Lourenço
Carlos Diaféria nasceu em São Paulo
(SP) a 28 de agosto de 1933 e morreu na mesma
cidade em 16 de setembro de 2008. Foi jornalista, cronista e contista
brasileiro.
Diaféria
começou seus estudos de jornalismo na Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero,
transferindo-se depois para a Escola de Comunicação e Artes (ECA), da Universidade
de São Paulo USP.
Iniciou
sua carreira jornalística em1956, no jornal “Folha da Manhã”, atual “Folha de São
Paulo”.
Como cronista o início foi mais tardio, em 1964, quando escreveu seu
primeiro texto assinado. Permaneceu no periódico paulista até o ano de 1977, quando foi preso
pelo regime militar devido ao conteúdo da
crônica Herói. Morto. Nós. ,
considerada ofensiva às Forças Armadas. A crônica comentava
o heroísmo do sargento Sílvio Delmar Hollenbach, que pulou em um
poço de ariranhas no zoológico de Brasília, para salvar a
vida de um menino que estava sendo atacado pelos animais. A criança se salvou,
mas o militar morreu, vencido pela voracidade dos animais. A crônica também
citava o duque de Caxias, o patrono do Exército,
lembrando o estado de abandono de sua estátua no centro da capital de São
Paulo, próximo à Estação da Luz. Para defender-se Lorenço Diaféria
contratou o criminalista Leonardo Frankenthal, sendo considerado
inocente em 1980.
No dia 16 de setembro de 1977, a Folha publicou a coluna de Lourenço
Diaféria em branco. Leia a crônica que provocou a cadeia de Diaféria pela
ditadura em sua íntegra no link abaixo:
https://www1.folha.uol.com.br/folha/80anos/tempos_cruciais-02a.shtml
Deixando
o jornal “Folha de São Paulo”, Diaféria passou a escrever suas famosas crônicas
no “Jornal da Tarde”, no “Diário
Popular” e no “Diário do Grande ABC”, além de quatro
emissoras de rádio e a Rede Globo.
Católico
atuante, Diaféria escreveu A
Caminhada da Luz, livro sobre o cardeal-arcebispo de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, grande defensor dos
perseguidos pela ditadura civil-militar (que vigorava na época), a quem Diaféria
admirava. A outra "religião" do jornalista era o futebol,
e várias de suas crônicas – assim como o jornalista/escritor Nelson Rodrigues –,
tratavam deste esporte. Seu time do coração era o Corinthians.
Enfrentando
problemas cardíacos desde o início de 2008, Diaféria morreu de um infarto do
miocárdio aos 75 anos, deixando viúva (Geíza), cinco filhos e três netos.
As
crônicas de Diaféria marcaram época na imprensa paulista. Em 1976 ficou famoso
em todo o mundo o caso do mágico israelense Uri Geller, que dizia poder
entortar colheres apenas com a força da mente (capacidade que anos depois foi
provada como sendo uma farsa). Quando se apresentava em programas de auditório, os anúncios diziam “não se esqueçam de levar objetos de metal, como garfos e
colheres, e também relógios enguiçados”. No entanto, para Diaféria, os
problemas reais – que não estavam sob controle da população – não seriam
facilmente resolvidos sem
atitudes efetivas nem
com o “poder da mente”, como
fazia a figura midiática. Assim, em 17
de julho de 1976, a “Folha de São Paulo” publicou a crônica Quem está torta não é a colher. É a situação,
assinada por Diaféria. No texto, as
questões sociais e
econômicas emergem a
partir de problemáticas rotineiras:
Entortar colher e garfos? Ora, minha senhora,
isso é fácil.
Difícil é viver com salário mínimo.
Difícil é saber em quem votar nas próximas
eleições.
Difícil é descobrir onde está o governador.
Difícil é prever quando vai terminar a
censura.
Difícil é informar quando será o próximo
aumento da gasolina.
Difícil é arranjar a solução para o problema
da habitação popular.
Difícil é atravessar a Avenida 23 de Maio na
hora do “rush”.
Difícil é melhorar o nível do ensino nas
escolas.
Difícil é evitar fraudes nos vestibulares e
nos exames supletivos.
Difícil é saber quando o leite não está
contaminado.
Difícil é levantar a moral da torcida.
