"Black Friday", "vale-tudo" e "Lei de Gerson"
[...] tenho a fé abundante. Cheguei a acreditar até em banqueiros.
(Oswald de Andrade, 1943)
A promoção de vendas chamada de "Black Friday" é a data mais importante do comércio americano, sendo realizada toda primeira sexta-feira, logo após o feriado do Dia de Ação de Graças. Nesta data, todo o grande comércio dos Estados Unidos oferece altos descontos, fazendo com que se formem grandes filas de consumidores nas portas das lojas antes destas abrirem.
No Brasil, nos últimos anos, nossas redes varejistas também decidiram promover a data. Mas, como sempre acontece quando importamos alguma ideia ou costume, a este sempre se agregam características locais. Esta uma especificidade do imaginário cultural brasileiro, principalmente quando envolve transações: uma parte envolvida precisa sair-se melhor no negócio, tendo algum tipo de vantagem, que geralmente fere o princípio de equidade.
São provavelmente resquícios do desenvolvimento histórico-cultural brasileiro; do período em que o país era pilhado e explorado, quando valia apenas a vontade do mais poderoso e os injustiçados não tinham a quem recorrer. Há vários autores que dizem que ainda não nos livramos completamente deste tipo de mentalidade.
Pois bem. Decidiram fazer o "Black Friday" em Pindorama. E não poderia ter sido de outra forma: reclamações de consumidores, sobre a diferença entre os descontos anunciados e aqueles realmente oferecidos na hora da compra. O PROCON, segundo a imprensa, imediatamente notificou redes de grandes varejistas, exigindo esclarecimentos sobre a estranha promoção. Estão na lista empresas como: Extra, Ponto Frio, Submarino, Walmart, Fast Shop, Americanas.com e Saraiva.
O caso é tão grave, que o próprio organizador do evento, o site Busca Descontos, teve que eliminar 500 anúncios, comprovadamente por falsificação de preços. O fundador da empresa e dono da marca "Black Friday" no Brasil, Pedro Eugênio, afirma que o fato é "lamentável" e que a maquiagem de descontos por parte dos grandes varejistas "é um tiro no pé", já que com isto estas empresas estragam sua imagem junto ao consumidor.
A malandragem das empresas já ganhou apelido no Twitter e no Facebook, sendo chamada de "Black Fraude". O Procon afirma que os preços oferecidos durante o "Black Friday" já haviam sido oferecidos algumas semanas antes, em ofertas anteriores. "Os preços subiram para voltar a cair. Ou seja: praticou-se um falso desconto", afirma Carlos Coscarelli, chefe de gabinete do Procon-SP. Consultadas pela imprensa, as empresas autoras da suspeita promoção evidentemente negaram os fatos, com diversos tipos de desculpas - apesar do grande movimento em suas lojas e do bom lucro que tiveram.
Cabe perguntar quais outras providências o Procon tomará com relação a este fato, além de notificar os infratores e, eventualmente, tentar aplicar-lhes uma multa - contra a qual recorrerão com seus batalhões de advogados. Até quando ainda continuaremos o país do "vale-tudo" e onde a "Lei de Gerson" (cujo enunciado é: "tem que levar vantagem em tudo, certo?") é utilizada por muitos, sem que o Estado interfira efetivamente?
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