Notas rápidas (homenagem a C. G. Lichtenberg)

sábado, 22 de agosto de 2020

                                                             

                 



"Um túmulo é sempre a melhor fortaleza contra as tempestades do destino."

(C. G. Lichtenberg, Aforismos)              


Cultura e democracia 


Ao mesmo tempo em que escrevíamos este texto, o governo já havia anunciado que no orçamento da União de 2021 planeja aumentar os recursos do Ministério da Defesa, ao mesmo tempo em que reduzirá as verbas da Educação e da Saúde.

A Reforma Fiscal planejada pelo governo, fará com que os livros, que são isentos de tributos, paguem 12% em impostos. Consultado, o ministro da Economia Paulo Guedes comentou que a atual isenção de impostos para os livros “beneficia quem poderia pagar mais impostos” – como se apenas os ricos fossem leitores.

A Cinemateca Brasileira, localizada em São Paulo e contendo o maior acervo de filmes e imagens da América do Sul está fechada. Não dispõe de recursos nem para a manutenção do prédio e a conservação do material. Os funcionários foram dispensados e o governo federal não assumiu sua administração, ainda que o tenha prometido anteriormente.

Apesar do Estado brasileiro declarar assegurar liberdade religiosa a todo o cidadão desde a Constituição de 1891 (“todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum”), são constantes os atos de desrespeito da Constituição. Tornaram-se comuns os casos de perseguição aos fiéis das religiões afro-brasileiras por parte de membros de cultos cristãos fundamentalistas. Em muitos casos umbandistas e candomblecistas são forçados a esconder sua crença, seja no bairro onde moram ou nas redes sociais, para não serem achincalhados ou hostilizados. No país do “Deus acima de todos”, certo tipo de fiel parece se achar mais perto da divindade do que os de outras religiões. O poder público, quando confrontado com tais fatos, reage apenas quando a agressão chega à imprensa.

A divulgação de fake news, as notícias falsas, são disseminadas por redes de grupos organizados especificamente para este fim: desinformar e confundir parte da população menos esclarecida. Não faltam ataques a políticos e membros do STF, personalidades, artistas; afrontas contra a China e ONGs, a rede Globo e a imprensa em geral. Pululam as falsas terapias para a cura do covid, ataques às vacinas de todos os tipos, e muito mais. Prolifera também a divulgação de supostos projetos governamentais em andamento, baseados em dados e imagens inverídicas. Centrais de disseminação de notícias falsas transformaram as mídias sociais em terra de ninguém, onde grande parte dos relatos são inverídicos, semeando a ignorância e a intolerância.

Recentemente, um grupo de radicais de direita se intitulando religioso, tentou impedir um aborto autorizado pela Justiça, realizado por uma equipe médica em uma menina de dez anos, que havia sido estuprada. Atacando a criança aos gritos na frente do hospital onde estava internada, e tentando invadir o local, os fanáticos foram desalojados por membros do Fórum de Mulheres de Pernambuco. O objetivo político daqueles que estão por trás deste movimento é, evidentemente, criar condições jurídicas e influenciar a opinião pública para que a discussão da descriminalização do aborto não ocorra.

Sinais dos tempos. Parece diminuir a valorização do conhecimento, da cultura, da tolerância, da liberdade e da democracia. Nunca, em nenhum período da história brasileira a aversão à cultura, ao conhecimento, à ciência (e à discussão de suas teorias) foi tão incisiva e até estimulada. Cresce uma visão deturpada do que é a liberdade individual (“por que sou obrigado a usar a máscara contra a covid?”) e a democracia (“posso falar o que quero de quem quero!”), associadas a um moralismo de fachada (“vamos valorizar a família!”) e rigorista.

                

0 comments:

Postar um comentário