Geração e eficiência energética no Brasil

sábado, 3 de junho de 2017
"Na verdade, uma teoria filosófica é uma questão desenvolvida e nada mais que isso: por ela mesma, nela mesma, ela consiste não em resolver um problema, mas em desenvolver até o fim  as implicações necessárias de uma questão formulada."  -  Gilles Deleuze  -  Empirismo e subjetividade

Apesar da queda do consumo com a crise econômica, o Brasil ainda é o décimo maior consumidor de energia em todo o mundo e o maior na América do Sul. As principais fontes energéticas do país são o óleo e outros combustíveis (39% incluindo o etanol); as hidrelétricas (29%); e outras fontes renováveis (21% principalmente biomassa). A energia elétrica, de acordo com o Ministério das Minas e Energia (MME), tem as seguintes fontes: as hidrelétricas (70,6%); as termelétricas (18,3%); a biomassa (7,6%); os reatores nucleares (2,4%); e os geradores eólicos (1%) (EPE, 2013).

Em fevereiro de 2016 o Brasil tinha uma potência instalada de 141.699.960 kW, gerada por 4.461 unidades produtoras (ANEEL, 2016). Os principais consumidores dessa eletricidade foram a indústria (46,4%); o setor residencial (22,1%); o comércio (15%); o setor público (7,6%); o agropecuário (4,3%); e outros serviços de infraestrutura (4,6%).


Até o final dos anos 1990 o Brasil sempre teve um superávit na geração de eletricidade. No entanto, nos últimos quinze anos, a expansão da economia e o rápido crescimento do consumo fizeram com que fosse constante a ameaça de falta de eletricidade, o chamado “apagão”. Tal situação ainda foi mais acentuada com as estiagens que afetaram o país nos biênios 2000/2001 e 2014/2015, provocando a queda dos níveis de água dos reservatórios das hidrelétricas para volumes mínimos.

Esses fatores fizeram com que os governos deste período aumentassem investimentos em termelétricas a gás e carvão e incentivassem o desenvolvimento dos mercados de energia renovável. Como resultado deste esforço, o país aumentou sua capacidade instalada de energia eólica de alguns poucos quilowatts em 2002, para 8,98 GW em 2015 (Abeeolica, 2016). O setor de energia solar fotovoltaica também passa por rápido desenvolvimento, principalmente depois criação do Programa de Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica (ProGD), em dezembro de 2015 pelo MME. Segundo publicação do setor, em 2016 o mercado de energia fotovoltaica deverá crescer 300% (Portal Solar, 2016).

Com relação à economia de energia, pouco tem sido realizado. Do total de energia elétrica produzido no país, cerca de 10% são perdidos durante a transmissão e distribuição da energia. Dados da Associação Brasileira das Empresas de Conservação de Energia Elétrica (ABESCO) dão conta que o Brasil desperdiça o equivalente a uma usina Belo Monte por ano (4.600 MW médios). Este volume, segundo a associação, seria suficiente para abastecer 40% do consumo residencial do país. Em 2007 a Eletrobrás (empresa de energia do governo federal) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizaram um levantamento para detectar o potencial de redução de energia no setor industrial. Naquele ano este potencial já era de 25,7%; 82% dos quais em redução do uso de combustíveis e adaptação de fornalhas e caldeiras.


Em 2014 o Conselho Americano para uma Economia de Energia Eficiente (American Council for an Energy-Efficient Economy – ACEEE) fez uma pesquisa sobre práticas de uso de energia entre as 16 mais importantes economias do mundo. Para avaliar como os países se utilizam do insumo, foram criados 31 indicadores, distribuídos em quatro áreas-chave: indústria, transportes, edificações e esforços nacionais. Num total de 100 pontos possíveis, o Brasil atingiu 30 pontos. No quesito “esforços nacionais”, o país fez quatro pontos de 25 possíveis (foram avaliadas legislação e políticas nacionais); no quesito “eficiência energética nas indústrias” alcançou dois de 25 pontos possíveis; em “edificações” alcançou 10 de 25 pontos; e em “transporte” fez 14 de 25. (Revista Exame julho 2014). Como resultado da pesquisa o Brasil ficou em penúltimo lugar, acima apenas do México. O primeiro lugar ficou com a Alemanha.

