“Todavia,
querer estar no controle não é o mesmo que efetivamente estar no controle. Nem
a crença de “eu estou no controle” faz isso. A partir da perspectiva budista,
toda escolha ou decisão é o resultado de uma infinita e complexa conexão de
redes de causas e condições prévias, algumas delas biológicas ou
evolucionárias, outras sociais ou históricas – incluindo, se você quiser, a
influência de incontáveis vidas passadas. Em todo caso, nenhuma escolha ou
decisão é totalmente incondicionada, o ato livre e arbitrário de um agente
onipotente. Ainda assim, enquanto acredito ser um indivíduo, acredito que tomo
decisões. Ou podemos dizer de maneira contrária; alguém poderia dizer assim: eu
acredito que escolho, logo acredito que sou (existo).
A
rede de causas e condições que moldam cada escolha ou decisão particular não
tem começo, fundamento último ou ponto de origem. No jargão budista uma decisão
é de “originação dependente”. No contexto das experiências individuais o não
fundamento das escolhas e decisões é imediatamente evidente na maneira como se
manifestam espontaneamente, sem qualquer causa aparente. Escolhas e decisões –
como todos os pensamentos – simplesmente ocorrem; eles “aparecem na minha
cabeça” (como dizemos) vindas de lugar nenhum, como mágica. Por exemplo, todo
mundo já teve a experiência de não ser capaz de decidir o que fazer em determinada
situação crítica. Eu tento tomar uma decisão, sem sucesso. Finalmente, paro de
tentar e desisto. Vou dormir ou penso em outra coisa. E, miraculosamente a decisão
está tomada!
O
fato de eu não ver isso – ou seja, de que me imagino como um agente autônomo fazendo
escolhas e tomando decisões – é, de acordo com o ensinamento budista, a mais
básica e sutil forma de ignorância. Ser ignorante desta maneira significa que
atuo a partir de um ilusório senso de liberdade e controle pessoal, dominado
por uma avidez constante e autocentrada, sem proporção e medida. A ignorância
deste tipo está aliada não somente a um descontentamento sem remorsos, mas
também a uma pronunciada falta de humildade, cheia de arrogância e orgulho –um inflado
senso de nossa própria força, a qual os antigos gregos chamavam de hubris, que leva inexoravelmente ao
desapontamento e ruína. ‘Porque desejos possessivos ao mesmo tempo destroem o
que desejam e são escravizados pelo que destroem’.” (Huntington Jr, págs. 54 e 55)
C.
W. Huntington Jr, What I don’t know about death (O que eu não sei sobre a morte
– trechos traduzidos por Ricardo Ernesto Rose)
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