Outras leituras

sexta-feira, 1 de novembro de 2024


 

“Sem dúvida, o regime que se implantou, sob o rótulo de socialismo, não atendia às prescrições que Marx e Engels lhe atribuíram. Para esses, o socialismo é um regime que só começa, pelo menos, ali onde a ‘imensa maioria’ da sociedade, por seu elevado nível social, ‘espontaneamente ‘, tende a praticá-lo. Como Isaac Deutscher observou, a camada de mujiques analfabetos e a incipiente classe obreira que constituíam o grosso da população russa, em 1917, não ofereciam condições sociais maduras para a instauração do socialismo. E os próprios líderes bolchevistas, pensavam assim e fizeram a Revolução na certeza de que, logo após, o mundo ocidental se levantaria para derrocar o capitalismo. Suas intenções eram idôneas. Seus ideais, sinceros. Mas, o mundo ocidental não respondeu à Revolução e assim os líderes bolchevistas, pela lógica da situação criada, para não perder o poder, foram compelidos a realizar o ‘socialismo num só país’. Estava Lênin ainda no poder, quando Kautsky escreveu: ‘O governo de Lênin está ameaçado de um novo Termidor’. Mas pode ocorrer outra coisa. A história não se repete. Um governo que se propõe um fim que não pode alcançar nas condições em que atua pode fracassar de duas maneiras. Acaba por cair, se aferrar ao programa. Pode manter-se, se vai modificando o seu programa, e acaba por abandoná-lo. Para a causa, o resultado é o mesmo por um procedimento ou por outro. Agora, para as pessoas, varia muito a situação, se conservam em suas mãos o poder do Estado ou caiam vencidas indefesas nas mãos de seus inimigos. Os líderes bolchevistas foram realistas. Adaptaram-se às circunstâncias, brutalmente, ferindo a sensibilidade dos ‘marxistas ocidentais’, como Kautsky, Rosa Luxemburgo e, em nossos dias, Rubel, Daniel Guérin e tantos outros que têm denunciado a infidelidade dos soviéticos às concepções originais de Marx e Engels.”. (Ramos, pág. 80)

 

Alberto Guerreiro Ramos (1915-1982), sociólogo brasileiro em Mito e verdade da revolução brasileira

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