O Brasil possui alguns programas relacionados com a eficiência energética; todos, porém, de ação limitada:
- O mais antigo é o PROCEL – Programa Nacional de Conservação de Energia, criado em 1985. O objetivo principal do programa é incentivar a produção de produtos energeticamente mais eficientes. Até o final de 2015 o programa incluía 32 categorias de produtos (eletroeletrônicos, eletrodomésticos, ferramentas, automóveis, máquinas, etc.), totalizando 3.784 produtos e reunindo 209 companhias (a maior parte delas de grande porte). O PROCEL continua gradualmente se expandindo e ganhando novos associados voluntários. Seu crescimento, porém, é quase vegetativo, já que o país ainda não dispõe de uma legislação e normas técnicas referentes à melhoria da eficiência energética de produtos.
- Outra iniciativa é o Programa Nacional da Racionalização do Uso de Derivados de Petróleo e do Gás Natural – CONPET, criado em 1991. O programa visa promover o uso racional dos derivados de petróleo e do gás natural. Para isso, determinados produtos, como fogões, fornos domésticos e aquecedores a gás podem obter a etiqueta de padronização da instituição. Além disso, o programa também atua no setor de transportes, através de treinamento e verificação/certificação (voluntárias) de veículos de transporte.
- A Lei da Eficiência Energética de 2001, estabelece padrões de consumo para diversos produtos e máquinas, como motores elétricos trifásicos, lâmpadas, fogões e fornos a gás, condicionadores de ar, aquecedores a gás e reatores eletromagnéticos. Os padrões de consumo de energia são estabelecidos por uma comissão formada por especialistas de diversos ministérios.

- O PROCEL Edifica e PBE Edifica, criados respectivamente em 2003 e 2004, tem como objetivo implantar medidas de conservação de energia em construções (PROCEL Edifica) e certificá-las, conferindo-lhes um selo de conformidade (PBE Edifica). A adoção dos padrões PROCEL Edifica e a certificação pelo PBE Edifica são voluntários, tanto nas novas construções, quanto no retrofit. Em 2014 o governo federal publicou decreto que torna obrigatória a Etiqueta Nacional de Conservação de Energia (ENCE) em reformas e novas construções de prédios públicos, com área de construção acima de 500 m². Atualmente existem cerca de 50 prédios públicos que possuem esta etiqueta.
- Em outubro de 2011 foi lançado o Plano Nacional de Eficiência Energética (PNEf), que ainda está em fase de implantação e conta com o apoio de instituições internacionais como a alemã GIZ. Em um de seus pontos o plano prevê uma redução do consumo de 10% até 2030, o equivalente a 106 TWh, evitando a emissão de 30 milhões de toneladas de CO²e. Outro aspecto do PNEf é aumentar os investimentos em smart grid. No momento já foram implantados projetos-piloto espalhados pelo Brasil, com a colaboração de distribuidoras regionais de energia (Copel, Eletropaulo, Light, CEMIG, Bandeirante, Coelce e Eletrobrás). Dentro deste mesmo plano, o MME prevê a troca de todos os medidores domésticos no país até 2021, para mais facilmente inserir o consumidor doméstico nos projetos de smart grid.

Grande parte das iniciativas na área da eficiência energética, com exceção do programa PROCEL, ainda está em fase de desenvolvimento. Mesmo assim, de acordo com International Partnership for Energy Efficiency Cooperation (IPEEC), entre 2008 e 2011 a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) registrou 914 projetos de eficiência energética, gerando uma economia de cerca de 2,06 milhões de MWh por ano. Os investimentos, que totalizaram US$1,3 bilhão, incluíram projetos nas áreas de: melhoria de iluminação; programas educacionais; melhorias em estações de tratamento de água; eficiência energética em construções, entre outros.

No mercado brasileiro de eficiência energética não existem incentivos, tais como isenção de impostos para equipamentos. No entanto, existem linhas de financiamento de bancos privados e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para equipamentos e serviços, com taxas de juros abaixo das oferecidas pelo mercado. Para obter estes recursos a empresa precisa estar estabelecida no Brasil.
Segundo o IPEEC (International Partnership for Energy Efficiency Cooperation) os maiores impedimentos para o desenvolvimento mais rápido deste mercado no Brasil, são:
- Empresas não dedicam atenção ao tema;
- Payback time é muito longo;
- Não existe suficiente financiamento;
- Incerteza quanto às efetivas economias geradas pelo projeto;
- Falta de conhecimento para identificar as oportunidades de economia de energia;
- Falta de conhecimento técnico.

Para alguns especialistas do setor, no entanto, os projetos de eficiência energética devem ser baseados em soluções de mercado, sem mecanismos como incentivos, isenções e fomentos, que poderiam distorcer o funcionamento deste mercado. O melhor exemplo de um setor que se desenvolveu rapidamente apenas com mecanismos de mercado é o da energia eólica.
(Imagens: pinturas de Mikhail Larionov)

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