Um
dos campos que mais deverá preocupar o novo governo, seja por sua importância
para o país quanto para a comunidade internacional, é o setor do meio ambiente.
Nesta área o governo Lula deverá retomar muitas iniciativas praticamente
paralisadas, como a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS), criada durante seu governo anterior, em 2010. Trata-se da correta
gestão e destinação dos resíduos sólidos urbanos, o lixo doméstico, através de
processos de reciclagem, destinação final em aterros sanitários e,
eventualmente, incineração para geração de energia. A política deve ser
implementada a nível municipal, através da cooperação entre a administração
pública e a comunidade, as empresas e organizações de catadores. A PNRS poderá incorporar
também os mais recentes conceitos e práticas da economia circular, já utilizada
por empresas de setores de ponta.
Outra
área que precisará voltar a receber maior atenção do Estado é a do saneamento;
o tratamento da água e do esgoto doméstico, que recebeu poucos investimentos
nos últimos oito anos. Grandes investimentos em saneamento foram feitos através
do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC 1 e 2), um ambicioso programa de
expansão da infraestrutura que também incluía outros setores, como transportes,
energia e telecomunicações, durante o segundo governo Lula e governos Dilma. Os
recursos se tornaram escassos, diminuiu o número de obras e durante o governo
Temer o programa foi praticamente descontinuado. Como alternativa, previa-se
atrair a atenção do setor privado, que depois da aprovação do Marco Legal do
Saneamento em 2020 poderia participar na implantação e operação dos serviços de
saneamento nos municípios. No entanto, a crise econômica e mudanças ainda previstas
na lei, dificultaram a participação das empresas até o momento. Espera-se que
no novo governo, com recursos novamente disponibilizados pelo BNDES, Caixa
Econômica, e agora contando com o aporte de fundos privados, o setor possa
retomar o crescimento. Aspecto importante é que a nova administração estabeleça
um programa com metas, recursos e prazos, a exemplo do que acontecia no PAC,
nos governos PT.
Outro
aspecto importante é a retomada de um controle e planejamento ambiental mais
efetivo, tanto a nível federal, quanto estadual. A drástica redução dos
recursos destinados às agências ambientais, tanto o federal Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), quanto
os órgãos de controle ambiental estaduais, como a Companhia Ambiental do Estado
de São Paulo (CETESB), o Instituto Estadual do Meio Ambiente (INEA), do Rio de
Janeiro, entre outros, fez com que diminuíssem as atividades de comando e
controle ambiental. Não foram poucos os casos, principalmente no órgão federal
(IBAMA), de ingerência política, demissão e transferência de funcionários,
corte de verbas para diversas atividades de planejamento e fiscalização, além
da nomeação de pessoas sem qualificação na área para cargos de chefia, segundo
técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU). Enfim,
será necessário reorganizar o quadro de funções e de funcionários da maior
parte destas agências, destinando-lhes recursos para treinamento, compra de
equipamentos, a fim de retomar e implantar os programas de planejamento e
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Uma
tarefa complexa mas indispensável, já que o país como um todo – tanto a nível
municipal, estadual quanto federal – precisará atualizar e aprimorar as ações
de comando e controle, a fim de fazer frente às novas práticas em relação ao
meio ambiente, já previstas e praticadas por parte do setor privado e exigidas
pelos diversos acordos internacionais.
Na
área urbana o governo precisará retomar iniciativas já estabelecidas, mas parcial
ou completamente abandonadas, como a identificação e remediação de áreas
contaminadas e o controle de emissões veiculares. O estado e a cidade de São
Paulo especialmente, através de sua agência de controle ambiental (CETESB), já
estão bastante avançados em ambas as áreas. No entanto, programas semelhantes,
principalmente os de controle de emissões veiculares, precisam ser expandidos
para todas as outras regiões do país.
