Recursos hídricos: o aquífero Guarani

sábado, 10 de junho de 2023


 "(...) a teoria quântica e a da relatividade concordam, no ponto em que ambas indicam a necessidade de se ver o mundo como uma totalidade indivisível, que todas as partes do Universo, incluindo o observador e os seus instrumentos, se fundam e se unam em uma totalidade. Nessa totalidade, a forma atomística da visão é uma simplificação e uma abstração, válida apenas em algum contexto limitado."   -   David Bohm   -   Totalidade e a ordem implicada   


A água em poucas décadas se tornará um recurso natural mais importante do que o petróleo. Guerras localizadas já estão sendo travadas para garantir o acesso ao precioso líquido na África Subsaariana. No entanto, o problema global da crescente escassez de água só tenderá a aumentar, devido à incorreta gestão do líquido e ao processo das mudanças climáticas. 

Com relação aos recursos hídricos, o Brasil é um dos países com as maiores reservas mundiais, com 15% do total disponível. Estes, todavia, estão mal distribuídas no País, já que cerca de 70% dos nossos estoques de água superficial encontram-se na região Norte, 15% no Centro-Oeste, 12% nas regiões Sul e Sudeste e só 3% no Nordeste. Com a crescente demanda por água em todas as regiões do País, é importante que todos os governos (federal, estadual e municipal) cuidem do cumprimento da Lei 9.433 de 1997, que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos, incorporando princípios, normas e padrões de gestão da água, universalmente aceitos e já praticados em outros países. 

Na região Sul, Sudeste e parte da região Centro-Oeste (nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso) encontra-se um dos maiores depósitos de água subterrânea do mundo, o aquífero Guarani. O Sistema Aquífero Guarani está distribuído por uma área total de 1.196.500 km², estendendo-se também por outros países do Mercosul, respectivamente: Argentina, com 225.500 km²; Paraguai, com 71.700 km²; Uruguai, com 58.500 km²; e no Brasil, onde ocupa uma área de 840.800 km². 

A formação geológica do Sistema Aquífero Guarani ocorreu durante os períodos geológicos do Triássico e Jurássico, entre 180 e 130 milhões de anos passados, quando a Terra era dominada pelos dinossauros e o continente sul-americano começava a se separar do continente africano, criando o que seria o oceano Atlântico. A rocha onde se encontra a reserva aquífera é um arenito, formado a partir de um extenso deserto que se estendia pela região que atualmente compreende o interior de grande parte da América do Sul, com alto índice de porosidade. A água é encontrada através de poços artesianos a uma profundidade de 200 a 800 metros, apesar de existirem alguns afloramentos quase à superfície. Várias cidades brasileiras – como Ribeirão Preto – se utilizam das reservas do aquífero Guarani para suprirem a demanda de água de suas populações. A mais recente pesquisa estima que as reservas de água do aquífero sejam de 46.000 km³. Uma quantidade tão grande que daria para abastecer a população da região do aquífero por dezenas de anos. 

A grande preocupação dos especialistas é quanto ao manejo correto destas reservas hídricas. A água retirada do subsolo é reposta naturalmente pela chuva. No entanto é preciso evitar que as atividades econômicas da região – gerando esgotos e resíduos, sem tratamento e correta disposição – acabem contaminando a água de recarga do aquífero. Os países em cujos territórios se encontra o aquífero já assinaram diversos acordos de cooperação, estabelecendo princípios de gestão compartilhada da reserva. 

O aquífero Guarani poderá ser garantia de fornecimento de água para vastas regiões do Brasil nas próximas décadas. Para isso aconteça, é preciso que todos os usuários – privados e públicos – saibam gerir estes recursos com inteligência. O que nem sempre é o caso por aqui.      


(Imagens: fotografias de Aenne Biermann)


(Texto publicado originalmente no livro Como está a questão ambiental?, de Ricardo E. Rose)

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