Notas rápidas (homenagem a G. C. Lichtenberg)

quarta-feira, 15 de abril de 2020




"Por mais que nelas se façam pregações, as igreja continuam precisando de para-raios."

(G. C. Lichtenberg) 




Narrativas políticas na era da pós-verdade


A batalha pela hegemonia do discurso político é constante. Todas as tendências procuram atrair a atenção do eleitor, cada uma com seu discurso. Em tempos de pós-verdade, o que vale não é fundamentar a narrativa em fatos e argumentos lógicos; procura-se ganhar a atenção e a concordância do receptor da mensagem apelando para sentimentos e crenças.

Constroem-se convicções através da repetição, sob diversas formas, da mesma mensagem, do mesmo conteúdo ideológico. Para provar uma tese que normalmente seria pouco aceitável, como por exemplo a intervenção militar no governo, apresentam-se informações sobre a “corrupção generalizada na política”. Este tipo de argumento apela diretamente ao sentimento de parte da população, que nos últimos anos foi soterrada por reportagens e dados sobre a corrupção no país, em suas diversas facetas.

Não que ela não tivesse existido ou não exista mais, mas é bastante provável que tenha diminuído. Além disso, a corrupção existe em todas as atividades humanas; na política como nos negócios, na religião como no futebol, nos esportes olímpicos como nas relações entre os países, na medicina como na polícia... Seria impossível intervir igualmente em todas estas áreas da atividade humana.

É difícil encontrar qualquer iniciativa onde, de uma forma ou de outra, não exista alguém tentando obter algum tipo de vantagem. Não só por ganância, o apego doentio ao ganho, mas também por sentimentos de inferioridade, vingança ou vontade de dominar sobre outras pessoas. Há situações, nas quais indivíduos ou grupos se envolvem em práticas ilícitas, convencidos de que esta atividade trará posterior benefício a muitos. Enfim, as possibilidades de atos humanos possíveis, abarcados na classificação de “corrupção”, são inúmeras. Não se trata somente de surrupiar recursos do Estado.

Assim, sob o argumento de que o país “não consegue se livrar dos políticos corruptos”, tese esta muitas vezes avalizada por depoimentos de supostos militares e magistrados, é defendida a ideia da “intervenção militar”. Detalhe: não se trata de um golpe político, segundo seus defensores. Planeja-se “apenas” a destituição de todos os políticos e a convocação de novas eleições no período de três meses (pergunto se a cassação de políticos incluiria também o poder Executivo ou se limitaria ao Legislativo?).

A aceitação desta narrativa, felizmente, está limitada a pequenos grupos, geralmente com pouco ou nenhum conhecimento da política. Trata-se, em muitos casos, de uma estratégia de grupos radicais, de modo a manter sua militância estimulada e marcar presença perante outras facções.  

(Imagem: G. C. Lichtenberg) 

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