Difícil é fazer andar a burocracia nas
repartições públicas.
Difícil é endireitar as filas da Previdência
Social.
Difícil é informar quem vai ganhar a corrida
armamentista,
Difícil é saber quando será o próximo aumento
do dólar.
Difícil é garantir onde vai parar esta
inflação.
Difícil é tomar água mineral sem susto e sem
preocupações.
Difícil é desentortar o país.
Difícil é contar a verdade ao telespectador.
Difícil é aceitar criticas e sugestões.
Difícil é ter de sorrir.
Difícil é ter de enfrentar o supermercado e a
feira-livre.
Difícil é conseguir poupança para botar na
caderneta.
Difícil é ter de concluir que nada mudou na
casa do Joca.
Difícil
é a gente
ter de continuar
confiando no futuro,
porque no presente já não dá
mais.
Difícil é viajar nos trens de subúrbio às 6
da manhã.
Difícil é falar aos
filhos oque realmente
pensamos a respeito
disto e daquilo.
Difícil é arrumar um garfo e uma colher que
já não estejam tortos.
Difícil é conseguir o que pegar com o garfo e
a colher.
Difícil é obter um relógio funcionando.
Difícil é consertar a telha quebrada em cima
do barraco.
Difícil é desentortar a folha de zinco da
favela.
Difícil é ajustar as antenas do povo.
Difícil é transformar o branco-e-preto da
vida num programa em cores.
Difícil é a gente ter de se mancar diante
disso que está aí.
Difícil é o povo só ser consultado pelo homem
do Ibope.
Difícil (e espantoso) é observar que existem
tantos relógios parados, há tanto tempo, na casa de tanta gente.
Ou seja: se não somos sequer capazes de
acertar os ponteiros do relógio, imaginem o resto.
Principais
obras de Lourenço Diaféria:
Um gato na terra do tamborim (1976);
Berra, coração (1977); Para uma garota de quinze anos (1977) Circo
dos Cavalões (1978); A morte sem
colete (1983); O Empinador de
Estrelas (1984); A longa busca da
comodidade (1988); O invisível
cavalo voador – Falas contemporâneas (1990); Os gatos pardos da noite; Coração
Corinthiano; (1992); Papéis íntimos
de um ex-boy assumido (1994); O
imitador de gato (2000); Brás –
Sotaques e desmemórias (2002); A
caminhada da esperança (1996).
Frases
de Lourenço Diaféria
“As coisas banais não significam coisas
desimportantes. São apenas coisas
que nunca chegam
às manchetes da
imprensa e ao
horário nobre da televisão”;
“Sou um artesão de variedades, um falso
cômico de entreato,
mas levo uma desvantagem em relação aos palhaços. Não
tenho direito de usar a máscara da pintura. Não posso esconder o meu riso, e
não posso esconder o meu choro. Tenho de aparecer aqui –franqueado, aberto,
inteiro. Em cada linha, em cada letra, em cada sinal, eu me traio e eu me
entrego e eu me jogo, como
se lança no
ar o trapezista
no seu salto
triplo cotidiano. Sem rede.”;
“Tenho a impressão de que a urbe
existiu, concreta e palpável, quando a cidade de São Paulo tinha no máximo uns
3 milhões de habitantes, havia o chá das 5 no Mappin Stores e passava trem na
atual rua dos Trilhos. No tempo da urbe todo trabalhador civilizado usava
paletó, calça comprida, gravata, camisa social e chapéu para ir fazer compras
ou passear no Centro. Quem não tinha roupa adequada ficava no bairro.”;
“E este é o
nosso grande remorso: o de fazer as coisas urgentes e inadiáveis - tarde demais.”;
“O cronista precisa fingir que faz crônicas
por divertimento e que trabalha por não ter o que fazer.”;
“Real ou imaginária, a memória do escritor é
matéria-prima para criar a vida e as memórias alheias.”.
(Fontes consultadas: Wikipedia; Texto: “A crônica e o jornal: Lourenço Diaféria na Folha de São Paulo”, de Kelly Yshida; Temporalidades –Revista de História, ISSN 1984-6150, Edição 25, V. 9, N. 3 (set./dez. 2017); Portal Citações e Frases Famosas; Portal Folha 80 Anos – Tempos cruciais; Portal KD Frases)
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