Áreas verdes nas cidades

sábado, 1 de agosto de 2020
"Não há meio mais eficaz para dominar a multidão do que a superstição."   -   Baruch Espinosa


Se até há algumas décadas a maior parte da população mundial vivia no campo, hoje a população urbana já ultrapassou a rural. No Brasil, o processo de migração das áreas campestres para as cidades ocorreu de maneira bastante rápida a partir dos anos 1940, quando se iniciou o processo de industrialização do país. Atualmente, as cidades brasileiras abrigam cerca de 85% da população. O rápido crescimento dos municípios, trouxe consigo outros aspectos relacionados com a urbanização. Neste artigo trataremos especialmente das áreas verdes e da arborização urbana.  

A quantidade mínima de área verde nas cidades, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), é de 12 m²/h (metros quadrados por habitante); o ideal seriam 36 m²/h. Das grandes cidades brasileiras, a que mantêm a maior área verde por habitante é Goiânia, com 94 m²/h. Vitória (91 m²/h) e Curitiba (64,5 m²/h) são outras duas metrópoles bastante arborizadas. São Paulo, com cerca de 12 milhões de habitantes, tem aproximadamente 16 m²/h, enquanto que Nova York, cidade com perfil parecido ao da capital paulista, com 8 milhões de habitantes, dispõe de 23,10 m²/h de área verde por habitante. Há que se observar que na maioria das cidades a distribuição das áreas verdes é desigual: regiões com poder aquisitivo mais baixo e as periferias geralmente são menos arborizadas, possuindo poucos parques públicos arborizados. Bairros que concentram populações com maior poder aquisitivo, historicamente tiveram melhor planejamento urbano, dispondo de avenidas e parques arborizados. A cidade de São Paulo é um exemplo típico deste fato.

Áreas verdes são importantes no espaço urbano. A ideia de equipar as povoações com áreas verdes para o lazer e deleite de sua população, remonta à Antiguidade. Ficaram famosos na história os relatos do historiador grego Heródoto (485–425 a.C.) sobre os jardins suspensos da Babilônia, considerados uma das sete maravilhas do mundo antigo. Concretamente, descobriu-se vestígios de tais jardins na ruínas da cidade de Nínive, construídas pelo rei assírio Senaqueribe (704-681 a.C.). Na história moderna foi Napoleão (1769-1821), imperador da França, quem no início do século XIX introduziu a arborização nas avenidas e nos jardins púbicos de Paris, prática mais tarde disseminada em todo o mundo, inclusive no Brasil, a começar pela então capital, Rio de Janeiro. Ainda no século XIX, em sua segunda metade, começaram a ser construídos parques públicos destinados principalmente ao lazer dos operários. Estes viviam em condições bastante ruins em bairros industriais de cidades como Londres e Nova York e os parques era a melhor opção de lazer ao ar livre que tinham. 
    
Para muitos administradores públicos, a arborização e os parques ainda são considerados ornamentos urbanos relativamente caros, por necessitarem de cuidados regulares, e porque parte da população não exige sua implantação. No entanto, está cientificamente provado, que as árvores têm importante papel na saúde física e mental dos habitantes. Uma cobertura vegetal planejada, pode reduzir a temperatura média de uma cidade, dependendo do relevo, entre 2º C e 8º C. Todos nós sabemos a diferença em precisar caminhar uma longa distância no verão, sob sol forte, através de uma rua arborizada, e por outra sem árvores. Quando plantada perto de edifícios, a vegetação chega a reduzir o uso do ar condicionado em até 30%.

A influência da cobertura vegetal no clima da cidade e nos microclimas dos diferentes bairros também é muito grande. Medições constataram que na cidade de São Paulo, a diferença de temperatura entre os bairros pode variar em até 14º C. Ao longo dos últimos 60 anos, com a remoção de parte da cobertura vegetal na zona urbana e em seu entorno, a umidade da metrópole caiu e a temperatura média subiu. Medições indicam que atualmente a umidade do ar da cidade é 7% menor do que na década de 1930. Já faz muito tempo que São Paulo deixou de ser chamada de “a capital da garoa”, como era conhecida até o começo dos anos 1970.  

No que se refere à melhoria da qualidade do ar, uma árvore de porte pode absorver anualmente até 150 kg de dióxido de carbono. No site LastTrop (http://esalqlastrop.com.br/capa.asp?pi=calculadora_emissoes) encontra-se uma tabela, através da qual é possível calcular o número de árvores que deveriam ser plantadas, para compensar as emissões anuais de diversos tipos de veículos automotores. Além de incorporar o dióxido de carbono, as árvores também filtram o ar retendo poluentes, inclusive particulados liberados pela queima do diesel.

Pesquisas realizadas nas últimas décadas revelaram que em áreas arborizadas moradores e transeuntes sofrem menos de ansiedade. Inconscientemente, segundo os psicólogos, o ser humano se sente inseguro em largos espaços livres sem árvores, como são certas praças das nossas cidades. Nossos antepassados distantes, caçadores e coletores, davam preferência às paisagens com árvores, onde encontravam abrigo contra predadores, alimento e água. Estudos realizados em cidades americanas constataram que, em geral, bairros mais arborizados têm um índice de violência mais baixo, em comparação com outras áreas urbanas com pouca vegetação. 

Outro detalhe, muitas vezes esquecido por empresas incorporadoras, imobiliárias e planejadores urbanos, é que terrenos e casas localizados em áreas arborizadas, alcançam um valor de venda mais alto. Administrações públicas deveriam sensibilizar proprietários e usuários de imóveis em áreas centrais, para que valorizem e protejam as árvores plantadas em seus bairros, muitas vezes em frente aos seus prédios de apartamentos residenciais e suas lojas.

A crise climática provocada pelo gradual aquecimento da atmosfera aumentará inevitavelmente ao longo das próximas décadas, segundo os cientistas. No momento, pelo menos no Brasil, o tema não está sendo tratado, por causa da crise gerada pela pandemia do coronavírus e devido ao negacionismo climático do atual governo. Mas, sabemos que ambos passarão e em pouco tempo teremos que voltar a nos ocupar mais intensamente com o fenômeno climático.

A Organização da Nações Unidas (ONU) afirma que há necessidade de plantio de cerca de um trilhão de árvores em todo o planeta, ao longo dos próximos anos, a fim de compensar em parte o efeito das emissões de gases. Assim, toda a cidade, em qualquer parte do mundo, será convocada a dar sua contribuição, aumentando o número de parques e ampliando a arborização urbana.  

(Imagens: pinturas de Hans Hofmann)

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