvores, sem enxergar a floresta. É o que acontece, por exemplo, com o uso do termo desenvolvimento sustentável. A expressão, que passou a ser amplamente utilizada depois de sua divulgação através do Relatório Brundland, em 1987, foi incorporada ao vocabulário diário da sociedade. Mesmo assim (ou exatamente por isso), ainda é motivo de discussões acirradas. Alguns, de visão econômica mais intervencionista, defendem que a expressão é errada, que se trata de um oxímoro, já que "desenvolvimento", não pode ser sustentável, pois causa impactos econômicos e sócioambientais. Outros, mais entusiastas da "mão invisível do mercado", acham que o termo é aplicável a situações específicas, onde são contemplados os aspectos econômicos, sociais e ambientais.
Existem muitas definições do termo desenvolvimento sustentável e a
cada dia inventam-se novas. Enquanto avançam as discussões, calcadas em
posições ideológicas ou interesses econômicos, a Amazônia é transformada em
carvão e os rios em cloaca.
Enquanto isso...
É curiosa esta frequente utilização
do termo desenvolvimento sustentável por diversos agentes. Estes empregam a
expressão de olho nos benefícios para a sociedade, aqueles nos benefícios para
seus bolsos. Atualmente, um alienígena que chegasse a Brasília e que não
tivesse percorrido o País, conhecendo-o apenas através de determinada mídia,
teria a nítida impressão de não mais existirem grandes pendências econômicas,
sociais e ambientais a serem resolvidas e que estaríamos quase alcançando o
desenvolvimento sustentável (seja lá o que for isso). No mundo real, as coisas
são completamente diferentes. Vivemos em um país onde:
- A maioria das empresas luta diariamente
para sobreviver, tentando vender para um mercado consumidor que não se amplia e
cujo poder de compra vem gradualmente caindo;
- A questão ambiental na prática não
tem prioridade para os governos, fazendo com que órgãos legisladores e
controladores não tenham recursos para desempenhar suas funções;
- A questão social recebe o tratamento
que todos conhecemos: sistema de saúde desaparelhado, sistema previdenciário
sem recursos e justiça morosa.
Caindo na real
Desnecessário relacionar as mazelas
que todos conhecemos e com as quais convivemos ao longo de tantos governos.
Estamos todos, Governo, empresas, instituições e sociedade civil, muito longe
do desenvolvimento; mais ainda do sustentado (se é que existe em alguma parte).
A propaganda de grandes empresas e instituições, informando estarem praticando
o desenvolvimento sustentado, assemelha-se ao nosso costume de achar que basta
criar uma lei para resolver o problema e contentar a opinião pública. Na
moderna visão das ciências ambientais existe uma interdependência entre todos
os sistemas, soando anacrônico dizer que no espaço físico e social onde atua
determinada empresa é praticado o desenvolvimento sustentável, enquanto que à
sua volta grassa a estagnação econômica, a degradação ambiental e humana.
O tipo de desenvolvimento que
precisamos no momento é o que temos condições financeiras, sociais e culturais
de efetivamente programar: o "arroz com feijão", a geração de mais e
melhores empregos, a melhoria das condições sociais e o efetivo cumprimento da
legislação ambiental. Pode não ser tão sofisticado quanto o desenvolvimento
sustentado, mas pelo menos é o que deveríamos ter capacidade de programar em
pouco espaço de tempo. Quanto ao desenvolvimento sustentado, se efetivamente
for possível, este será uma conseqüência das boas práticas que utilizarmos nos
próximos anos.
(Imagens: fotografias de José Yalenti)
0 comments:
Postar um comentário