"Encontramos aqui a grande função que a mente possui na escola (filosófica) de Nagarjuna, assim como em todas as escolas Mahayana: a realidade empírica é somente uma série de sucessivas ilusões, de imaginações, de idéias, que nossa mente cria incessantemente acima do infinito abismo do vazio universal." - Fernando Tola e Carmen Dragonetti - Sobre o vazio - um estudo sobre o niilismo budista
Em vários artigos publicados nesta coluna vimos tratando das condições das grandes cidades, situadas em países pobres e em desenvolvimento: expansão urbana fora de controle; alto impacto aos recursos naturais como ar, água e solo; e pouca oferta de serviços públicos. O mais grave problema, o entanto, é a falta de um planejamento regular, a ausência de políticas públicas que possam imprimir uma direção ordenada e controlada ao crescimento destas cidades.
A cidade de São Paulo é um exemplo desta falta de ordenamento urbano, em grande parte devido a seu próprio desenvolvimento histórico. Núcleo urbano afastado da costa, posto avançado do império português em meio ao sertão bravio, São Paulo permaneceu uma vila de alguns milhares de habitantes durante mais de trezentos anos. Foi somente na segunda metade do século XIX que a pequena cidade começou a ganhar importância, com o desenvolvimento da economia cafeeira do interior do estado. Desta época datam os primeiros ordenamentos urbanos e as primeiras intervenções do poder público, visando direcionar o crescimento e o funcionamento dos serviços da cidade. Mesmo assim, um primeiro planejamento – pelo menos no que se refere aos fluxos de transporte na cidade – só apareceu na década de 1930, durante a primeira administração do prefeito Prestes Maia (1938-1945).
Passou um longo tempo e o primeiro Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de São Paulo foi elaborado, em 1971, durante a administração Figueiredo Ferraz. O primeiro zoneamento urbano da cidade data de 1972, quando a cidade já ultrapassava os 6 milhões de habitantes. O Plano Diretor Estratégico do município só foi aprovado em 2002, durante a administração Marta Suplicy, tendo sido revisto em 2009. Percebe-se por mais este exemplo que planejamento nunca foi item de grande importância na administração pública brasileira. E o problema continua, mesmo com as administrações municipais de grandes cidades podendo contar com sofisticados mapas do município feitos por satélites, sistemas computacionais e modernos softwares para fazer diversos tipos de simulações.
O exemplo mais recente de falta de planejamento – além dos inúmeros casos com os quais deparamos a cada dia – é o caso da verticalização de diversos bairros da capital. Segundo declaração da urbanista Lucila Lacreta, da ONG Defenda São Paulo, publicada recentemente no jornal O Estado de São Paulo, a Prefeitura está aprovando uma série de empreendimentos e não vem levando em conta os impactos cumulativos destes. Ainda segundo a urbanista, a Secretaria da Habitação aprova determinados projetos e a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) outros. Todavia, não existe uma análise mais ampla do impacto destas iniciativas, assim como o planejamento do transporte público, com trens, ônibus e metrô, é esquecido.
O avanço dos projetos imobiliários em várias regiões da cidade está priorizando o transporte individual, o que deverá aumentar ainda mais os congestionamentos nestas regiões e com impactos no resto da cidade. Somente na Marginal do Rio Pinheiros, a construção de doze novos grandes empreendimentos deverá levar cerca de 50 mil veículos a mais para a região. Assim, apesar de toda a tecnologia disponível, o planejamento urbano continua sendo um dos grandes problemas de São Paulo. Por que por aqui é tudo tão difícil?
(Imagens: fotografias de Thomas Struth)
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