Ações
de avaliação, planejamento e controle terão que ser implementadas nos diversos
biomas brasileiros, principalmente a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal, onde a
degradação ambiental provocada por atividades econômicas legais e ilegais se
acentuou bastante nos últimos anos. As estatísticas comprovam que, no que se
refere especialmente à Amazônia, o desmatamento tem crescido vertiginosamente
no governo Bolsonaro, através da invasão, desmatamento e ocupação de áreas
públicas e reservas indígenas, feitas pela grilagem e pelo garimpo ilegal. Ocorrências
recentes na Amazônia, como o assassinato do indigenista brasileiro Bruno
Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, tornaram pública a degradação
ambiental e social a que vêm sendo submetida a região amazônica, devido à falta
de fiscalização e policiamento. Assassinatos de líderes rurais, líderes indígenas
e trabalhadores se tornaram comuns, numa região marcada pela violência, com
atividades de pesca ilegal, extração de madeira, tráfico de drogas, contrabando
de ouro e pedras preciosas. O Estado que sempre esteve pouco presente na
região, tornou-se mais ausente ainda, já que a estratégia para o território é
incorporá-lo à economia do capitalismo periférico do restante do país,
explorando os recursos naturais extensa e intensivamente. Os povos indígenas, de
acordo com a orientação do governo, deveriam ser paulatinamente integrados à
sociedade de consumo. O índio, segundo o presidente Bolsonaro “quer internet e
explorar a terra dele”, querem ser vistos como “pessoas iguais a nós” e
“trabalhar e pagar imposto”.
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O
novo governo, que presumidamente será o de Lula, terá de se ocupar
intensivamente com a questão amazônica. Além de ser considerada uma das regiões
do planeta de grande impacto na manutenção do clima – os desmatamentos e as
queimadas contribuem para a emissão de metano e dióxido de carbono, gases
causadores do efeito estufa – a floresta funciona como provedora de chuvas para
grande parte da América do Sul, através do processo de evapotranspiração. Os
chamados “rios voadores”, formados por nuvens que carregam a água liberada
pelas árvores da floresta, abastecem com chuva grandes áreas das regiões
Centro-Oeste, Sudeste e Sul (além do Paraguai, Uruguai e Argentina),
responsáveis pela produção de parcelas consideráveis das commodities agrícolas e demais alimentos colhidos nessas regiões. A
floresta amazônica também é o habitat
de centenas de milhares de espécies vegetais e animais, além de ambiente vital para
milhões (bilhões?) de espécies de microrganismos com diversas funções em seus
ecossistemas; muitas delas ainda ignoradas pela ciência.
Em
suma, a questão ambiental deverá ser tratada com muito mais atenção e
responsabilidade do que vinha sendo feito. Apesar de todas as dificuldades, se
bem conduzido, o tema do meio ambiente poderá trazer grandes benefícios para o
país. Seja através da recuperação e proteção dos recursos naturais, da pesquisa
científica e da melhoria do nível de vida dos 30 milhões de amazônidas, como o
uso renovável das riquezas naturais da região, através dos mais diferentes
tipos de atividades econômicas. A pressão que as mudanças climáticas estão
exercendo sobre as sociedades e a economia global faz com que países,
instituições, empresas e investidores se apresentem como parceiros
capitalizados no desenvolvimento e implantação de projetos de preservação,
pesquisa e exploração econômica renovável.

Esta
a grande oportunidade que no passado recente o país não teve tempo de usufruir
e que no atual governo foi ignorada. Para isso, é preciso retomar as
iniciativas que tiveram início nos anos 1990 e que fizeram do Brasil um dos
mais importantes interlocutores e atores no mundo, no que se refere à questão
ambiental. Possuímos um dos maiores estoques de recursos naturais do planeta e assumimos
o firme propósito de utilizá-los de maneira sustentável, através de crescente
desenvolvimento e incorporação de tecnologia.
(Imagens: pinturas de Maximilien Luce)