"Nossos espíritos, assim desenvolvem-se por pontos; e como os salpicos de graxa, os pontos se espalham. Mas nós os deixamos espalharem-se tão pouco quanto possível; mantemos inalterado, o mais que podemos, o nosso velho conhecimento, os nossos velhos preconceitos e as nossas velhas crenças." - William James - Pragmatismo e outros ensaios
Afirmam alguns autores que o
Brasil vive de costas para o seu interior. Por um lado esta afirmação começa a
ficar ultrapassada, com o rápido avanço para o Oeste nos últimos 50 anos.
Permanece, no entanto, o fato de que a maior parte da população brasileira
ainda se concentra numa faixa de terra, que não dista mais de 200 quilômetros
do mar. Apesar de seu extenso interior e da ocupação europeia há mais de meio
milênio, o Brasil ainda continua, em grande parte, estabelecido à beira mar.
As populações que se fixaram
no Brasil, chegaram a este território em épocas diferentes e basicamente por
dois caminhos. Os primeiros povoadores a chegarem, são descendentes dos povos
que adentraram ao continente americano há cerca de 15 mil anos, através do Alasca.
Entraram no território brasileiro provavelmente através da região amazônica e dali
se espalharam para o sul e para a costa. Seu deslocamento e a gradual ocupação
do território brasileiro demorou milhares de anos. Neste processo estes povos
espalharam a cultura de certos vegetais por regiões onde não existiam, e
ocupando o território batizaram os acidentes geográficos com nomes que
permanecem até hoje.
Os segundos povoadores, os
europeus, vieram através do oceano Atlântico. Navegantes, degredados e depois colonizadores,
chegaram com armas, ferramentas e algumas espécies de plantas, movidos pela
vontade de enriquecer. Enfrentavam meses de viagem pelo oceano, em condições
precárias. Talvez seja por isso que, cansados de tanta água e intimidados com
as serras e a floresta, preferissem se estabelecer ali mesmo, a poucos metros
do oceano.
Os primeiros grupos de
europeus a penetrarem as terras desconhecidas rumo ao interior do continente foram as entradas e as bandeiras.
Aventureiros pagos pelo estado português ou por grupos privados, planejavam
encontrar o ouro que os indígenas do litoral diziam existir terra adentro.
Circulavam histórias de um reino onde haviam montanhas do precioso metal,
provavelmente relatos deturpados do império inca, cujas fronteiras se estendiam
até a Bolívia e a Argentina. Antes da chegada dos europeus, já existia um
caminho utilizado periodicamente pelos índios, o Caminho do Peabiru, que saia da
costa atlântica na região de São Vicente e Cananéia e chegava a Cusco, no Peru.
Partindo do litoral, depois de passar
pelo planalto paulista e interior de São Paulo, por Foz do Iguaçú, pelo Paraguai
e a Bolivia, o caminho finalmente alcançava o território do então império inca,
no Peru. Chamado mais tarde pelos jesuítas de Caminho de São Tomé, o Peabiru
(na língua tupi, "pe" - caminho; "abiru" - gramado,
amassado) funcionava como uma rudimentar rota de trocas de produtos do litoral por
outros do interior do continente. Depois que os espanhóis passaram a dominar o
Peru, a febre do ouro arrefeceu entre os portugueses. A maior parte os novos
imigrantes - com exceção dos bandeirantes e dos habitantes de São Paulo - preferiu
fixar-se no litoral.
A diferente maneira de ocupação
do território pelos índios e portugueses - um embrenhado nos sertões e o outro
encastelado no litoral - também teve, entre outros, impactos ambientais. Formou-se
ao longo do tempo a ideia de que o sertão deveria ser dominado e explorado, já
que só abrigava índios, feras e moléstias, e apenas eventualmente mostrava suas
riquezas. A ideia da preservação só veio muito depois.
(Imagens: monumentos incas)
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