Leituras diárias

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024


 

“Sem entrar em discussão — uma discussão ociosa — se sou ou não sou o mesmo que era há vinte anos, é indiscutível, parece-me, o fato de que aquele que sou hoje provém, por uma série contínua de estados de consciência, daquele que eu era em meu corpo há vinte anos. A memória é a base da personalidade individual, assim como a tradição é a base da personalidade coletiva de um povo. Mais de uma vez foi dito que todo homem infeliz prefere ser quem ele é, mesmo com suas desgraças, a ser outro sem elas. E é que os homens infelizes, quando mantêm a sanidade em sua desgraça, ou seja, quando se esforçam para perseverar em seu ser, preferem a desgraça a não existência. Posso dizer sobre mim que, quando era jovem, e mesmo quando era criança, as pinturas patéticas do inferno não me comoviam, pois desde então nada me parecia tão horrível quanto o próprio nada. Era uma fome furiosa de ser, um apetite de divindade, como nosso asceta disse.” (Unamuno, pág. 12-13) 

 

Miguel de Unamuno, Do sentido trágico da vida

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