Outras leituras

terça-feira, 22 de abril de 2025

 

“Sobre este corpo anêmico, atrofiado, balofo, tripudiam os políticos. É a única questão vital para o país — a questão política. Feliz ou infelizmente, não há outro problema premente a resolver: nem social, nem religioso, nem internacional, nem de raças, nem graves casos económicos e financeiros. Somente a questão política, que é a questão dos homens públicos. Há-os de todo o género: os inteligentes, os sagazes, os estúpidos, os bem-intencionados (dantesca multidão), os que a sorte protege como nas loterias, os efémeros, os eternos. É o grande rebanho que passa, pastando, de que falava Nietzsche. De vez em quando surge uma individualidade, ou nascente ou já sacrificada pela incomensurável maioria: os nomes dessas exceções, de raros, acodem logo ao bico da pena, mas de fato e desde muito, estão desaparecendo rapidamente os que possuíam, na expressão dos historiadores românticos, ‘o magnetismo da personalidade’.” (Prado, pág. 98) 

“Em meio desse cataclismo em preparo, que papel caberá ao Brasil? O da mais completa ignorância do que se passa pelo mundo afora. Dorme o seu sono colonial. Ainda acredita no embalo dos discursadores, nas teorias dos doutrinários e na enganadora segurança dos que monopolizaram, pela fraqueza dos indecisos, as posições de domínio e proveitos. Não vê o desastre que se aproxima; não vê o perigo de estarmos à margem dos grandes caminhos mundiais da navegação e da aviação; não vê que a terra se tornou pequena demais para os imperialismos, pacíficos ou guerreiros, e que é um paradoxo a laranjeira à beira da estrada, carregada de laranjas doces...  Apesar da aparência de civilização, vivemos assim isolados, cegos e imóveis, dentro da própria mediocridade em que se comprazem governantes e governados. Neste marasmo podre será necessário fazer tábua rasa para depois cuidar de renovação total.” (Prado, págs. 101 e 102) 

 

Paulo Prado (1869-1943), escritor, poeta, mecenas incentivador da Semana de Arte Moderna de 1922 e empresário brasileiro em Retrato do Brasil: Ensaio sobre a tristeza brasileira

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