Mudanças climáticas e o litoral de São Paulo (1ª parte)

sábado, 29 de junho de 2019
"Como marinheiro que tem padecido tantos naufrágios, sei que nunca estes estão mais certos que quando menos se teme a tempestade."   -   Padre Antonio Vieira   -   Carta a d. Teodósio de Melo, Vila Franca, 20 de agosto de 1665

      
1. Origens 

Das 26 capitais de estado brasileiras, 17 localizam-se à beira mar ou em zona de influência direta do oceano. Nos cerca de 9.000 quilômetros de extensão da costa brasileira, localizam-se 273 municípios, o que faz com que cerca de 60% da população brasileira (126 milhões) vivam na borda do oceano Atlântico ou em sua proximidade. Por diversa razões históricas e geográficas, as atividades econômicas do país ainda são bastante concentradas em uma estreita faixa de terra, que dista apenas algumas centenas de quilômetros do mar.

A única larga colonização do país feita a partir do interior ocorreu cerca de 400 anos antes da chegada de Cabral, quando grupos de indígenas das etnias tupi e guarani se deslocaram do interior para a costa, do sul do país em direção ao norte. No entanto, desde a chegada dos primeiros europeus, toda a ocupação do vasto território brasileiro se daria a partir da grande estrada marítima; o oceano Atlântico. Excetuando a contribuição indígena, quase toda a população e cultura brasileira – incluindo tecnologias, leis, religiões e costumes – chegaram ao país através do mar.

Somos uma sociedade que sempre teve e ainda tem uma estreita ligação com o mar. Nos últimos cinquenta anos, com o avanço em todo o mundo dos estudos sobre o clima e os oceanos, aprendemos que esta relação é muito mais próxima do que se imaginava. Nas últimas décadas do século XX, a humanidade se deu conta de que sua dependência destes dois fatores é muito maior do que a ciência (e o senso comum) supunha no passado.
 


2.  Descoberta / Críticas 

Ao longo dos séculos XIX e XX gerações de cientistas trabalharam no desenvolvimento de uma teoria que explicasse a variação de temperatura do planeta, por influência da concentração de gases – principalmente dióxido de Carbono (CO²) e vapor d’água – na atmosfera terrestre. O fundamento da teoria previa que diversos fatores astronômicos (ciclos solares, variação orbital da Terra, queda de meteoros), marítimos (fenômenos El Niño e La Ninã de alteração da temperatura do oceano Pacífico) e geológicos (deriva continental e vulcanismo) poderiam contribuir para alterar a temperatura da atmosfera. Explicava-se assim, de certa maneira, os diversos avanços e recuos das glaciações ao longo dos últimos 2,4 bilhões de anos – com cerca de 25 períodos glaciais somente nos últimos 2,7 milhões de anos. As glaciações provocavam o congelamento de grandes volumes de águas marinhas, o que causava um recuo no nível dos oceanos em períodos de congelamento e um avanço das águas em períodos interglaciais, fenômeno que vem ocorrendo no planeta nos últimos 10 mil anos.

Nas últimas décadas do século XX, cientistas de diversas áreas de estudo fizeram comparações entre um grande volume de dados relativos ao clima da Terra. Foram reunidos extensos registros sobre a variação da temperatura da atmosfera e dos oceanos ao longo de centenas de anos; colheram-se amostras de gelo das geleiras e camadas de solo do fundo de lagos. O principal objetivo dos estudos era associar a variação da temperatura da Terra com a presença de gases de efeito estufa na atmosfera do planeta no passado – detectados em pequenas bolhas de ar presas no gelo – e seu efeito sobre as plantas, através da presença de maior ou menor quantidade de pólen acumulado no lodo lacustre. Depois destas e de diversas outras análises, a maior parte dos cientistas envolvida no assunto, concluiu que mesmo tendo origens naturais, as mudanças do clima estão sendo fortemente influenciadas pelas atividades humanas. 

(CONTINUA) 

(Imagens: pinturas de Charles Alston)

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