Léon Bloy

sábado, 16 de setembro de 2017
"Não acredite em tudo que falam dos outros, nem em tudo do que falam de si."  -  Ricardo E. Rose

(Texto publicado originalmente na página da Academia Peruibense de Letras no Facebook)

Em sua primeira homilia, em março de 2013, o papa Francisco I citou um escritor católico já bastante esquecido, mas que entre o final do século XIX e início do XX causou bastante furor no meio católico francês. Disse Francisco em sua primeira mensagem aos católicos: "Quando não se professa Jesus Cristo, eu retomo a frase de Léon Bloy: 'Quem não reza a Deus, reza ao diabo.'"

Léon Bloy nasceu na pequena cidade de Notre-Dame-de-Sanilhac, na Dordonha, região Sudoeste da França em 1846 e faleceu em Paris em 1917. Novelista, ensaísta, jornalista e poeta, Léon era filho de um livre-pensador e de uma católica devota. Fez seus estudos em um colégio interno católico, mas era aluno medíocre e indisciplinado. Aproveitava o tempo livre no internato para estudar pintura e ler os autores famosos de sua época; Baudelaire, Villiers de L'Isle-Adam, Huysmans, Barbey d'Aurevilly, entre outros. Léon era agnóstico e tinha aversão pelos ritos e pela doutrina católica, preferindo suas leituras, que evocavam outras ideias.  

Terminando o colégio vai para Paris onde continua os estudos de pintura e aprofunda sua cultura literária. Certo dia, em uma livraria, conhece o escritor Barbey d'Aurevilly, que se torna seu tutor intelectual e por influência do qual tem uma dramática conversão ao catolicismo.

Depois de atuar como soldado na guerra franco-prussiana (1870-1871) - da qual trará muitas recordações dramática - volta a Paris, onde começa carreira jornalística e publica as sua primeiras obras literárias. Sempre passando por dificuldades financeiras, Bloy muitas vezes teve que contar com a caridade de amigos e até estranhos, aos quais pedia recursos através de cartas. Amigo de intelectuais e escritores, contribuiu na conversão ao catolicismo de alguns deles, como o escritor Huysmans, o pintor Rouault e o filósofo Maritain. Por outro lado também era bastante temperamental e atacava autores contemporâneos como Victor Hugo, Emile Zola, Guy de Maupassant, Ernest Renan e Anatole France, que se tornaram seus inimigos.

Apesar de relativo sucesso literário e da fama como polemista em defesa do catolicismo, contra o laicismo e o agnosticismo que se espalhavam no mundo intelectual francês do final do século XIX e início do XX, Bloy foi pobre durante toda a sua vida. Em 1890 casa-se com a dinamarquesa Jeanne Molbeck que lhe dá três filhos; dois dos quais morrem em consequência de desnutrição. Mesmo assim, continua escrevendo e publicando sua obra ensaística e, principalmente seus diários.

Visionário e movido por sua fé, Bloy foi ao mesmo tempo um grande escritor e agitador religioso. Acreditava em aparições da Virgem e estava convencido do fim dos tempos, caso a humanidade não se reformasse. Seu estilo influenciou diversos autores em todo o mundo. Escritores como George Bernanos, Loius-Fernand Céline, Ernst Jünger, Jorge Luis Borges, Graham Greene, Aleijo Carpentier, além dos brasileiros Ronald Carvalho, Alceu Amoroso Lima (Tristão de Atayde), Jorge Lima, Murilo Mendes, Augusto Frederico Schmidt e Gustavo Corção, todos incorporaram algo daquele que a si mesmo chamava de "mendigo ingrato" e "peregrino do absoluto". O escritor e ensaísta Octavio de Faria (1908-1980) escreveu um longo ensaio sobre Bloy, publicado em 1968.

Das principais obras do escritor destacam-se as novelas "O Desesperado" (1887) e "A mulher pobre" (1897); os ensaios "O sangue do pobre" (1909), "A alma de Napoleão" (1912) e "Joana d'Arc e a Alemanha" (1915); contos como "Suando sangue" (1898) e "Histórias desagradáveis" (1894). Os escritos que mais lhe trouxeram fama foram os seus diários, dos quais destacamos "O mendigo ingrato" (1898), "O invendável" (1909) e o "Peregrino do Absoluto" (1914). Inédito no Brasil, Bloy teve um livro lançado em 2017, "Nas Trevas" (1917). Abaixo apresentamos citações de várias das obras do autor:

"O maior mal não é cometer crimes, mas falhar em fazer o bem que se devia ter feito"

"Somos todos miseráveis e derrotados, mas poucos são capazes de encarar o próprio abismo."

"Existem partes do coração que ainda não existem; o sofrimento tem que entrar para que possam existir."

"O sofrimento passa, mas o fato de haver sofrido nunca passa."

"Qualquer cristão que não é herói, é um porco."

"A única tristeza real, o único grande fracasso, a única grande tragédia na vida, é não se tornar santo."

"Chegamos a esse formidável e absolutamente estranho momento, em que Deus tendo sido expulso de toda parte, faz com que nenhum homem saberá mais para onde ir." 

"Um santo pode cair na lama e uma prostituta pode ascender à luz."

"O excesso é um defeito."

"Devemos criar uma cátedra para ler nas entrelinhas."

"Eu sou naturalmente triste, como alguém é pequeno ou loiro. Eu nasci triste, profunda e terrivelmente triste, e dominado por uma imensa saudade da alegria."

"É notável que em uma época onde a informação se tornou a mestra do mundo, não se encontre mais ninguém que traga às pessoas uma mensagem de seu Criador. Este está ausente: das cidades, dos campos, das montanhas e das planícies. Ele está ausente das leis, da educação e dos costumes. Ele está ausente mesmo da vida religiosa, no sentido de que todos aqueles que ainda querem ser Seus amigos íntimos, não precisam mais de Sua presença."

"Eu sou um contemporâneo dos últimos humanos da decadente Antiguidade e por isso muito estranho a tudo aquilo posterior à Queda de Bizâncio. O ser humano é tão sobrenatural que, aquilo que ele menos compreende, são as concepções de tempo e espaço."

"Não seria possível juntar toda a miséria, toda tristeza e sofrimentos dos pobres em uma trouxa, em uma cesta? Teríamos as histórias de Deus."
(Imagem: fotografia retratando Léon Bloy) 

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