"Hoje,
no entanto, com a economia global pós-2008 sendo mantida viva com o auxílio de
aparelhos, com o aumento de regimes autocráticos corruptos e de Estados-cartel
e com uma crise climática que assoma imponderável sobre nós, os cálculos de
longo prazo dos interesses poderosos deu lugar a formas mais imediatas de
enriquecimento. Eis o capitalismo-cassino à meia-noite, momento em que os
vencedores do dia começam a resgatar suas fichas. Como a economia global já não
oferece nenhuma perspectiva de longo prazo, uma última farra alucinada de
pilhagens está em curso ao redor do planeta. Fraturamento hidráulico, mineração
de remoção do topo de montanhas, corte raso de florestas tropicais para a
agricultura voltada à produção de biodiesel, prospecção de petróleo em águas profundas,
espoliação da vida selvagem, tudo avança junto com a devastação e o saque dos
recursos sociais e com a expropriação dos fragmentos restantes de bens comuns,
sejam eles a água potável, a vida natural ou os parques urbanos. É como uma
nova versão do programa de televisão dos anos 1960 Supermarket Sweep [Varredura de Supermercado], em que os
participantes recebiam um carrinho de compras e um certo limite de tempo para
agarrar freneticamente tudo de valor que houvesse dentro da loja." (Crary, págs.
36 e 37).
"A
civilização industrial moderna está prestes a incendiar o mundo. A erradicação
de formações sociais e comunidades está entrelaçada com a extinção do sistema
terrestre vivo de que os bens comuns humanos dependem. Vivemos agora o
capitalismo em sua fase terminal de terra arrasada. Em um contexto militar, essa
expressão significa a destruição de recursos essenciais à vida, de modo que a
população derrotada ou um exército inimigo em marcha sejam privados de seu uso.
Em um sentido mais amplo, a terra arrasada significa a redução de uma região
próspera a um estado de esterilidade e a perda de sua capacidade de regeneração.
Trata-se de uma terra depauperada e privada de água, com seus rios e aquíferos
envenenados, seu ar poluído e seus solos afligidos por secas e pela agricultura
química. O capitalismo de terra arrasada destrói tudo aquilo que permite que
grupos e comunidades busquem modos de subsistência autossuficiente, de
autogoverno ou de apoio mútuo. Isso acontece com extrema violência no Sul
global, onde a extração, o desmatamento e o despejo de substâncias tóxicas criam
lixões inabitáveis e cidades em que os pobres, desesperados, se tornam exilados
internos." (Crary, págs. 45 – 46).
Jonathan Crary (1951-), professor, ensaísta e crítico de arte americano em Terra arrasada: Além da era digital, rumo a um mundo pós-capitalista
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