Jennifer Michael Hecht

terça-feira, 28 de outubro de 2025

 

“Que pensava Maimônides (filósofo medieval judeu) de Deus? Ele sabia que ‘alguns não reconhecem a existência de um Ser Superior’ e, ao contrário, acreditavam que ‘o estado atual de coisa resulta de uma combinação e separação acidentais dos elementos, não tendo o Universo nem Rei nem Governador’. Essas pessoas, diz ele, são ‘Epicuro com sua escola e filósofos similares’. Mas ele os descarta logo, com um aceno de mão ‘Seria supérfluo repetir as teses deles, pois a existência de Deus foi demonstrada’. Aristóteles estabeleceu-a, e já não há necessidade de preocupar-se com isso: alguém ou alguma coisa ‘pensou’ o mundo, dando-lhe o ser e o movimento. Para a história da dúvida, o ponto crucial aqui é que Maimônides conhecia bem Epicuro, o ateísmo, outros questionadores e a ideia de um mundo regido pelo acaso.

Maimônides foi um mestre da incerteza. Advogava a concepção aristotélica da eternidade do universo e ao mesmo tempo a criação bíblica ex nihilo, e no fim optou por silenciar respeitosamente sobre o assunto. Onde achou ele lugar para a criação bíblica? Aristóteles, explicava ele, baseou a sua conclusão numa analogia entre o mundo que conhecemos e o vasto universo que o tempo, o espaço e as nossas limitações conceituais nos deixam oculto. Não há razão para esperar que ambos sejam tão parecidos a ponto de se identificarem. Maimônides sustentava que Aristóteles estava apenas dando um palpite, coisa que escapou a muita gente. Não é comum que as coisas surjam do nada, mas talvez tenha sido o que aconteceu.”

 

Jennifer Michael Hecht (1965-), filósofa, historiadora, poeta e professora estadunidense em Dúvida, uma história – Os grandes questionadores e seu legado, de Sócrates e Jesus a Nietzsche e Einstein

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