Apagão e acesso à informação

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
"Darwin nos ensinou que mudanças evolutivas aparentemente teleológicas e a produção de características adaptativas são apenas o resultado de evolução variacional, que consiste na produção de grande quantidade de variação a cada geração e na sobrevivência probabilística daqueles indivíduos que restam após a eliminação dos fenótipos menos adaptados. A adaptação, assim, é um resultado a posteriori, e não busca a priori de uma meta." 
 -  Ernst Mayr  -  Biologia, Ciência Única. 

Não demorou muito, apesar das negativas do governo, e o apagão voltou. O maior deles afetou grande parte do nordeste, deixando durante algumas horas mais de 40 milhões de pessoas às escuras. Depois do ocorrido, como já observado em casos anteriores, sucedem-se quatro fases de tratamento do assunto. Em uma primeira etapa, como sempre acontece, o governo negará o óbvio e dirá que não se trata de um apagão ou "blackout". Valendo-se de eufemismos, classificará o incidente como "falta temporária de energia", "interrupção temporária do fornecimento de energia", e expressões parecidas.
A próxima etapa é quando o fato é noticiado na imprensa. A tática recomenda que se diga que a pane energética está sendo investigada e que em alguns dias um porta-voz informará o que efetivamente ocorreu.
Em uma terceira fase ocorrem as especulações sobre o que pode ter realmente ocorrido; especialistas são chamados a opinar; empresários manifestam críticas à política energética. Políticos da oposição desfiam um rosário de acusações. O povo, a quem o governo deve uma explicação clara e acessível – já que é ele quem paga as altas contas de energia e vota nos políticos responsáveis em gerir o sistema elétrico brasileiro – este não se manifesta. Como sempre, permanece alheio em relação aquilo que fazem seus representantes e como aplicam o dinheiro dos impostos. Como resposta do governo - pelo menos nesta terceira fase - o ministro das Minas e Energia declara que o sistema de distribuição de energia brasileiro é "o mais seguro do mundo", frase ironizada até pela revista inglesa "The Economist". Declarações deste tipo, dadas por um servidor público, são no mínimo inconvenientes, quando não desrespeitosas.
A quarta fase é quando surgem as sucessivas versões, apresentadas pelo governo, como causa do apagão. Inicialmente, segundo o secretário-executivo da Minas e Energia, Márcio Zimmermann, o mais recente apagão fora causado por um "cartão de proteção".
Este "cartão", segundo o secretário, falhou e emitiu um sinal errado que induziu à falha dos disjuntores, provocando o desligamento do sistema. Transcorrem os dias e se sucederam as versões sobre as causas do acidente. Até o momento, parece ainda não existir um consenso sobre o que realmente ocorreu. O portal PCH, especializado em energia, informa, por exemplo, que até hoje ainda não se sabem exatamente as causas do apagão de 2009. Será que neste caso de 2011 acontecerá o mesmo?
A situação confusa não é inédita, como se vê. No entanto, reflete a maneira ainda autoritária como são tratados determinados assuntos pelo governo; negação, ironia e declarações evasivas. É isto que se acompanha nestas quatro fases de tratamento da "crise do apagão". O povo, todavia, tem direito a receber respostas claras dos gestores do sistema elétrico. A Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, agência reguladora do sistema elétrico brasileiro com função fiscalizadora, tem o dever de verificar o que efetivamente provocou mais este apagão. Deve informar a população e tomar providências para que tais crises não mais se repitam, ou que pelo menos se trabalhe para que possam ser evitadas no futuro – apesar do nosso sistema elétrico ser o mais seguro do mundo, como afirma o ministro Lobão.
(imagens: Roy Lichtenstein)

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